O psicólogo israelense Yair Amichai-Hamburger, em seu livro Technology and Psychological Well-being (em tradução livre Tecnologia e Bem Estar Psicológico), cita outro psicólogo, Daniel Goleman, que diz estarmos vivendo “a era da melancolia”, pois na atualidade a depressão atinge muito mais pessoas que no passado; diz também que uma das maiores causas desse problema deve ser a tecnologia que nos cerca.
Vivaldo José Breternitz (*)
Nosso estilo de vida é cada vez mais moldado pela tecnologia: celulares, computadores e a internet estão conosco a todo momento; sentimos uma compulsão por checar nossas mensagens e redes sociais e comprar o que há de mais recente em termos de tecnologia.
Amichai-Hamburger, em artigo publicado pela revista The New Scientist, pergunta se estamos sendo servidos ou escravizados pela tecnologia que nos rodeia – e imediatamente responde, dizendo acreditar que a tecnologia está afetando nosso bem estar. Reconhece que tecnologia é importante, mas diz que precisamos impedir que ela controle nossas vidas.
Há evidências acadêmicas mostrando que as pessoas que dão muito valor aos bens materiais, e isso vale para tecnologia, são menos felizes do que as menos materialistas. Materialismo é associado a baixa autoestima, pouca empatia e tendência à manutenção de relações conflituosas.
Além disso, nossa cultura constantemente relembra-nos que “tempo é dinheiro”, o que gera uma necessidade de atingirmos altos padrões de eficiência, levando ao uso constante de notebooks e celulares, suprimindo as fronteiras entre o trabalho e o lar, diminuindo a qualidade do relacionamento familiar e fazendo com que as pessoas se foquem no aqui e agora, em prejuízo de seus objetivos de longo prazo.
Como forma de combater essa postura, Amichai-Hamburger recomenda a aplicação dos preceitos contidos na Self-Determination Theory (SDT), desenvolvida pelos psicólogos Edward Deci e Richard Ryan, da Universidade de Rochester. A SDT identifica três elementos vitais para o desenvolvimento pessoal saudável.
O primeiro deles é a autonomia, a sensação de que nossas atividades são escolhidas (e aprovadas) por nós mesmos. Quando nos sentimos no controle, somos capazes de organizar nossas atividades e definir as fronteiras entre elas. Já quando temos a percepção de que não estamos no controle, tornamo-nos vulneráveis aos nossos impulsos e deixamos as decisões a cargo de terceiros. No que se refere à tecnologia, para ganharmos o controle bastaria desligar celulares em determinados períodos e fixarmos horários para checar e responder e-mails e irmos às redes sociais.
O segundo elemento é o senso de eficiência, a crença de que nossas ações são realmente efetivas. Muitos se sentem eficientes apenas quando tem o modelo mais novo de celular ou quando um grande número de pessoas viu as fotos que postaram nas redes sociais. Mas a verdadeira eficiência precisa ser uma continuação da autonomia: saber o que realmente é importante e fazer isso da maneira mais efetiva, usando tecnologia se e quando aplicável.
O terceiro elemento é a necessidade de nos sentirmos próximos a outras pessoas – e a tecnologia é uma ameaça a essa proximidade: equipamentos acabam criando uma bolha que nos desconecta dos relacionamentos normais – relacionamentos virtuais podem ser interessantes, mas muitas vezes eles se estabelecem em prejuízo dos relacionamentos reais.
Há também evidências acadêmicas mostrando que uma das diferenças principais entre pessoas felizes e infelizes é a presença ou a ausência de relacionamento social satisfatório. O convívio intenso com amigos e familiares é necessário à felicidade.
Amichai-Hamburger menciona um quarto elemento: o pensamento crítico, dizendo que no mundo atual, onde as pessoas estão potencialmente disponíveis para absorver mensagens em tempo integral, é fundamental saber como analisar a qualidade dessas mensagens e simplesmente saber ignorar as que não tem valor.
O autor conclui que o uso desses quatro elementos é a melhor maneira de fazer com que possamos nos relacionar com a tecnologia de maneira saudável, melhorando nossa qualidade de vida sem prejuízo de nosso desempenho profissional.
Vale a pena refletir a respeito.
(*) Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, é professor da FATEC SP, consultor e diretor do Fórum Brasileiro de Internet das Coisas – [email protected].