Eduardo Masulo (*)
No universo logístico do segmento alimentício, a relação tempo e dinheiro tem ainda mais impacto nas receitas das empresas devido à perecibilidade. A sigla FIFO (do inglês, “First in, First out”, ou seja, Primeiro a entrar, Primeiro a sair) foi uma alternativa criada no segmento com objetivo de reduzir perdas com alimentos que envelheciam dentro de armazéns por conta de desequilíbrio entre produção, transporte e vendas.
Esses produtos deteriorados tinham como destino as incinerações ou os descartes em aterros sanitários, o que gerava altos custos e perdas de receitas e de market share. Porém, como alternativa a esse cenário, os produtos com validades curtas passaram a fazer parte dos catálogos de vendas, servindo de válvula de escape para garantir negócios e alimentos em tempos de crises.
É a partir daí que começou um novo problema: os comércios de FIFOs ou “Fifeiros”, que trabalham com vendas exclusivas de produtos com preços atrativos e descontos que chegam até a 80% do valor original. Naturalmente, o público-alvo dos FIFOs está localizado nos subúrbios e dentro de áreas conflagradas, como comunidades que sofrem influência do tráfico de drogas e possuem menor poder de compra.
Por esse prisma, realizar entregas nessas regiões oferecem maiores riscos às tripulações e cargas e aos veículos, além da exposição das marcas, pois não há controles desses produtos após serem entregues aos estabelecimentos. Os vendedores, por sua vez, passaram a enxergar uma oportunidade para driblar a falta de um preço competitivo e, com isso, esperam os produtos mudarem para a faixa de preço mais adequada para a realidade atual do país.
Como resultado, os armazéns perdem giro de estoque e passam a ficar lotados, aumentando os custos e o volume de veículos de cargas que passam a transitar com maior frequência em favelas, se tornando vulneráveis a abordagens e, consequentemente, às perdas por roubos de cargas. Outro ponto importante é que, devido aos preços baixos, a revenda de FIFOs se tornou uma realidade que não para de crescer.
Muitos compram para consumo próprio, porém uma boa parte revende em trens urbanos e metrôs. Não há nada de errado em revender produtos com prazo de validade próximo a expirar, porém a falta de um olhar mais atento por parte das empresas produtoras é deixar de perceber a nocividade desse problema: muitos clientes estão deixando de comprar de quem produz para comprar em “Fifeiros.
A informalidade, nesse sentido, inicia um ciclo que prejudica a grande massa de clientes que compra com preços definidos pelas companhias, e as marcas, principalmente quando se trata de produtos frigorificados, que ficam expostos e armazenados em condições inadequadas.
O comércio formal sofre ao competir com a informalidade, uma vez que um paga impostos, que pesa no final das contas, enquanto o outro lado não sofre nenhum tipo de fiscalização.
A conta não fecha e a médio prazo trará consequências danosas nas áreas comerciais, que atualmente já estão reféns de descontos. É preocupante o caminho que está sendo fomentado por ausência crítica da forma como são tomadas decisões sem a avaliação das consequências das vendas de FIFOs.
Deixar de vender não é uma solução, mas limitar a venda é algo a ser pensado, pois o problema não se trata somente de escoar um estoque envelhecido, mas sim em pensar em não criar um ciclo vicioso que, no final das contas, será igual ou pior que os custos com incinerações ou descartes em aterros sanitários.
Realizar acompanhamentos periódicos de estoques, influenciar ações de vendas e ter controles de previsibilidade são ações que reduzem a probabilidade de estoquem envelhecerem e reduzem a exposição das marcas nos FIFOs.
(*) – É consultor sênior na ICTS Security, empresa de origem israelense que atua com consultoria e gerenciamento de operações em segurança (https://ictssecurity.com.br/).