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Em que mãos estamos?

em Opinião
quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Heródoto Barbeiro (*)

Era para ser grátis. O seu desenvolvimento foi identificado com um custo marginal próximo de zero. Pendurar mais uma computador ou smart phone na rede custaria quase nada.

Tudo parecia perfeito com o advento da terceira onda de transformação tecnológica. Contudo ela trouxe dentro de si sua própria contradição. As oportunidades de novos negócios na web móvel destruíram a gratuidade da internet que passou a ser monetizada das formas mais diversas.

O que parecia ser uma imensa rede capilar com inúmeros emissores e receptores de informações foi apropriada por um pequeno número de plataformas. Entre elas pontificam o Facebook, Google, Twitter, Yahoo e Verizon. Essas empresas chegaram com uma voracidade nunca vista sobre as verbas publicitárias e juntaram mais de 65 por cento de tudo o que se investe na rede. No topo estão Google e o Facebook que desenvolvem produtos que conquistam cada vez mais investimentos.

Isto já acendeu a luz vermelha nos departamentos de receitas de países europeus e de organizações jornalísticas que temem um duopólio na difusão e geração de notícias em âmbito mundial. Subsidiarias dessas empresas produzem equipamentos que traduzem o texto e o áudio em tempo recorde de qualquer língua para qualquer língua. Ou pelo menos do inglês para os quatro idiomas mais falados do mundo.

O controle da rede saiu de muitas mãos para as mãos de poucos. Uma das contradições geradas é que as receitas da mídia tradicional,- tevê, rádio, jornal e revista – baseadas na publicidade, classificados e assinaturas, migraram para as novas mídias. As agência publicitárias avaliaram como mais eficazes os anúncios exibidos nas grandes plataformas e houve uma transferência sensível dos investimentos nas novas mídias. Os assinantes na web não são lucrativos como os que assinam as plataformas tradicionais.
Assim verifica-se uma queda de faturamento dessas empresas que atualmente estão em um planeio, mas podem a qualquer momento sofrer um estol e ao invés de um pouso suave no aeroporto do resultado, cair de bico na cabeceira da pista. Ficaram à mercê do poderoso Facebook. A plataforma transformou-se na responsável pela maior influência sobre o consumo de notícias no mundo. Portanto, andam na prancha, de mãos dadas, os núcleos de marketing, comercial e jornalismo. Publicitários e jornalistas estão na mira dessas mudanças.

A passagem para as mídias digitais dos produtos das mídias tradicionais tiveram a força da movimentação de placas tectônicas para publicitários e jornalistas. Estes estão ligados umbilicalmente nas empresas. Sonhavam que seria possível encontrar uma saída para que o ecossistema tradicional se mantivesse. Contudo a publicação de material multimídia de qualquer lugar, jornalismo interativo, podcasts e crowdsourcing deram uma esperança para propagação plural de notícias e os bancos de dados proporcionariam oportunidades para a construção de reportagens.

É verdade que o choque foi sentido nas redações e nos departamentos de vendas. Ambos tiveram o número de profissionais reduzidos. Os publicitários com a queda do faturamento e os jornalistas com o advento de uma tecnologia que proporciona executar várias atividades ao mesmo tempo, como produzir e editar uma reportagem e coloca-la no ar.

Na redação da CNN, em Atlanta, onde estive em estágio, me surpreendeu que além dessas funções o jornalista que me ajudou, também colocou-me o microfone, acendeu às luzes, chamou a maquiadora e avisou a técnica que eu estava pronto para fazer uma entrada ao vivo no Jornal de Record News.

Detalhe: a câmara estava travada, sem ninguém.

(*) – É âncora do Jornal da Record News e professor emérito da ESPM.