Danilo Talanskas (*)
Paul Krugman, economista, Nobel de Economia, autor de livros e colunista do New York Times, em recente artigo publicado neste periódico a respeito da guerra na Ucrânia afirmou: “…Em menos de cinco semanas, Putin destruiu a reputação do Exército russo, abalou a economia de seu país e fortaleceu as alianças democráticas que esperava minar.
Como ele pode ter cometido um erro tão catastrófico? Parte da resposta reside sem dúvida na síndrome do homem-forte: Putin cercou-se de pessoas que lhe dizem apenas o que ele quer escutar”. Esta realidade está presente em muito mais organizações do que podemos imaginar, cujos gestores acreditam que o título do cartão de visita traz, de repente, todo o conhecimento necessário para todas as decisões.
Com esta atitude, está mais preocupado em manter a sua autoridade moral, não cometer erros, não correr riscos e o resultado acaba sendo o de “podar” a criatividade de seu time e o livre fluxo de ideias. O papel de um líder é o de ser o catalizador das ideias e pontos de vista de sua equipe, por mais diferentes e contraditórios que sejam, fazendo com que qualquer decisão seja muito bem pensada e analisada.
Há uma falácia quando alguém afirma que todo o time que PENSA da mesma forma leva a um consenso de decisões. O meu conceito de consenso sempre foi de que um time atinge este nível, quando AJE da mesma forma, pois cada indivíduo é diferente e pensa diferente. Estas diferenças tornam qualquer discussão muito mais rica e muitos ângulos são analisados e diferentes soluções são propostas.
O grande e primeiro desafio é sentar em uma mesa com o seu time, despir-se de seu título, deixar o seu ego bem fechado dentro de um cofre, estar preparado para ouvir e processar pensamentos que sejam muito diferentes do que os seus. Em seguida, na discussão de um assunto conseguir nivelar-se ao grupo, na troca de propostas de soluções.
Se o ego não estiver muito bem “trancado” sua primeira reação de que “…não acho que seja assim…”, ou “…isto não funciona! ”, vai na realidade “trancar” a livre expressão de sua equipe.
Neste momento você pode dar adeus à sua capacidade de conhecer a realidade como ela é e tomar decisões sob a influência da “síndrome de Putin”. Por outro lado, a liderança corporativa não é uma democracia, caso contrário em lugar de se buscar CEO’s ou gerentes, as companhias estariam procurando comitês de gestão, que tomariam decisões em colegiado e por voto da maioria.
Vem aí o segundo desafio: o de tomar a sua decisão, depois de ouvir todos os argumentos, inclusive os contraditórios (em seu ponto de vista!), e ainda assim conseguir manter o seu time unido, na direção definida. Assim como todo ser humano, líderes podem errar e você não deve exigir perfeição de si mesmo.
Porém, o principal foi feito: ouvir todas as propostas, processá-las e tomar uma decisão. O terceiro desafio é saber (mas, realmente saber!) de que maneira o seu time vai agir depois que sair desta reunião e isto pode acontecer de várias formas: se saírem sob a influência da “síndrome de Putin”, vão fazer com que o medo os transformem em autômatos não pensantes, na direção que o chefe pediu, sem envolvimento e comprometimento.
O time pode também sair em consenso de direção, porém dividido em atitude, onde cada um continua expressando a sua própria opinião no famoso “…eu faria de forma diferente…”. Este tipo de atitude é o que estremece e mina qualquer objetivo de mudanças ou busca de resultados. A forma ideal de ação após a reunião, é cada membro do time sair realmente comprometido com as decisões tomadas, mesmo que contrárias aos pensamentos de alguns e todos transmitirem a mesma mensagem e atitude em suas respectivas organizações.
O outro papel essencial de um (a) líder é o de ter o comprometimento e adesão daqueles que pensam diferente de você e desenvolver um espírito de confiança. Isto só é possível com um trabalho individual com cada membro de sua equipe (afinal…são todos diferentes um dos outros) e requer esforço, tempo, paciência e muita argumentação para demonstrar a importância de um time coeso.
Todo este esforço é necessário para não se cair na armadilha de pensar que, ao finalizar uma reunião com uma decisão tomada, que absolutamente todos os membros do time estarão alinhados e comprometidos, pelo simples fato de que “…o chefe decidiu para onde vamos”. Esta é outra consequência da “síndrome de Putin”. Minha carreira esteve pontilhada de alertas e negativas de subordinados, que muito contribuíram para melhores decisões de minha parte.
Lembro-me de uma reunião com advogados internos e externos para analisar um contrato de um grande cliente e no fervor da discussão de termos e virgulas, nossa estagiaria do jurídico simplesmente me olhou bem nos olhos e disse “se eu fosse o senhor, não assinaria esse contrato! ”. Acabou sendo mesmo a melhor solução naquele momento.
Em outra ocasião, na fase final de escolha de um novo diretor, que era inclusive o meu candidato preferido e também do meu time que o entrevistou, o diretor de RH me disse: “Você não pode contratar este indivíduo! ”. Tive que deixar de lado meus argumentos e até a emoção, para ouvir a razão e a clareza dos motivos que me foram mostrados.
Muita gente foge da responsabilidade de dar más notícias. Desta vez foi uma gerente que afirmou categoricamente que haviam fraudes contábeis, cuja atitude levou-me a abrir uma auditoria que veio a trazer problemas que vinham de duas gestões antes da minha. Sou muito grato por profissionais das situações acima e por suas iniciativas, que, com a devida abertura, trouxeram grandes influências nas minhas decisões.
Por mais de uma vez, ao definir como presidente, junto com o primeiro time, os caminhos e prioridades do negócio, participei de uma dinâmica de grupo, na qual minhas opiniões não eram claramente ligadas à minha pessoa. Desta forma, a identificação de desafios e soluções foi feita sem a influência do gestor e por um time de iguais, trazendo grandes benefícios e transparência nos objetivos. Tivemos grandes conquistas como resultado deste exercício.
Quanto mais ditatorial e impositivo for o seu estilo de gestão, mais você estará sob a influência da “síndrome de Putin” e mais afastado estará da realidade. Outro grande perigo neste ambiente são os bajuladores, que deixam de lado suas próprias opiniões e se tronam escravos e executores das ideias do chefe, para “ganhar o seu lugar ao sol”.
Faço votos de que, ao olharmos os possíveis fracassos do passado (ou mesmo do presente!) não seja dito de nós que “cercou-se apenas de pessoas que lhe dizem apenas o que ele quer escutar”.
(*) – Foi CEO de multinacionais no Brasil a autor do livro “Lições de Guerra — Vencendo as Batalhas de Sua Carreira”.