Nos últimos anos, o compliance officer ganhou grande relevância no cenário empresarial brasileiro. Esse profissional, que antes atuava de maneira discreta nos bastidores, agora está no centro das atenções quando o assunto é integridade corporativa. E isso não é por acaso. Desde a entrada em vigor do Decreto nº 8.420, de março de 2015, que regulamenta a Lei Anticorrupção, o compliance officer tornou-se peça-chave na prevenção de práticas ilícitas dentro das empresas.
Mas o que exatamente faz um compliance officer? Eu diria que a função vai muito além de apenas garantir que a empresa siga as leis. É um trabalho de confiança, que envolve tanto a criação de regras quanto a detecção de vulnerabilidades. É como se esse profissional estivesse constantemente ajustando as engrenagens de um relógio: qualquer desvio pode comprometer toda a operação.
Lembro-me de uma conversa recente que tive com uma colega compliance officer de uma empresa de tecnologia. Ela compartilhou comigo a complexidade de suas tarefas, especialmente no cenário atual, em que os riscos são dinâmicos e o compliance precisa se adaptar rapidamente. O desafio não é só identificar práticas ilícitas, mas evitar que elas aconteçam. E essa prevenção começa com a criação de um programa de integridade robusto, que envolve desde treinamentos até auditorias internas.
No entanto, a responsabilidade de um compliance officer não se limita à empresa. Ele também desempenha um papel fundamental no equilíbrio entre o setor privado e o público. Afinal, é preciso garantir que a companhia esteja em conformidade não apenas com as normas internas, mas também com a legislação vigente, como as leis de lavagem de dinheiro ou de defesa da concorrência. E, acredite, o peso dessa responsabilidade pode ser enorme.
Imagine a pressão de saber que, se algo der errado, você pode ser responsabilizado criminalmente por uma omissão. É aqui que entra o conceito de “garante”. O compliance officer tem o dever de agir para prevenir qualquer prática criminosa dentro da empresa. Se algo ocorrer, mesmo que de forma indireta, ele pode ser responsabilizado por não ter evitado o problema.
Na minha opinião, essa posição é tanto uma honra quanto um fardo. Por um lado, o compliance officer é visto como o defensor da integridade empresarial. Por outro, ele carrega nas costas a responsabilidade de garantir que as normas sejam seguidas à risca. Em alguns casos, a falha pode resultar em uma responsabilização penal. Isso me faz pensar nas inúmeras noites em que esse profissional deve se questionar: “Será que fiz tudo o que estava ao meu alcance?”.
Por mais que essa função esteja bem definida em países como Alemanha e Estados Unidos, aqui no Brasil ainda estamos engatinhando em termos de delimitação clara das responsabilidades do compliance officer.
Conversei recentemente com um advogado especializado em compliance, e ele me alertou para os riscos de se criar uma cultura de responsabilização excessiva desse profissional. Ele me disse: “Se começarmos a culpar o compliance officer por cada falha dentro da empresa, vamos inibir a atuação desses profissionais, que passarão a se proteger mais do que agir preventivamente.”
De fato, é necessário haver um equilíbrio. Não podemos esperar que o compliance officer seja o único responsável pela integridade de toda a empresa. Ele precisa de apoio, recursos e, principalmente, de uma cultura organizacional que priorize a ética. Sem isso, o trabalho dele se torna um exercício solitário e, muitas vezes, inviável.
O que vemos, portanto, é um cenário em evolução, em que o papel do compliance officer ainda está sendo moldado. O importante é que, independentemente das leis ou das normas, a integridade precisa ser um compromisso de todos dentro da organização, e não apenas de uma pessoa. Afinal, a ética não é tarefa de um, mas de muitos.
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Denise Debiasi é CEO da Bi2 Partners, reconhecida pela expertise e reputação de seus profissionais nas áreas de investigações globais e inteligência estratégica, governança e finanças corporativas, conformidade com leis nacionais e internacionais de combate à corrupção, antissuborno e antilavagem de dinheiro, arbitragem e suporte a litígios, entre outros serviços de primeira importância em mercados emergentes.