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A parceria estratégica Brasil-EUA-China

em Artigos
quinta-feira, 21 de maio de 2020

André Frota e Luiz Domingos Costa (*)

Como ficarão as relações entre Brasil e China em um contexto pós-pandemia?

A desconfiança internacional que surgiu após a disseminação da epidemia com o grau de transparência das autoridades chinesas em relação ao tratamento dado ao surgimento do Covid-19 contaminou setores da sociedade brasileira.

Grupos organizados e mesmo autoridades políticas próximas à Presidência da República manifestaram-se em redes sociais criticando a falta de lisura do governo chinês em relação ao real nível de transmissibilidade, a letalidade e a falta de controle das autoridades chinesas sobre o vírus.

A rede de apoiadores do presidente norte-americano, do presidente brasileiro e mesmo congressistas de ambos países adotaram uma posição crítica pós-pandemia ao governo chinês. Dada essa conjuntura, como ficarão as relações entre Brasil e China em um contexto pós-pandemia?

Os argumentos que devem orientar essa resposta devem partir I) da história das relações bilaterais entre Brasil e China; II) dos interesses estratégicos entre ambos os países no século XXI; III) da forma como as relações entre Brasil e EUA serão inseridas nesse triângulo.

A história das relações entre Brasil e China é marcada, desde o reconhecimento da República Popular da China em 1974, por sucessivas tentativas de aproximação, que foram se consolidando a partir dos anos 2000. A formação de uma relação estratégica entre ambos, que passa pelas dimensões econômica, política e tecnológica, tem na participação conjunta no grupo BRICS o simbolismo dessa parceria.

A busca por reformar a ordem internacional que esteve presente na primeira década dos anos 2000, somada à ascensão chinesa como potência econômica global e à criação de mecanismos de participação contra-hegemônicos, que Brasil e China participam como membros, sinaliza a formação de uma parceria que extrapolava apenas interesses comerciais.

De fato, as sucessivas aproximações entre ambos os países resultaram na construção de uma relação inicialmente de trocas comerciais para uma relação que contempla a China como uma das principais responsáveis pelo investimento estrangeiro direto no Brasil, por ser o maior parceiro comercial e pelo projeto conjunto de lançamento de satélites, o programa CEBERS.

Além da história de consolidação dessa relação, existem interesses estratégicos chineses na América Latina. Tanto aqueles de ordem comercial, como são as importações de commodities, como aqueles de ordem tecnológica e política. Ao contrário das parcerias estabelecidas entre os países latino-americanos e os EUA, formadas ao longo do século XIX e XX, a construção de relações bilaterais entre China e cada país da América Latina tem se aprofundado desde os anos 2000.

A China já se configura como o principal parceiro comercial de muitos países do continente, como o Brasil, Colômbia, México, Chile, Venezuela. Esse aprofundamento é uma evidência, afinal, da força crescente da economia e da diplomacia chinesa, que tem uma estratégia reconhecida por ser pragmática e indiferente à coloração ideológica dos governos nacionais.

Diante desse cenário, pode-se perceber uma progressiva influência chinesa na América Latina, que passa de uma perspectiva comercial, para uma perspectiva tecnológica e política. E é nessa dimensão que o Brasil está inserido dentro da estratégia de expansão global chinesa. Como a maior economia latino-americana e líder em múltiplas arenas de negociação regional, como o Mercosul e a Unasul, as relações entre Brasil e China possuem um teor estratégico para ambos.

O fato de a China se apresentar como polo de atração estratégica para muitos países do globo — e, com isso, desafiar a supremacia norte-americana — não foi e não é um problema para muitos líderes mundiais. As relações estratégicas com a China, que são benéficas para a economia brasileira, se tornam um problema em função de um alinhamento direto e automático com os Estados Unidos.

Entretanto, a dinâmica internacional tem sido ditada por relações multilaterais e jogos de soma positiva. Abandonar essa orientação e polarizar contra a China implica a reversão de esforços de décadas da diplomacia brasileira e trará prejuízos para a economia nacional.

(*) – Integram o Observatório de Conjuntura e são professores do Centro Universitário Internacional Uninter.