O brasileiro vive mais e, para além do presente, essa longevidade se consolida em números a longo prazo. De acordo com dados do IBGE, o Brasil tem 29,6 milhões de pessoas acima de 60 anos (marca inicialmente prevista para se alcançar somente em 2025), o que corresponde a mais 14,3% da nossa população, número que aumentou 18,8% nos últimos quatro anos. Até 2050, a terceira idade representará 30% dos brasileiros e, em 2060, o percentual será maior do que de jovens.
Esse cenário colocou os idosos no radar de novos negócios, que oferecem diversas opções de produtos e serviços para esse consumidor, em especial, nas áreas de saúde e bem-estar. Para o especialista em franchising Claudio Tieghi, da Kick Off Consultores, o mercado de produtos e serviços para idosos é recente, porém já de grande importância para a realidade da economia brasileira, acompanhando o fenômeno mundial de envelhecimento das populações.
Ele lembra que 50% do consumo global é gerado por pessoas com idade acima de 50 anos e que, no Brasil, os idosos consomem R$ 1 trilhão por ano, o que equivale a 13,7% do PIB brasileiro em 2018. “Produtos e serviços para idosos no franchising se tornaram mais expressivos no Brasil a partir dos anos 2000. Um exemplo claro são as redes de cuidadores e serviços especializados para idosos, considerado segmento já maduro à época nos Estados Unidos e na Europa. Porém, o mercado, assim como o franchising, vem se adaptando na última década aos novos padrões do que considerávamos velhice.
Pode-se notar na moda, no entretenimento, em cursos, alimentação, seguros, serviços, entre outros, que o cliente está ficando jovem por mais tempo. É comum observar pais e filhos assumindo o mesmo estilo de vestir, frequentam a mesma academia, consomem produtos de higiene e beleza similares, por exemplo”!, destaca Tieghi. A pandemia, no entanto, impôs uma nova realidade para a sociedade e o desafio para o mercado de seguir atendendo uma demanda no grupo de risco, que, para além das expectativas da maioria, disparou nesse período.
A rede de cursos de neuroaprendizagem Ginástica do Cérebro precisou se reinventar no período e promover a inclusão digital dos seus alunos da terceira idade, que representam mais de 80% do seu público. “Precisamos agir rapidamente, pois, além de garantir que nossos alunos não tivessem perda de aprendizado, tivemos que criar soluções para a forte demanda que surgiu de famílias interessadas no curso para manter seus idosos ativos durante o confinamento da quarentena. Foi um aumento na ordem de 40%”, revela Nadia Benitez, CEO da Ginástica do Cérebro.
As atividades consistem na estimulação cognitiva por meio de atividades como o soroban (instrumento lógico-matemático de origem oriental), jogos e desafios que estimulam a memória e o raciocínio lógico, entre outras capacidades, que auxiliam na prevenção de doenças neurodegenerativas. Com a paralisação das aulas presenciais e o tempo correndo, os projetos passaram a ser de urgência. A empresária, que também é psicopedagoga, desenvolveu com sua equipe um plano de ação e migrou todas as 20 unidades da rede para o ensino a distância.
Entraram em cena as aulas online, o que manteve as atividades para antigos e novos alunos e também ajudou na inclusão digital dos mesmos. A estratégia de sobrevivência virou janela de oportunidade para o crescimento do negócio, mesmo num momento tão delicado como o atual. Com o sucesso da nova empreitada e a chegada de novos alunos, Nadia decidiu criar um modelo de franquia para atender à nova realidade dos potenciais empreendedores também.
Trata-se de um formato de microfranquia, home office, com aulas domiciliares e suporte online, para quem deseja ter o seu próprio negócio e gerar renda mesmo na crise. “Nosso modelo de negócio está totalmente antenado ao momento, pois atendemos, em maioria, a um público que integra o grupo de risco do coronavírus, o idoso, mas que precisa deste serviço para manter a sua saúde mental, ainda mais nesse momento em que todos seguem precisando ficar em casa pelo maior tempo possível”, explica.
50% do consumo global é gerado por pessoas com idade acima de 50 anos e, no Brasil, os idosos consomem R$ 1 trilhão por ano, o que equivale a 13,7% do PIB brasileiro em 2018.
Para adquirir uma microfranquia home office da Ginástica do Cérebro, o investimento inicial total é de R$ 20 mil, com estimativa de faturamento médio mensal de R$ 10 mil a R$ 20 mil e lucro de 25% a 40%. O franqueado atua como instrutor das atividades e administrador do seu próprio negócio, com o suporte operacional, pedagógico e consultivo da franqueadora. Esse formato já conta com unidades em São Paulo e um contrato firmado de multifranquia para expandir pelo país.
