Mario Barros Filho (*)
A OMS declarou oficialmente o Covid-19, doença provocada pela nova cepa do coronavírus, como uma pandemia. Isto se deu em virtude do grande número de infectados em todos os continentes.
Em razão da pandemia, iniciativas para barrar a sua disseminação foram adotadas no mundo inteiro: países impondo medidas para limitar a circulação e a concentração de pessoas, cancelamentos de eventos e fechamentos de instituições de ensino e locais públicos de lazer, além de mudanças na rotina religiosa, tal como a suspensão de peregrinações à Meca e a realização da primeira audiência geral virtual pelo Papa Francisco.
São apenas alguns dos exemplos que vemos na mídia. No Brasil, o Ministério da Saúde emitiu recomendações de cancelamento de eventos públicos, de isolamento domiciliar de viajantes, entre outras. Instituições públicas e privadas igualmente emitem orientações e comunicados sobre a sua nova rotina de trabalho e atendimento, na tentativa de diminuir a exposição da população ao vírus. Paulatinamente, as pessoas se fecham em casa.
Tudo isso traz a discussão sobre os efeitos do Covid-19 do âmbito médico para o financeiro e o jurídico: como é possível cancelar a minha viagem? Qual será a abrangência dos efeitos econômicos deste cenário que caminha para uma recessão? A resposta ao questionamento aparenta simplicidade em alguns casos.
No setor aéreo, por exemplo, algumas empresas como a Latam, Azul, United Airlines, Air France e KLM flexibilizaram as regras de cancelamento e alteração de passagens, uma vez que pode haver restrição do país de origem, destino e datas originais do voo, deixando para um segundo plano as regras originais do contrato firmado.
Porém, outros setores enfrentarão sensíveis conflitos entre o cumprimento daquilo que foi contratado e a vontade do contratante, em razão da pandemia. Atrasos, falta de insumos, não cumprimento de obrigações contratualmente estabelecidas, entre outros, serão comuns. De modo prático, somente se saberá como isso se operacionalizará quando eventualmente forem verificadas as demandas judiciais fruto destes conflitos de quebra de contrato.
Seguramente, questões a respeito da boa-fé e da força maior serão levantadas para a possibilidade de rescisão ou descumprimento do contrato sem a aplicação de penalidade às partes. De acordo com nossos valores relacionados à boa prática da advocacia, acreditamos que, não só em momentos como o presente, mas sempre, a negociação dialógica traz melhores resultados para todos.
O estabelecimento de um ambiente dialógico propicia a emergência de uma solução que contemple as duas partes e suas percepções multifatoriais do conflito existente. Isto significa dizer que o conhecimento do conflito, bem como a revelação dos “pontos de vista” de diferentes pessoas envolvidas na querela, é a forma pela qual a posição adversarial pode ser reelaborada para uma posição dialógica que resulta na solução para o conflito. Tal prática será necessária ao longo dos próximos meses.
Especialmente em relação à presente pandemia, faz-se essencial manter-se atento aos novos desenvolvimentos e comunicados dos órgãos oficiais, bem como analisar e reanalisar os contratos entabulados e suas cláusulas que versem sobre o tema, a fim de possibilitar um melhor entendimento sobre as consequências jurídicas do COVID-19.
Sejamos realistas, sem sermos alarmistas.
(*) – É advogado, professor do Curso de Medicina da Faculdade Israelita de Ciências da Saúde do Hospital Albert Einstein e sócio fundador do escritório BFAP Advogados.