Rogério Matofino (*)
Antes de seguir a leitura, enfatizo que são experiências reais de um sonhador que visualiza uma empresa estruturada e que não dependa de seu fundador para seguir atuante no mercado. São erros. Erros de quem conseguiu perceber exatamente em quais pontos agir para recuperar o campo cultivado que foi temporariamente invadido por um “vírus” – cujos tentáculos foram neutralizados até que atualização de sistema seja concluída e o vírus eliminado.
Quatro anos de imersão prática entre dezenas de projetos entregues para clientes, construção de rede de contatos profissionais, muita persistência, busca por informações a todo instante a fim de defender um propósito validado pelo mercado. Desde menino eu sonhava ser empresário e as vezes questionava meu pai, depois de ouvir notícias no rádio, sobre “por que eles [governo] não conseguiam melhorar o Brasil?”, “os donos de empresas não podem ajudar?”.
Saí para rua e troquei picolés por dinheiro antes mesmo de frequentar as aulas na pré-escola. Segui carreira no varejo e, hoje, tenho uma agência especializada em Internet Marketing. Em 2011 surgiu A Oportunidade e então nasceu minha empresa. Era uma produtora de sites (desenvolvimento web) que também oferecia serviços de marketing no mundo digital. Muitas “coisas” aconteceram, pessoas entraram e outras saíram, clientes, tecnologia. A verdade é que eu não me sentia realizado com aquela entrega. Um dos meus mentores perguntou durante um café: “qual o seu propósito, por qual razão você faz o que faz?”.
Foram oito meses incansáveis de busca por resposta até que um dia “a ficha caiu”. Decidi então mudar o modelo de negócio da agência, a estratégia, procedimentos, ferramentas, portfólio de entregáveis… A equipe também sofreu alterações [de forma orgânica, inclusive]. Passamos a fazer algo que está no nosso DNA e vai além do resultado financeiro. Vendas por atração, estratégia de comunicação digital (e performance) para fortalecer relacionamentos antes e depois da venda é o que entregamos para nossos clientes.
- – Virada radical vs. Reposicionamento – Inovação, reposicionamento e mudanças no modelo de negócio são, em geral, paradigmas que assumem que as empresas podem e devem utilizar ideias e caminhos tantos internos quanto externos para ofertar novidades ao mercado em seu caminho de crescimento.
Quando se fala de governança corporativa, sustentabilidade de negócios, gestão de projetos, etc., os gestores levam a sério a famosa “Curva-S”.
Posso garantir que este conceito faz uma baita diferença na tomada de decisão.
Minha escolha foi radical ao ponto de que, numa sexta-feira vendíamos sites; na segunda-feira seguinte, não mais. Focamos 100% em Content/Inbound Marketing. Reposicionamento até permite uma virada de curto/médio prazo por entrar no contexto de campanha. Estratégia sustentável deve assumir o lugar da “virada radical disruptiva” quando se pretende adotar um novo modelo de negócio, um novo produto/serviço, uma tecnologia.
Olhando agora, teria sido inteligente deixar de fazer sites somente quando o número de clientes de Content/Inbound garantissem faturamento superior aos projetos de desenvolvimento web. Ao invés de entrar no vermelho, manteria a saúde financeira da empresa estável e crescente. Primeira grande lição.
- – Ciclo de venda – Imagine o estoque de um supermercado. Considere que o giro de “produto xpto” na prateleira aconteça três vezes ao mês. Ou seja, a mercadoria fica no máximo dez dias em exposição até que alguém compre o item. Significa que o estoque destes produtos sofre exatas 36 reposições ao ano para atender a demanda de compra. Ciclo de venda é exatamente a linha do tempo necessário para fechar um novo negócio. O restaurante tem ciclo diário, a escola particular é mensal, o IPTU anual.
Para cada tipo de negócio um ciclo, fases, abordagens específicas. Identificar os passos e estágios chave para nova estratégia gera fortes impactos nas vendas. O empresário deve ter em mente que será necessário rever os processos, talvez contratar novo time comercial, ajustar as previsões financeiras. Em minha experiência, estava absolutamente confiante e não fiz nenhuma verificação. Afinal, era comum vender um projeto de criação de site em duas semanas, além de colocar em produção (pagamento pontual).
Quatro meses após a “virada radical”, percebi que vender projetos de consultoria era algo desafiador e demorado porque o contrato era assinado depois de três ou quatro meses após a primeira abordagem de venda (pagamento recorrente). Qual é o ciclo de vida média de um site? Três anos? Vender, entregar, cobrar, finalizar em seis meses é um prazo razoável? Parece que sim. Já o modelo adotado para projetos de consultoria em Inbound é anual com pagamentos mensais.
Como otimizar tudo isso e manter a saúde financeira da empresa em modo estável crescente? O custo de aquisição de novos clientes é o mesmo para ambos as situações? Mudou o cenário, mudaram as escolhas. Considerar esses conceitos e métricas tornam-se imprescindíveis na tomada de melhores decisões. Segunda grande lição.
