Paulo Henrique Fraccaro (*)
A população brasileira está envelhecendo rapidamente e atingiu um dos maiores índices de envelhecimento do mundo. De acordo com o recente censo do IBGE, entre 2000 e 2023, a proporção de idosos no Brasil quase duplicou. Em 2070, os idosos deverão representar cerca de 38% da população, passando dos atuais 33 milhões, em 2023, para 75,3 milhões.
Com isso, a idade média dos brasileiros, que em 2023 era de 34,8 anos, passará a ser de 51,2 anos. A tendência é o Brasil ter cada vez menos jovens e cada vez mais idosos. Esse cenário apresenta um desafio urgente: como o sistema público de saúde, já sobrecarregado, lidará com uma população cada vez mais envelhecida?
Sabemos que, à medida que envelhecemos, a necessidade de cuidados de saúde se intensifica. Ter e manter um plano de saúde privado ou pagar por consultas e exames particulares torna-se cada vez mais inviável para muitos. Como resultado, um número crescente de brasileiros dependerá exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS), que hoje já é responsável por 75% da população.
Esse cenário de envelhecimento não só sobrecarrega o sistema de saúde público, como também exige uma infraestrutura que esteja preparada para atender a essa demanda crescente. Nesse contexto, o papel dos dispositivos e tecnologias médicas torna-se fundamental, pois desempenham um papel essencial na prevenção, diagnóstico e tratamento de diversas condições associadas ao envelhecimento, como doenças crônicas e degenerativas.
O fato é que o sistema público não avançou com a rapidez necessária para acompanhar o envelhecimento da população. O SUS precisará se preparar para um aumento significativo na demanda por tratamentos específicos para os idosos, que não apenas exigem mais consultas e exames, mas também procedimentos de reabilitação, cuidados paliativos, entre outros serviços de saúde especializados.
Isso inclui uma política industrial focada nos fabricantes de dispositivos médicos que terão que desenvolver produtos e equipamentos mais acessíveis e adaptados para melhor atender os idosos nos hospitais, como camas e macas de altura ajustável, cadeiras de rodas ergonomicamente desenhadas, tecnologias de monitoramento remoto e sistemas de suporte à mobilidade, além de tecnologias de monitoramento e diagnóstico.
Se o sistema de saúde público e as empresas de dispositivos médicos não acompanharem essa mudança, os custos poderão disparar, e a qualidade do atendimento pode ser comprometida. Este cenário exigirá um investimento ainda maior do poder público e do setor privado em inovação tecnológica no setor de dispositivos médicos, políticas públicas eficazes para incentivar o desenvolvimento de soluções adaptadas à nova realidade demográfica.
Esse mesmo setor, que desempenhou um papel crucial durante a pandemia de COVID-19, fornecendo equipamentos como ventiladores pulmonares, luvas, seringas e tecnologias essenciais para o diagnóstico, tratamento e monitoramento de pacientes.
Oportunamente, o País está discutindo uma reforma tributária, ação fundamental para o fortalecimento do setor, principalmente eliminando as distorções existentes atualmente, quando um ente público ou sem fins lucrativos importar diretamente qualquer equipamento não paga tributos, e se comprar este mesmo equipamento fabricado no país, paga em média 35%.
Sem dúvidas é necessário criar políticas de incentivo à inovação, promover parcerias público-privadas, e desenvolver programas de financiamento que favoreçam a produção nacional de tecnologias de saúde que sejam tanto eficientes quanto acessíveis.
Diante desse novo cenário, o planejamento estratégico, tanto para o SUS quanto para as empresas, deve ter uma abordagem preventiva. Investir em campanhas de conscientização sobre hábitos de vida saudáveis, fortalecer os programas de atenção primária à saúde e ampliar o acesso a exames preventivos são ações fundamentais que devem ser incorporadas ao planejamento.
Com um planejamento antecipado, podemos mitigar os impactos financeiros que, de outra forma, seriam significativos. Outro ponto que merece atenção é a urgente atualização da tabela SUS, que está desatualizada há décadas. Essa defasagem interfere diretamente na capacidade de atendimento, na compra de dispositivos médicos necessários, e prolonga o tempo de espera dos pacientes para cirurgias e procedimentos eletivos, que são essenciais.
À medida que a tabela não reflete os preços de mercado, as filas de espera do SUS continuam a crescer. Uma atualização que acompanhe os custos reais dos insumos e serviços de saúde é vital para que o sistema continue operando de maneira eficiente. Construir um sistema de saúde público sustentável e resiliente passa necessariamente pelo desenvolvimento de uma indústria de dispositivos médicos inovadora e capaz de atender às demandas da população brasileira que segue em rápido envelhecimento.
O fortalecimento do SUS, aliado a parcerias estratégicas com o setor privado, é essencial para garantir que ele possa atender os idosos de maneira eficaz e eficiente.
(*) – É CEO da ABIMO – Associação Brasileira da Indústria de Dispositivos Médicos.