Ronaldo Nuzzi (*)
Há robustos aportes, mas serão necessários importantes ajustes na rota.
De acordo com pesquisas realizadas entre os fabricantes de caminhões no mercado brasileiro, até 2025 serão realizados R$ 6,8 bilhões em investimentos nas fábricas e nos processos produtivos. Uma enorme parcela desse montante focará no aumento de capacidade das plantas. Contudo, há uma quebra de paradigma no radar: a transformação da rede de concessionários em grandes centros de serviços.
Esse será um tema que precisará entrar na agenda das montadoras de caminhões e das associações de marcas, em um futuro muito próximo. A venda do veículo novo ainda é o carro chefe das receitas das concessionárias, mas esse conceito vai mudar no médio prazo. Existe no mercado brasileiro cerca de 2,2 milhões de caminhões, sendo que 1,4 milhões pertencem a empresas (63%) e 800 mil são autônomos e de pequenas empresas, com até três caminhões (36%).
No caso das transportadoras, cada vez mais os veículos serão adquiridos diretamente dos fabricantes, devido à capacidade de compra e negociação. A comissão pela intermediação da venda de veículos pela concessionária de caminhões está cada vez menor e vai acabar. O caminhoneiro autônomo, que era o grande cliente das concessionárias, já foi 70% do mercado e hoje está abaixo de 40% (fonte RNTRC/2021), e esse percentual está caindo a cada ano.
Nitidamente o mercado está se consolidando com grandes grupos financeiros comprando empresas menores. A tendência de profissionalização do mercado ocorre muito pelo achatamento dos valores dos fretes, aumento dos custos de manutenção e principalmente devido às dificuldades de infraestrutura. Para ser competitivo no mercado de cargas é essencial que a administração dos custos da empresa seja bem eficiente, o que uma transportadora com pouco volume de carga não consegue fazer.
O transporte modal começou a crescer com a entrada de novos meios de transportes com concessão de ferrovias e canais fluviais. Ou seja, um mercado que exigirá eficiência e investimento. No momento o setor está extremamente aquecido, o que cria uma miopia de que essa situação de ruptura do modelo de negócio seja uma tendência.
Mas tudo indica que quando o mercado voltar à normalidade o tema da queda das margens entrará novamente em discussão, e a realidade estará cada vez mais clara para o mercado.
As concessionárias de caminhões devem focar em ser grandes centros de serviços para as marcas, pois o que hoje ocorre de forma dispersa, necessita ocorrer de forma centralizada. Os serviços realizados dentro das transportadoras como: controle de pneus, manutenções periódicas e mesmo serviços de oficinas, devem migrar para as concessionárias.
O estigma de que na concessionária os serviços são sempre mais caros, deve ser revisto e a busca pela competitividade tem que ser uma obsessão de seus gestores.
O conceito por trás dessa mudança poderia ser chamado de Dealer Service-centric, ou seja, colocar na concessionária a área de serviços como o centro das atenções e de investimentos. Para se criar uma mudança é necessário que os profissionais das concessionárias de caminhões acreditem que a tendência de comissionamento pela venda do veículo novo não será mais a principal fonte de receita da concessionária e que serviços terão que ser o foco da mudança.
Para que esta metamorfose ocorra, a área de recursos humanos tem que criar processos de comunicação e treinamento mais eficientes. Possivelmente as concessionárias não consigam quebrar esse paradigma sem o incentivo da própria indústria e das associações de marcas, ou mesmo sem o apoio de uma consultoria especializada; mas nitidamente a implementação dos conceitos do Dealer Service-centric deve entrar na pauta das discussões da direção das concessionárias.
Quando estivermos vivendo o que foi batizado de “novo normal”, com a normalidade no processo produtivo da indústria; as concessionárias terão que se preparar para o cenário onde as vendas dos veículos novos serão realizadas pela indústria, e a receita e os resultados virão, quase que exclusivamente, das áreas de serviços.
(*) – Matemático, com MBA pelo Institut Supérieur de Gestion/Paris e pós-mestrado pela Harvard Business School, é CEO da Thompson Management Horizons ([email protected]).