Já a Cuidare Brasil, uma das maiores redes de cuidadores do país, ajustou toda a cadeia de operação, da estrutura da sede, em Natal, e gestão da rede à logística dos cuidadores. “Mudamos imediatamente a logística dos nossos cuidadores, que não puderam mais fazer trabalhos extras e ficaram restritos a apenas um idoso. Além disso, desenvolvemos e lançamos uma cartilha de procedimentos para garantir a segurança dos assistidos”, explica Izabelly Miranda, CEO da Cuidare Brasil.
A busca pelos serviços, que subiu 30%, também exigiu a mudança na gestão do negócio, que se digitalizou. Com isso, a empresa implantou um software para ajudar no gerenciamento das suas unidades, que integra, por exemplo, um sistema de ponto de funcionários via celular por geolocalização, gerando relatórios com horários exatos, número de dias trabalhados, faltas, atestados, salário base, entre outros itens. As mudanças têm surtido efeito e rendendo frutos no tamanho da rede, que já ultrapassa 80 unidades em 20 estados brasileiros, no DF e em Portugal, além de operações em fase de implantação na Argentina e no Canadá.
Tieghi também aponta para um outro movimento no mercado que tem chamado a atenção nos últimos anos e que tem a ver com os processos de venda de franquias e seleção de franqueados. “Se era comum as franqueadoras só aceitarem novos franqueados com até 55 anos até o final da década de 1990, agora esse tipo de critério de corte não existe mais. Com a adoção de um estilo de vida mais saudável e o auxílio da tecnologia em serviços de saúde, chegam para o franchising candidatos não só mais experientes, mas com vitalidade, interesse em crescer pessoal e profissionalmente, almejando um propósito nas marcas que seja compatível com o seu e, além de tudo, mais capitalizados e conscientes do que é empreender no Brasil”.
É o caso de José Carlos Fernandes, 70 anos, do Rio de Janeiro, que, após anos trabalhando na indústria farmacêutica, decidiu empreender com marketing digital por meio da franquia Guia-se, de agências digitais, em 2011. “Hoje me sinto bastante à vontade, transito bem neste segmento. Especializei-me em Google Ads, tenho certificados do Google, aprendi a desenvolver sites WordPress e gerencio campanhas de anúncios nas mídias sociais. Existem duas outras pequenas empresas na família que ajudo com o marketing digital e que têm conseguido excelentes resultados”, garante.
A Dank Idiomas, curso de idiomas que opera no formato de escola móvel, possui treinamento voltado para franqueados idosos, com aulas de inclusão digital que abordam, por exemplo, o uso de ferramentas tecnológicas e a gestão das mídias sociais da sua unidade. “Muitas preconcepções e outras barreiras vêm sendo derrubadas”, afirma Mariza Gottdank, CEO e fundadora da rede, formada por 14 unidades espalhadas por Brasil e Canadá.
Para Liana Segal, a idade é uma grande aliada. Ela inovou há mais de 20 anos ao criar o primeiro coworking dedicado exclusivamente aos profissionais da saúde, o Espaço Médico Brasil, no Rio de Janeiro. A pandemia veio, mas não assustou a empresária, que decidiu investir em tecnologia (telemedicina, sistema de marcações de consultas, call center, por exemplo) e na expansão do negócio, com a formatação da sua franquia.
“Com 61 anos e três netos”, como costuma dizer, a empreendedora atribui à experiência trazida pelo tempo o fator fundamental para conseguir encarar desafios como o de 2020 de forma tão destemida. “Como eu comecei a minha vida empresarial com 27 anos, muito cedo, sentia, muitas vezes, que a juventude não me trazia credibilidade. Hoje, adoro dizer a minha idade e ver que ela me empodera e autoriza minhas ações”, revela e completa: “Como mulher, mãe e avó, me vejo uma empreendedora mais amorosa nos negócios, com mais empatia, mas firme para atingir os objetivos”.
A empresária ressalta, no entanto, que os anos de vida e experiência não podem ser um fator que crie uma zona de conforto no aprendizado e na capacidade de mudar e crescer. “Sonhos não podem envelhecer, nem a capacidade de inovar, se renovar e crescer. Eles devem, sim, amadurecer até que se tornem realidade. E o tempo precisa ser visto e usado como um parceiro nesse processo”, conclui.
Fonte e mais informações: (www.mercadocom.com.br).