João Gabriel Chebante (*)
Há o ditado popular que o “ano começa depois de março”.
Para quem investe em startups, ou ao menos para quem está de olho no ecossistema e suas oportunidades de inovação ou captação de valor aos seus negócios – seja empreendedor, gestor ou líder de uma grande organização – 2022 já passou faz algum tempo. Uma estatística ajuda a dar ênfase a este ponto: uma startup geralmente leva de 6 a 8 anos para virar uma empresa com valor acima de US$ 1 bilhão.
Ou seja, em uma média global, uma empresa que se torna unicórnio hoje provavelmente foi fundada entre 2014 e 2016. Existem exemplos mais notórios? Sim, como a empresa de delivery Daki que obteve a alcunha em 9 meses – recorde no Brasil. Mas esta estatística ajuda a compreender o momento atual e futuro sobre o ecossistema de startups.
Ainda que a macroeconomia seja um desafio para todos os envolvidos no ecossistema de startups – taxas mais altas de juros geram fuga de capitais do investimento de risco, bem como uma onda inflacionária em boa parte do globo, o que podemos ver ao longo de 2022 é um potencial redução no ritmo de aportes em relação aos anos recordes de 2020 e 2021, onde as principais nações do Venture Capital praticamente dobraram o volume investido ano após ano.
Quem deve mais sentir as consequências deste cenário são justamente as empresas que estão começando (Early Stage), onde a demanda de capital é mais urgente e geralmente vinda do investimento-anjo ou de fundos com montantes formados também por pessoas físicas. Num cenário como o que se avizinha, há uma fuga de capital neste nicho através da busca por ativos mais seguros.
Logo, o desafio de uma equipe que está fundando ou em seus primeiros anos de startup será desenvolver negócios que aliem inovação a capacidade de crescer demandando o mínimo de funding. Estratégias para Bootstrapping (uso de recursos próprios) e growth (crescimento) serão palavras repetidas e ponderadas em qualquer apresentação ao mercado e sua posterior crítica. Ao mesmo tempo, serão startups mais resilientes e com potencial melhor aproveitamento de recursos externos.
A grande maioria dos 19 unicórnios sediados no Brasil nasceu justamente no momento mais crítico da nossa economia na década passada, e posicionaram o país em uma das 10 nações mais interessantes para investir em Startups, segundo o CB Insights. A potencial desaceleração do investimento em startups nos estágios iniciais abre margem para um nicho que, no país, começou a se movimentar de forma assertiva durante 2021: o corporate venture, ou investimento corporativo em startups.
O segmento triplicou o volume de aportes ano passado, mas ainda representa 8% do total. Para se ter ideia, este patamar chega a 24% nos EUA e acima dos 40% na China, o país onde empresas mais investem em novos projetos, atrás de sinergias que vão além do retorno financeiro: cultura, acesso a inovação e novos mercados e sinergias com as atuais atividades são alguns dos pilares que as lideranças procuram na validação de uma startup em seu portfólio.
O desafio reside na consistência e visão de futuro: visto o ciclo de maturidade de uma startup, de 4 a 6 anos em média dois a três, CEOs liderarão a empresa e sua estratégia de corporate venture, segundo estudo recente da Universidade de Stanford. O Corporate Venture precisa ter uma base próxima à cultura e proposta de valor da empresa para ser assertivo com os diferentes tipos de retorno que uma startup pode proporcionar ao longo do tempo.
O que precisamos pensar: cuidado com o caixa e os fundamentos para receber investimento; atenção às oportunidades entre oportunidades de interação entre grandes empresas e startups; e bem-vindo ao futuro: quem olha para um novo negócio não está de olho nas instabilidades de 2022.
Bem-vindo a 2028 e além!
(*) – É especialista em “Corporate Venture” do Grupo FCamara, atuando focado no mercado financeiro e atuando como consultor de inteligência de mercado para assessorias e gestoras de recursos.