Patrícia Punder (*)
Em um mundo pré-pandemia, a massificação da produção, do consumo e do crédito gerou uma arquitetura social, em que para se alcançar elevados índices de vendas e lucro, era necessária uma grande difusão da publicidade e das estratégias mercadológicas, tornando, assim, o consumidor vulnerável às ações dos produtores e fornecedores de bens e serviços.
Foi nesse cenário que os influenciadores digitais se tornaram grandes aliados na divulgação e indicação de produtos e serviços, visto que eles conseguem impactar a vida dos seus seguidores, moldar comportamentos, direcionar uma decisão de compra e prover uma maior aproximação entre uma marca e o seu público-alvo.
Com a pandemia, o mundo mudou e estamos experimentando o novo “normal”. A nova etiqueta requer distanciamento social e uma série de cuidados para evitar a disseminação do vírus. Consequentemente, grandes festas e viagens glamurosas não devem acontecer antes de existir um tratamento ou vacina, o que especialistas de todo mundo dizem que não deve acontecer ainda este ano.
Como os influenciadores digitais são um eco muito significativo em um mercado global cada vez mais centrado na ideia da presença “omnichannel” e no desenvolvimento de estratégias eficientes de engajamento online, quais os cuidados que as empresas devem ter ao contratar esse tipo de profissional? Em primeiro lugar, consiste em entender que, nem sempre a personalidade com mais seguidores, será o ideal para sua marca.
É fundamental analisar quais vozes da internet tem maior aderência à cultura e aos valores da sua empresa, propondo campanhas aderentes a estes elementos, com o intuito, de fato, de ser capaz de gerar um real engajamento relevante. Uma empresa voltada para a transparência e sustentabilidade a longo prazo, deve pautar sempre a sinergia entre os valores éticos do influenciador digital a ser contratado e seu DNA ético definido no seu respectivo Código de Conduta ou de Ética.
Já quando da contratação dos serviços, recomenda-se fortemente conhecer com profundidade quem se está contratando. Uma prévia análise da reputação deste profissional tornou-se mandatória, pois qualquer deslize físico ou digital pode acabar afetando negativamente a empresa que o escolheu. Postagens antigas também podem vir à tona, arranhando a reputação das companhias. Infelizmente ou felizmente, dependendo do ponto de vista é claro, as redes sociais não perdoam e não esquecem.
Importante frisar que muitos influenciadores digitais são pessoas normais, que não se prepararam totalmente para se tornarem “celebridades”. Portanto, trata-se de uma contratação com perfil de alto de risco. Deve-se buscar o elemento da prevenção na contratação de terceiros aplicável a todas as empresas que possuem programas de integridade implementados ou, caso não possuam, contratar consultorias especializadas que possam fazer a “verificação dos antecedentes” ou “background check” do potencial influenciador digital a ser contratado.
Os influenciadores digitais podem ser considerados como “líderes” e, portanto, têm responsabilidade civil, criminal e ética sobre o que falam, como se expressão e, principalmente, quais são seus comportamentos dentro e fora das redes. Liderança não é apenas aquilo que uma pessoa declara, mas aquilo que a pessoa demonstra. Aqui reside o perfil de alto de risco desta contratação.
Muitas empresas baseiam a contratação dos influenciadores digitais apenas em contratos jurídicos bem escritos, com clausulas estritas em relação a comportamentos e Compliance, mas se esquecem que quando uma crise acontece, a única coisa que será possível recuperar será a parte material como, por exemplo, a devolução do valor dos serviços ou até uma indenização. Entretanto, quando algo negativo aparece na internet, a disseminação da informação online e muito rápida e não existe muito tempo para gerenciar a crise reputacional existente.
Nesta situação de gerir a crise, muitas empresas, devido a uma serie de exemplos negativos que aconteceram, simplesmente decidem manejar a crise por meio do rompimento contratual e/ou comunicados oficiais informando que tal influenciador digital não trabalha mais para a empresa. Contudo, a crise já está instalada. Não existe como “apagar” no mundo digital que o influenciador era um representante/líder de determinadas marcas, produtos e serviços perante seus seguidores e até perante a sociedade em geral. Reverter tal situação utilizando os meios acima mencionados não será suficiente para minimizar os estragos causados à reputação da empresa.
Quase todas as crises podem ser prevenidas mediante a implementação de processos de controles internos sólidos e programas de integridade eficientes. Nem toda a contratação deve passar pelo crivo de um Compliance Officer, mas contratações contendo perfil de alto risco reputacional devem ser parte da contribuição deste profissional. Quando se fala em reputação, prevenção sempre foi o melhor caminho a trilhar. Afinal leva-se 30 anos para construir uma reputação de uma empresa e menos de 5 minutos para destruir a mesma.
(*) – É especialista de compliance e professora da LEC e da Universidade Federal de São Carlos.