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O que houve com a confiança no Brasil

em Opinião
quarta-feira, 07 de junho de 2017

Gaspar Sortino (*)

Você só viaja de avião porque confia no piloto. Mesmo que você não tenha a mínima ideia de quem seja ele. Como pode? Pois é! É a confiança.

Confiança é o fundamento ou os pilares da sociedade. Para que uma Sociedade funcione bem, a confiança tem que se fazer presente, ela é o sentimento ou a firme convicção que alguém tem relativamente a outra pessoa ou a algo e que viabilizam os elementos de fé e segurança.

A palavra deriva de fé, com fé. Confiar. Fé deriva do latim fidelitas, vocábulo que se originou do substantivo fides. A palavra fides designava, nos primórdios da língua latina, a “adesão do devoto aos preceitos de sua religião”. Confiança é o que dá liga à sociedade, assim como é o cimento para a massa. E ela só se mantem, se cada um fizer o que tem que ser feito da forma correta. E a sociedade só dá certo, se cada um realizar seus objetivos com qualidade e eficiência.

Em relação ao Estado Democrático de Direito, o povo elege um representante que vai administrar as coisas do Estado, ou coisa pública, que pertence ao povo. O gestor público é escolhido pelo povo e, portanto, de confiança dele. Assim, espera-se nele que administre a coisa pública como se sua fosse e para o bem dos demais que integram o grupo. Quem administra a coisa pública, administra coisa que não lhe pertence e ela tem proprietário e destinatário, o povo.

Para tanto, deve realizar isso de forma a satisfazer o verdadeiro dono. E o legítimo dono, que é o povo, vai legitimar os atos do gestor, tendo em vista estar satisfeito com o resultado alcançado. Há necessidade de poderes para administrar coisas de outrem. Esses poderes são transferidos geralmente por mandato ou procuração. Nesses instrumentos estão previstos os limites da delegação. Portanto, o gestor só poderá realizar atos limitados expressamente no instrumento. Não pode fazer o que bem entende, como se a coisa fosse sua, e sim, só o que lhe foi atribuído.

Por exemplo, não pode vender, vez que a autorização só lhe permiti gerir. E isso vale para qualquer poder ou órgão do Estado. E a legitimação social só ocorre quando o povo confia nos atos realizados pelo administrador, uma vez que seus resultados beneficiam os titulares do poder, isto é, a sociedade como um todo. E é isso que se espera de todos os poderes públicos. Por exemplo, espera-se do Poder Judiciário que forneça justiça, isto é, o que é justo, reto, correto. Do Poder Legislativo, que legisle em favor do bem comum e do Executivo, que administre a coisa pública com qualidade e eficiência.

Partindo dessa premissa, dá para analisar se houve excesso, ou não, no caso dos representantes da JBS, ao serem isentados de qualquer culpa por parte do Estado, após realizarem o acordo de delação. O ato foi injustificável. Esperava-se dos representantes da Sociedade que se fizesse Justiça, isto é, o que é justo e reto e para isso eles deveriam ter sido julgados e condenados. Decisão que deveria ter sua origem no Poder Judiciário, que é o órgão responsável por essa atribuição.

Mesmo que fossem beneficiados com alguns privilégios, estes não poderiam se estender à impunidade, vez que, tendo realizado atos gravosos e prejudiciais à Sociedade, deveriam pagar proporcionalmente à ofensa ocorrida. Se assim tivesse acontecido, o povo teria ficado satisfeito e legitimado os atos de seus representantes, confiando neles, o que não ocorreu.

A desconcentração dos poderes, atribuindo funções típicas a cada um deles, e estas ocorrendo com transparência, com equilíbrio e autonomia, desde que um Poder não invada a competência do outro, permite a possibilidade de uma fiscalização mais eficiente e precisa por parte da sociedade.

Isso é o que o povo espera que ocorra das atuais Instituições do Estado para que a confiança volte a reinar na sociedade brasileira. E como consequência, a paz social, a moralidade administrativa e o progresso do país.

(*) – Professor do Instituto Presbiteriano Mackenzie, é mestre em Direito Político e Econômico pela instituição e especialista em Direito Civil.