André Neves (*)
A abreviação da Inteligência Artificial (IA) foi eleita a palavra do ano em 2023. E não é para menos: na atualidade, inovação aparece associada ao uso dessa tecnologia em diversos graus. Não se trata mais se a IA vai impactar a vida de pessoas e negócios, mas sim a forma com que líderes e suas companhias tirarão o melhor proveito dela por melhores entregas aos seus consumidores finais. Na minha área de expertise, a de Telecomunicações, o potencial inexplorado é enorme.
Em maio deste ano, um relatório internacional apontou que apenas 39% das empresas de Telecom utilizam IA para a identificação de oportunidades de inovação. O número é pequeno diante do papel central das companhias do setor no desenvolvimento da tecnologia e no Customer Experience (CX), com impacto direto na Garantia de Qualidade (QA). Segundo um outro estudo, o consumo de dados por meio de redes de telecomunicações vai triplicar até 2027, subindo de 3,4 milhões de petabytes em 2022 para 9,7 milhões. Os vídeos puxarão esse consumo, em um mundo que terá 25,1 bilhões de dispositivos – aproximadamente três para cada pessoa.
Fica claro, assim, que o uso da IA dentro de um setor estratégico como o Telecom, que fornece serviços vitais para toda a cadeia da economia digital e de negócios, é essencial. A cada novo serviço ou ambiente criado em favor do cliente, sejam redes de 5G, 6G, Metaverso ou da Internet das Coisas (IoT), cresce a pressão sobre as operadoras, principalmente porque as receitas não acompanham a velocidade dos investimentos necessários para dar conta das demandas presentes no mundo todo.
Como alguém que atua há décadas neste mercado, gosto de insistir no tema relacionado ao Open Telecom, que já abordei anteriormente em um artigo, e que vejo ganhar corpo e forma, pouco a pouco, no mercado nacional e internacional. Assim como os seus “primos” – o Open Banking, o Open Finance, o Open Investment, e o Open Insurance, para ficarmos nos mais conhecidos –, ele se baseia no compartilhamento de dados por melhores ofertas no ambiente Telecom, colocando o CX no centro da estratégia em um mercado de forte competição.
Neste novo momento em que a IA avança a passos largos, sobretudo na área da Generativa, estamos indo além dos bancos de dados e dos modelos de aprendizado supervisionados pelos humanos, adicionando uma camada de acessibilidade ao consumidor final que pode, por meio do cruzamento de informações, ter acesso a uma gama ampla de oportunidades que mais se adequem às suas necessidades. A cada reunião que tenho com colegas do mercado, percebo que a urgência está colocada, e os primeiros exemplos já estão aí na vida de todos nós.
O desenvolvimento de marketplaces e de SuperApps, áreas em que se agregam múltiplos serviços e ofertas ao consumidor, está em alta no mundo Telecom. O foco é agilidade e eficiência, buscando o melhor preço que, por sua vez, trará a devida retenção dos clientes. E a tomada de decisão, como é comum no ambiente dos bancos, é na tela do celular. Hoje, quantos de nós não conversamos com chatbots sobre problemas diversos, do pedido de segunda via até uma alteração no plano contratado. Mas isso é pouco, pois o potencial é muito maior.
Com a hiperpersonalização, já temos situações em que você, ao comprar um novo celular ou computador, pode sair com seguro contratado, cashback assegurado em um novo cartão de crédito e um novo pacote de dados, mais vantajoso e que uma a sua rede móvel à residencial e/ou comercial. Os grandes modelos de linguagem (LLMs) da IA nos permitem cruzar os bancos de dados de tal forma que, em questão de minutos, tudo isso pode ser realizado – a ampliação do universo Open tornará isso mais e mais um fato corriqueiro.
Não por acaso, estamos vendo as principais operadoras no Brasil entrando com força no campo dos pagamentos digitais. Do ponto de vista estrutural, há um conjunto de licenças para se obter antes de iniciar qualquer operação no setor. Na outra ponta, você vê o Telecom andando de mãos dadas com o Banking e o Finance, gerando múltiplos benefícios. E, cada vez menos, esses protagonistas estarão separados, tendo por base data analytics, CX e QA.
Logicamente, os desafios da inovação, do avanço tecnológico e culturais são muitos. O Brasil tem uma das maiores redes privativas do planeta e novas formas de monetização atraem o interesse das operadoras – uma demonstração disso é a possibilidade do compartilhamento de APIs de forma padronizada e aberta, permitindo que desenvolvedores criem serviços interoperáveis e hiperescaláveis (iniciativa Open Gateway). Outras possibilidades envolvem soluções de IoT, banda larga doméstica sem fio, redes 5G para empresas, robótica, e novas infraestruturas digitais para setores como Saúde, Indústria e Comunicações.
Outra área de forte consumo de dados, a de Jogos, tem conexão direta com a Realidade Virtual (VR) e o Metaverso, que seguem em desenvolvimento e podem gerar novos ambientes digitais de negócios. Para dar conta de todas essas possibilidades, é preciso investir em infraestrutura, em redes mais potentes e componentes que permitam conectividade intensa associada com baixo consumo energético. Estamos falando de todo um ecossistema que une o Telecom a outros players (software, Nuvem, Big Techs, consultorias, entre outros) para, ao final, beneficiar o CX, quer seja no B2B ou no B2C.
Quanto mais rapidamente o Open Telecom avançar, mais opções o consumidor terá junto às várias operadoras que, por sua vez, terão de se antecipar diante da forte concorrência setorial. Ao associar a IA e tecnologias derivadas em favor de uma experiência forte e positiva dos clientes, cria-se uma cadeia virtuosa que, ao final, acelerará negócios e oportunidades.
(*) Vice-presidente de Telecom da GFT Technologies no Brasil.