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Estaria o home office se transformando em um pesadelo?

em Tecnologia
quarta-feira, 26 de agosto de 2020

A pandemia acelerou uma tendência que já vinha sendo observada, o aumento do trabalho na modalidade home office, que em inglês é mais conhecida como WFH – Work From Home.

Vivaldo José Breternitz (*)

A maioria das pessoas gostou da ideia, ao menos em um primeiro momento, quase sempre por permitir evitar o trânsito ou o transporte público sempre ruim e por ter gerado mais tempo livre – a tecnologia tornou a distância irrelevante.

Logo surgiram alguns problemas: com as escolas fechadas, é preciso cuidar das crianças, o acesso à internet nem sempre é bom, em nem todas as residências há computadores para todos e aqueles que vivem em casas ou apartamentos pequenos tem que improvisar locais para trabalhar.

Agora, há uma sensação generalizada de que as pessoas estão se cansando do tal WFH; parece que a pandemia não vai terminar tão cedo e que os aspectos negativos do uso intensivo da tecnologia estão se tornando mais evidentes.

As pessoas estão ficando mais tempo em casa, mas quase sempre estão trabalhando mais; as reuniões online cansam muito, pois exigem concentração maior e são em maior número do que as que aconteciam no escritório, onde muitas vezes uma conversa ao redor da máquina de café resolvia assuntos que hoje são tratados em reuniões.

Além disso, como as pessoas não precisam se deslocar para ir de uma reunião para outra, essas acontecem uma em seguida da outra. Segundo o professor irlandês John Naughton, podemos dizer que o escritório invadiu nossas casas ou que agora estamos dormindo no escritório.

Evidências empíricas estão confirmando esses fatos. Estudos do National Bureau for Economic Research, envolvendo mais de três milhões de trabalhadores americanos, constatou que o número de reuniões aumentou em quase 13% e o número de participantes, cerca de 13,5%. As jornadas de trabalho cresceram quase 50 minutos diários e a troca de mensagens também registrou aumento; é razoável acreditar que esses números podem ser válidos para trabalhadores brasileiros.

Quando o home office começou a ganhar corpo no início da pandemia, muitos passaram a acreditar que os gestores deixariam de suspeitar que pessoas trabalhando de casa não estariam se dedicando o suficiente. Agora, está ficando claro que essas suspeitas não foram deixadas de lado: inúmeras empresas estão implantando ferramentas de vigilância para certificarem-se de que, conforme diz o Professor Naughton, as pessoas estão acorrentadas aos seus notebooks.

Em matéria recente, a revista Wired afirmou que cresceu muito a demanda por aplicativos como Time Doctor, ActivTrak, Teramind e StaffCop – vejam que nome! Eles são utilizados para vigiar os trabalhadores através das webcams de suas máquinas, para obter imagens de telas, horários de log-ins e keystroke logging, que é o registro do que o usuário digita. As empresas querem que o foco e a produtividade sejam mantidos.

Segundo o Information Commissio­ner’s Office, órgão vinculado ao Parlamento do Reino Unido, os empregadores devem informar aos empregados que estes estão sendo vigiados e porque o são. Essa regra deve ser aplicada àqueles que trabalham de suas casas – se isso não está acontecendo, uma ilegalidade vem ocorrendo, e isso é verdade para quase todos aqueles que estão trabalhando de suas casas.

Esse é mais um fator que torna o home office menos atraente, embora não custe lembrar que essas mesmas ferramentas podem ser usadas para monitorar aqueles que trabalham nos escritórios das empresas.

(*) É Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, é professor da Faculdade de Computação e Informática da Universidade Presbiteriana Mackenzie.