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Queda da taxa de juros: oportunidades e desafios para as empresas

em Manchete Principal
segunda-feira, 11 de março de 2024

Jayme Petra de Mello Neto (*)

De acordo com o Boletim Focus, divulgado em fevereiro, a estimativa dos economistas é de que a taxa Selic chegue a 9% em 2024. No último comunicado do Copom foi indicado que o ritmo de queda da taxa básica de juros será mantido nas próximas reuniões.

Com isso, é provável que ocorram mais duas reduções de 0,5 ponto percentual nos encontros de março e maio. Atualmente está em 11,25% ao ano, sendo o menor nível desde março de 2022. Além disso, estima-se que a inflação caia, com o IPCA abaixo dos 4%, e o PIB cresça, ainda que de forma modesta, chegando a 1,75% em 2024.

As perspectivas globais têm se mostrado menos adversas. Nesse sentido, especialistas do mercado financeiro esperam que haja uma diminuição na taxa de juros dos Estados Unidos a partir de março, já que a inflação está sob controle em boa parte do mundo (nos EUA, em parte da Europa e no Brasil, embora com menor intensidade) e as preocupações com uma recessão global tenham diminuído.

Todos esses fatores contribuem para um cenário mais otimista em relação à economia brasileira, o que pode trazer algumas oportunidades para as empresas, tanto para as que desejam expandir seus negócios quanto para as que precisam se reestruturar e negociar débitos.

Imasgem: Galeanu_Mihai_CANVA

Dessa forma, a diminuição da taxa de juros pode representar novas possibilidades para as empresas realizarem a reestruturação de dívidas, captarem recursos para investir em expansão, modernização e crescimento, além de diversificar as operações, aumentar a capacidade produtiva e o desenvolvimento de novos negócios, entre outros pontos.

No entanto, independentemente das necessidades da organização, é crucial atentar para a viabilidade jurídica das operações, os possíveis impactos na estrutura societária e os riscos envolvidos nos processos, principalmente quando falamos da tomada de crédito.

O empresário costuma correr riscos calculados. Estée Lauder, a grande magnata dos cosméticos, disse, certa vez, que “riscos são a pedra angular de impérios”.

Mesmo que sejam grandes, estruturais, eles são conhecidos, percebidos ou nascem de uma consciência intuitiva da realidade e da estabilidade do mercado. Os riscos da primeira ordem, quando políticos ou relacionados a grandes eventos, costumam ser rapidamente incorporados pelas companhias. Mas quando os riscos empresariais são afetados por uma mudança de visão e interpretação dos fatores que não estavam evidentes ao mercado, ainda que pudessem ser conhecidos, toda a organização passa a sofrer com um ritmo descontrolado.

Entre esses riscos que já vinham sinalizando mudanças sem a perfeita declaração de sua extensão estão os referentes à tomada de crédito e endividamento, em geral.

Como mencionado, parece haver uma oferta de crédito mais barato no mercado, se comparado o valor nominal de taxas de juros com períodos anteriores. No entanto, o que não se revela é que as condições de acesso a esse crédito se tornaram mais complexas, com muito mais riscos inerentes a uma eventual dificuldade de pagamento futura.

Além disso, é importante ressaltar os riscos jurídicos, que se declararam ao mercado com a mudança de entendimentos jurisprudenciais, sobreposição de leis e até a ocorrência de um fenômeno tipicamente brasileiro: a lei que não pega. Em 2021, por exemplo, indicando uma preocupação com o crédito em si e ainda sob efeito da pandemia de Covid-19, foi editada a Lei nº 14.181, que tratava do superendividamento, tendo como foco a pessoa física.

Embora não tenha uma relação direta com o endividamento empresarial, o fato é que a preocupação legislativa naquela época era evitar que o crédito fosse concedido como uma solução fácil, apenas para resultar em dificuldades mais severas. É frequente o enfrentamento pelo Judiciário de processos em que os devedores se encontram com dívidas muito acima de sua capacidade de pagamento.

Imagem: anilakkus_CANVA

Ainda que não sejam aplicáveis às empresas as regras da Lei de Superendividamento, havia uma sinalização de princípios de responsabilidade na concessão dos créditos por instituições financeiras, que começavam a ter que exercer maior diligência acerca da capacidade de pagamento dos devedores, sejam pessoas físicas ou jurídicas, considerando todos os dados de endividamento disponíveis.

Quando falamos das empresas, o cenário é outro. A leitura que hoje é feita acerca da aplicação da Lei de Recuperação de Empresas e Falências, que foi inspirada num modelo norte-americano, é contrária aos objetivos pensados pelo legislador. O foco da lei, que era a manutenção dos empregos, da fonte produtiva e dos interesses do mercado, foi substituído por uma abordagem complexa e onerosa.

Busca-se menos recuperar a atividade econômica e mais a satisfação do crédito, concedido sem a devida responsabilidade na avaliação do tomador, o que deveria ser intrínseco ao risco da instituição financeira.

Essa mudança de perspectiva judicial, durante a vigência de contratos existentes, tem impactos significativos nos riscos que os empresários acreditavam ter assumido ao tomar o crédito. Esse desafio, muitas vezes, não é identificado antecipadamente devido à ausência de uma assessoria jurídica especializada.

Em resumo, o financiamento com capital de terceiros é um dos pilares da aceleração econômica empresarial, e o atual cenário macroeconômico pode trazer oportunidades para as empresas que buscam expandir sua atuação ou renegociar dívidas. Porém, é preciso que se tenha consciência dos riscos para tomar decisões mais estratégicas e manter a continuidade dos negócios.

(*) – É head no Marcos Martins Advogados (https://www.marcosmartins.adv.br/pt/).