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Os impactos da Lei do Superendividamento no mercado imobiliário

em Mercado
terça-feira, 30 de agosto de 2022

Clarissa Aline Paié Rodella Contato (*)

A lei conhecida como “Lei do Superendividamento” foi regulamentada no mês de julho, alterando o Código de Defesa do Consumidor. A lei e seu respectivo decreto regulamentador não guardam uma relação direta com as atividades desenvolvidas pelas construtoras, incorporadoras e loteadoras, nem com a venda de imóveis.

Ao verificar os dispositivos normativos mais a fundo e considerando que a prevenção a situações de superendividamento foi inserida como direito básico do consumidor, a orientação às empresas atuantes no segmento imobiliário é que consultem a área jurídica para definirem as adequações dos procedimentos internos relacionados aos processos de vendas, ajustando questões ligadas à análise de crédito, marketing e contratos.

No marketing, é expressamente vedada a pressão ou o assédio para a celebração do negócio, motivo pelo qual é de extrema importância verificar como está estruturado esse processo dentro das empresas. A personalização do marketing em detrimento à massificação já vinha como tendência e também já era recomendável estrategicamente pela LGPD.

A consulta prévia aos serviços de proteção de crédito para a verificação de viabilizar ou não uma venda se faz prudente para checar se o futuro adquirente não está enquadrado em situações de endividamento que comprometam seu mínimo existencial. A declaração de análise de crédito fará parte do contrato do cliente, observando-se, é claro, as regras da LGPD para seu armazenamento. Uma frase chave aqui e que não deve ser perdida de vista é: o crédito oferecido deve ser responsável. Já os contratos de compra e venda devem ser revisados para que todas as informações financeiras estejam descritas de forma expressa.

O documento deve contar com o detalhamento do custo efetivo total da aquisição, modalidades de crédito, custos que incidirão sobre a operação, taxa efetiva mensal de juros, taxa dos juros de mora, total de encargos (de qualquer natureza, inclusive previstos para o atraso no pagamento), montante das prestações, prazo de validade da oferta (que deve ser, no mínimo, de dois dias), nome e endereço (incluindo o eletrônico), cláusulas referentes ao direito do consumidor à liquidação antecipada e não onerosa do débito.

Ainda quanto aos contratos de venda e compra, tendo em vista que as informações financeiras devem estar dispostas, nos termos da lei, de “forma clara e resumida” no próprio contrato, da fatura ou de instrumento apartado, de fácil acesso ao consumidor, é importante também revisitar o Quadro Resumo.

O descumprimento de tais medidas pode vir a acarretar aumento de prazo de pagamento de forma a prejudicar o fluxo de caixa dessas empresas, bem como poderá o consumidor ver reconhecido seu direito judicialmente quanto à redução de quaisquer acréscimos ao valor principal, tais como juros e encargos.

É bem verdade que a Lei do Superendividamento excluiu a possibilidade de ajuizar ações com objetivo de repactuar as dívidas decorrentes de contratos de financiamento imobiliário ou com garantia real. No entanto, isso não pode ser confundido com a necessidade de serem cumpridas as adequações acima listadas, as quais podem ser sim alvo de questionamentos.

(*) – Advogada formada pela PUC-Campinas; com MBA em Gestão de Negócios pela ESALQ/USP, é sócia na Advoclass Treinamentos e Capacitação Profissional e da Advocacia Rodella (www.advoclass.com.br).