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Rio 2016: moradores de comunidades removidas dizem que não há clima de festa

em Especial
sexta-feira, 05 de agosto de 2016
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Rio 2016: moradores de comunidades removidas dizem que não há clima de festa

Os Jogos Olímpicos Rio 2016 começaram na sexta-feira (5), com a abertura oficial no Maracanã. Mas para as famílias que foram removidas de suas casas para dar lugar a equipamentos olímpicos, não há lugar para festa. Antigos moradores da Vila Autódromo – comunidade na zona oeste do Rio de Janeiro removida para a construção do Parque Olímpico – se dizem excluídos do evento e afirmam que se sentem humilhados.

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Escombros da Vila Autódromo, que teve de ser removida para construção do Parque Olímpico.

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Moradores que resistiram à remoção pixaram palavras de ordem no que restou das casas.

Do total de 500 famílias que vivia ao lado do antigo Autódromo de Jacarepaguá, apenas 20 permanecem no local depois da urbanização feita pela prefeitura. Resistente da Vila Autódromo, a acupunturista Sandra Maria de Souza está fazendo mudança para a nova casa construída pela poder público municipal depois de quatro anos de luta pela manutenção da comunidade no local. As casas originais foram derrubadas e a comunidade foi transformada em uma rua urbanizada. “A especulação imobiliária com certeza vai continuar perseguindo a Vila Autódromo, então vamos continuar numa resistência permanente”, diz.

Apesar de vizinha do Parque Olímpico, ela critica o evento e diz que não passam de “jogos de exclusão”. “Está uma loucura. Estamos fazendo mudança, porque as casas foram entregues na semana passada, ainda precisam de vistoria. Estamos recebendo imprensa e as pessoas que vão lá ver. Estamos participando de debates de resistência pela cidade. Para mim, as Olimpíadas são realmente os jogos de exclusão. Para mim, é uma grande decepção. Eu não tenho nenhum desejo de ver jogo nem de participar dessa festa. Só se for protestando, mas nem isso eu posso fazer porque posso ser presa”.

Sentimento de exclusão
A professora Inalva Mendes Brito teve sua casa desapropriada na Vila Autódromo e hoje mora na área rural. Ela diz não ter vontade de acompanhar os Jogos que, segundo ela, vem sendo feitos sempre num processo excludente, autoritário e sem diálogo com a sociedade. “Não vou dizer que gosto de Olimpíada porque nunca de fato participei de uma num modelo virtuoso. Todas que eu ouvi e vi foram no modelo vicioso: Grécia, Montreal, China. O povo não participa, o povo paga a conta”. De acordo com ela, a comunidade da Vila Autódromo mantém o sentimento de exclusão surgido nos Jogos Pan-Americanos de 2007 e que aumentou com todos os grandes eventos que a cidade recebeu.

“É um processo de desapropriação do direito à cidade, do direito aos bens públicos, de exploração midiática, de exploração imobiliária, é um processo de violação de direitos humanos, nós nem fomos consultados. Não dá para se envolver no espírito olímpico, o que é uma olimpíada? Me passa que é um processo de envolvimento da população. Nós fomos consultados? Não, colocaram palavras na nossa boca, que nós queríamos Olimpíada, Copa, Pan-Americanos. Nunca perguntaram se nós queríamos saúde, educação, moradia, lazer, saneamento básico”.

Humilhação
A dona de casa Camila Santos foi removida da comunidade Skol, no Complexo do Alemão, em 2011. Segundo ela, o governo do estado disse que o local era área de risco e as famílias não foram indenizadas nem receberam apartamentos, como ocorreu com os moradores retirados da Vila Autódromo. “Tinham três prédios com risco de cair, era perto do rio. Então nos removeram, incluíram no PAC 1 para poder contemplar com uma unidade habitacional. A gente continuou na comunidade mesmo, porque o aluguel social é muito pouco e encerraram o PAC 1 sem entregar nossas casas”.

O eletrotécnico Orlando Santos, morador do conjunto habitacional Parque Carioca, na Taquara, zona oeste da capital fluminense, critica os problemas de infraestrutura nos apartamentos.Agora, Camila mora de aluguel com o marido e três filhos. Recebe R$ 400 de aluguel social mensalmente e paga R$ 600 pela locação de uma casa dentro da comunidade Reservatório, também no Alemão. Sobre as competições, diz não ter nenhum interesse em acompanhar e se mostra ressentida pelo que passou. “A Olimpíada a gente vê como uma festa que não é nossa. Olimpíada, pra gente, é humilhação, não ganhamos nada e, pelo contrário, só saímos no prejuízo. A gente não pediu para sair, eles removeram a gente, não deram opção, a gente não tem legado. A gente mora na favela e lá não foi feito nada, não teve uma obra, um saneamento básico, então o que ficou da Olimpíada é que a gente ficou sem casa. Não tenho motivo para comemorar nada”.

Integrante da União Nacional e Moradia Popular, Jurema da Silva Constância, foi removida de Jacarepaguá quando criança, na época da construção do RioCentro. Sua família foi levada para Santa Cruz, distante quase 40 quilômetros da comunidade original. Em contato com movimentos sociais e pessoas que foram removidas de suas casas recentemente por causa das grandes obras, ela diz que não é contrária à olimpíada, mas sim contra a forma como o processo ocorre.

A dona de casa Maria Cordeiro Pereira, moradora do conjunto habitacional Parque Carioca, na Taquara, zona oeste da capital fluminense, mostra a parede do apartamento com os azulejos soltos.“O Estado faz a Olimpíada, mas você procura a saúde e não tem, procura moradia e não tem. As pessoas não foram consultadas, tinha que manter [as contas do] Estado em dia para depois pensar numa Olimpíada. Criaram várias estações de BRT que não vão atender à demanda. Criou um VLT que não atende quase nada. Quem mora em Jacarepaguá ficou sem ônibus, reduziram as linhas e o BRT não me serve”, criticou.

Legado
Segundo a Empresa Olímpica Municipal, o projeto olímpico foi distribuído por quatro regiões “exatamente para beneficiar um número maior de moradores”, promovendo a requalificação urbana dessas áreas e arredores­.
De acordo com a prefeitura, a única comunidade removida por causa dos Jogos foi a Vila Autódromo, onde moravam 824 famílias, segundo o poder público municipal. A vila irá receber, depois dos Jogos, duas escolas das quatro provenientes do desmonte da Arena do Futuro – instalação provisória da Rio 2016.
A prefeitura anuncia também a entrega de 305 escolas até o fim do ano, com 35% dos alunos estudando em tempo integral. Na mobilidade, a prefeitura diz que a transporte de alta capacidade vai passar de 18% em 2009 para 63% da população em 2017, com os BRTs e a linha 4 do metrô.

Para o meio ambiente, a prefeitura informa que investiu no Controle de Enchentes da Grande Tijuca, com a construção de cinco reservatórios para águas pluviais, fechou o Lixão de Gramacho e construiu o Centro de Tratamento de Resíduos de Seropédica (ABr).