- – Refutar parcerias estratégicas – Características comportamentais do empreendedor fazem toda diferença no processo de inovação e raramente se encontra alguém completo. Quando o assunto é dominância cerebral, por exemplo, me destaco nas esferas experimental e relacional – pontos que endossam visão mercadológica, encontrar alternativas, fazer correlações, transformar problemas em projetos, negociação e valorização do cliente.
Mas nem só de liderança, estratégia e propósito vive o homem. A moeda tem dois lados e é necessário o equilíbrio tático em torno de análises e controles efetivos. Ou seja, administrar, implementar, acompanhar, garantir entregas são responsabilidades vitais na empresa.
Sempre fui resistente a ideia de sociedade e optei por atuar como empresário individual. Hoje entendo que um sócio, um colaborador de alta confiança, além de excelentes parceiros alinhados ao ganha-ganha também é vital para o negócio. Um empreendedor como eu precisa ser apoiado por pessoas com perfil tático/útil e que divida uma meta em pequenas partes, que administre e implemente o plano.
Refutei em fechar parcerias altamente estratégicas que trariam receita para agência porque achava que o mundo girava em torno do meu umbigo e discordava em passar por treinamentos específicos. Lembro de argumentos como “especializei-me em SEO há mais de seis anos e vou ter que passar pelo programa ‘engage’ para poder firmar um compromisso?”
Por sorte, esses parceiros persistiram e seis ou sete meses depois assinamos contrato por conta do principal ingrediente: relacionamento. Ter maturidade para compreender que um sócio ou um time de pessoas pode acelerar a realização proposital de uma visão de negócio e conquistar resultados sustentáveis dá segurança ao empresário e dispara a produtividade. Como diz o provérbio africano: “Se queres ir rápido, vá sozinho. Se queres ir longe, vá em grupo.”
- – Não ser produto do produto – Lembra da Curva-S? Ela cabe aqui também. Se você ainda não tem um caso de sucesso, não é produto do seu produto, como pode ousar uma mudança brusca de atividade empresarial? Não considerei sequer o básico de campanha publicitária. Sim, dei um tiro no pé. A velha crença de que na casa de ferreiro o espeto é de pau já venceu.
O grande psicólogo Robert Cialdini recomenda que você deva ser exemplo para potencializar o poder de persuasão e consequentemente obter sucesso em negociações, por exemplo. A estratégia de comunicação, a abordagem de venda, a forma de atendimento de uma produtora de sites não combina com uma consultoria de Content/Inbound marketing. Além da demora em promover o próprio negócio, perdemos oportunidades durante o período em que relutava as propostas de parceiros.
Focamos então na solução e cada pessoa da equipe trabalhou em na construção de um “case” de Inbound Marketing, inclusive em projetos pessoais. A ideia de ser produto do produto passou a fazer parte do dia a dia e transformou-se em um enorme brainstorming. O time ganhou confiança e alinhou as entregas com o discurso do comercial, resultando em entregas com melhor qualidade para os clientes. Use seus próprios produtos, abuse dos seus próprios serviços.
- – Qualificação da Equipe X Entrega – Entre no jogo para ganhar. Tenha certeza de que seus jogadores estão preparados para correr, criar soluções em campo e fazer o gol. E mais do que isso, que estão preparados para fazer o que deve ser feito propositadamente. É comum que o empresário esteja enlouquecido com as rotinas do dia a dia da empresa e deixe passar detalhes que certamente irão comprometer a eficiência e os resultados.
É compromisso do líder assumir que o desempenho necessário para equipe atingir metas e objetivos depende pessoalmente dele e não adianta investir somente em ferramentas esperando que os liderados resolvam processos e caminhem sozinhos. Delegar com excelência significa direcionar, orientar e acompanhar as entregas da equipe.
Bem, estamos falando de erros que valem ouro. Quando decidi reposicionar o negócio, compartilhei a estratégia com a equipe e eles disseram estar preparados para atuar nas novidades e, acredite, fui convidado a “vai pra rua vender que nós tocamos os projetos” e fiquei anestesiado com aquela atitude. No entanto, não verifiquei em termos práticos se, de fato, aqueles profissionais estavam capacitados o suficiente para entregar um novo tipo e formato de projeto.
Pessoas. Taí o maior desafio de qualquer empresário… Outra lição!
Mudou o modelo, as pessoas, os processos, o perfil de cliente, a tecnologia e tudo estava bem aqui na minha cabeça. A equipe não tinha clareza de processos, não dominava as ferramentas, tinha dificuldade em interpretar uma estratégia e desenvolver as ações necessárias. Só validei essas deficiências quando os clientes começaram a manifestar insatisfação com as entregas.
Fizemos esforços para melhorar o atendimento e CRM (gestão de clientes) da agência, mas nossa atuação ainda era fraca. Os maiores desafios consistiam em descentralizar a comunicação, cumprir prazos e, de fato, fazer a gestão dos projetos. Decidi mapear as deficiências, estruturar um programa de estudo colaborativo e estimular cada pessoa a desenvolver suas habilidades, dar aula aos demais colegas sobre os temas previamente planejados.
Foram três meses intensos de aprendizagem, talentos revelados e boas surpresas. Reforçamos a importância de ser produto do produto, geramos conteúdo, melhoramos muito a comunicação, revisamos os projetos… todos entendiam o que era um workflow de CRM (processo) e os motivos pelo qual tínhamos que nos conectarmos com os valores de cada cliente. Passamos a entregar valor no lugar de bits.
- – Vender ou Fazer? – Definitivamente, quem faz tudo não faz nada. Com um lado da moeda descoberto, passei a alternar as atividades (comercial, atendimento, produção) até o ponto em que me vi desfocado e ao mesmo tempo imerso nos projetos. Cheguei à conclusão de que o vendedor deve evitar contato com o operacional para manter-se imune à insegurança e pensamentos do tipo “vou vender, mas será que os caras vão conseguir entregar?”.
De outro lado, é natural para os responsáveis pela entrega pensarem que “o pessoal do comercial só perde tempo com reunião, networking, etc.”. Penso que o ideal é que cada profissional se dedique aquilo que se propõe a fazer com maestria. Gosto de fazer, mas as consequências neste caso acenderam a luz vermelha e comprometeram complemente minhas ações comerciais.
Somente depois de a equipe visitar cada cliente, equilibra as entregas, reduzir os conflitos e eliminar jobs “ladrões de tempo/dinheiro” é que voltamos a dar atenção para as oportunidades e propostas paradas no pipeline de venda. Ter pessoas chave para atividades vitais da empresa é essencial para garantir proposta de valor ao cliente e atingir objetivos e metas. Também é importante expressar confiança na sua própria capacidade de realizar uma tarefa difícil ou enfrentar um desafio.
- – Olhar para crise econômica e política – É preciso dizer que os recursos financeiros se esgotaram depois de todos esses erros? A sequência de erros me fez desalinhar o foco e, para completar, me deixei contaminar pelo pessimismo brasileiro alimentado pela crise política e questões sociais que destroem a economia e nos leva para a recessão.
Noticiário, besteirol de redes sociais, mensageiros como WhatsApp, excesso de informação, estafa… Tudo isso contribui na perda de foco e tempo do empresário, que por sua vez, baixa a guarda para persistência, se distrai a cada minuto e “esquece” de fazer as coisas antes de ser solicitado ou é forçado pelas circunstâncias.
Enfim! Olhar para fontes de informações que o mantenham no trilho e deslizar rumo aos objetivos do plano estratégico é o mais adequado. Ao invés de timelines como Facebook, faça ligações telefônicas para os clientes a fim de ajudá-los a mapear novas oportunidades, entender as dificuldades, buscar novos negócios. Faça como sugere o psicólogo Daniel Goleman e reserve tempo para refletir, manter foco no foco.
Para finalizar, fontes como IBGE e Sebrae apontam que cerca de 53% das empresas brasileiras fecham após quatro anos de atuação (dados de 2013). Para o empresário, um oceano de variáveis a serem administradas diariamente e sem descanso. Para os americanos, fracasso significa crescimento, maturidade. Os brasileiros tendem a desqualificar o empreendedor.
Não vejo problema algum em compartilhar estas experiências aprendidas a preço de ouro. Tomar consciência e usar os erros para potencializar as forças me faz acreditar ainda mais que iniciativa somada a conhecimento, dinheiro e atitudes positivas (sim, comportamento) é fundamental para materialização de um projeto. Gosto de ver o copo cheio e avalio estes erros como experiência prática, como impulso produtivo que me possibilita transformar um sonho em algo concreto e de valor para sociedade, tanto em termos econômicos como sociais.
É necessário dizer ‘Não’ e enfrentar o caos com valentia. Você precisa concentrar pessoas, energia, fazer com que o ambiente ao seu redor apoie suas ideias e queira realizar os projetos com ambição. Cuidar da saúde, alimentar-se bem, tirar folgas também é necessário para manter o foco no foco e lidar melhor com os desafios do dia a dia. Lembre-se: o empresário nunca faz o que faz somente pelo dinheiro.
Nem tudo são flores. Decisões dolorosas foram tomadas para podermos ajustar a empresa e garantir que o plano fosse executado de forma propositada. Afinal, resultado positivo é relevante para a continuidade do negócio. Estamos fora da estatística fúnebre do IBGE. Sim, boiando e finalizando a limpeza de um “vírus” no sistema para acelerar os motores e buscar ouro em terra firme.
(*) – É arquiteto de negócios e publicitário especializado em gestão. Atua também como professor universitário e palestrante nas áreas de Vendas, Comunicação, Marketing e Transformação Digital.