Bruno Soares (*)
Já não é novidade para ninguém que o consumidor atual, especialmente o millennial, busca comodidade e facilidade acima de tudo. A segurança, embora considerada, é um pressuposto, e não um diferencial.
E quando olhamos o mercado atualmente, em que pese as novas opções e experimentações, o perfil médio dos serviços não fez a jornada digital completa. Eles são muito dependentes ainda de processos tradicionais como ligações telefônicas, tokens e até visitas a caixas eletrônicos e agências, deixando a experiência ainda não tão amigável como poderia ser. Além disso, de forma geral, os serviços são muito padronizados, dando pouca margem a personalizações.
Entretanto, o setor financeiro, um dos mais tradicionais e conservadores segmentos da economia, também está vivendo seu rito de passagem para a economia 4.0. A velocidade de transformação só cresce, alavancada pela gangorra macroeconômica, por um consumidor mais exigente e a chegada de novas tecnologias e entrantes (sejam startups, varejistas ou gigantes do e-commerce e telefonia).
Possivelmente, este é o momento de maior ebulição do setor financeiro – tirando, evidentemente, as crises – desde a introdução da computação nos anos 1970. Esse comportamento do usuário é comprovado pela pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2019 (ano-base 2018) e apresentada durante o CIAB, maior congresso de tecnologia da informação e digital para o setor financeiro.
Consumidores brasileiros super conectados, e sedentos por facilidades que atendam suas necessidades onde quer que estejam, estão realizando mais operações bancárias pelo seu smartphone. O mobile banking é um desses exemplos e se tornou o meio preferido no país para pagamentos de contas e transferências. A quantidade de transações com movimentações financeiras por celular aumentou em 80% no ano passado em relação à 2017.
Os aplicativos de banco pelo celular responderam por 40% de todas as 78,9 bilhões de transações financeiras feitas no país no ano passado. Já o internet banking, acessado pelos computadores, encerrou 2018 com uma participação de 20% das operações do setor bancário. Juntos, esses dois canais digitais representaram 60% das movimentações dos bancos no país. Ou seja, de cada 10 transações, 6 foram feitas por meios digitais no ano passado.
Há cinco anos, os aplicativos bancários no celular representavam apenas 10% das transações financeiras no país. Em 2018, esse serviço ganhou maturidade e mais confiança dos consumidores conectados, e o mobile banking aportou 31,3 bilhões de transações financeiras, um aumento de 24% em relação ao ano anterior.
Um dos fatores mais visíveis no Brasil para esse quadro talvez seja a “guerra” das maquininhas de cartão e a disseminação de marketplaces de investimentos, mas, abaixo da superfície, temos o universo das 155 milhões de contas correntes, 84,8% dele concentrado nas cinco maiores instituições.
Quando tomamos esta perspectiva, o campo ainda é muito vasto.
Segundo os dados apontados na pesquisa “A nova relação digital: uma história sobre finanças e o setor bancário”, desenvolvida pela iProspect, agência de marketing digital full performance, a América Latina reúne duas condições fundamentais para o desenvolvimento do setor financeiro nos próximos anos: 45% da população adulta não atrelada a uma instituição financeira e uma das maiores penetrações digitais do mundo (mais de 70% com acesso a smartphones).
Outros dados revelam ainda que apenas 21% dos clientes bancários estão dispostos a manter o seu nível de negócios atual com o banco que operam e que 87% dos consumidores estão dispostos a conhecer um player não-tradicional. Além disso, o potencial de geração de receita a partir da população sem acesso ou com pouco acesso bancário pode chegar a US? 34 bilhões, impulsionando não apenas o setor financeiro, mas o comércio eletrônico e a inclusão de novas tecnologias e modelos de negócio na região.
A nova onda vem com uma abordagem diferente. Os serviços são mais simples, as barreiras e burocracias são menores e a experiência é inspirada em indústrias consideradas mais amigáveis, como a Apple e a Amazon. É importante ressaltar que essa característica digital não libera as startups e bancos digitais de proteções regulatórias importantes como a necessidade de banco custodiante, a supervisão do Banco Central e a vinculação com o Fundo Garantidor de Crédito (FGC).
A pergunta que fica então é: por que esse consumidor deve lealdade às grandes instituições? Muitos vão responder que se sentem mais confortáveis com a oferta tradicional e que a gama e variedade de produtos não é a mesma. Mas até quando? Os mais jovens demonstram maior interesse em migrar. Os mais velhos, por sua vez, estão experimentando as novas oportunidades. Ter uma bandeira conhecida, mas com uma experiência pouco amigável, já não é mais suficiente.
Logo, estamos vivendo uma grande janela de oportunidade, cujo foco é na melhoria da experiência, convenientemente ligada à mobilidade e facilidade nas compras e outras transações. As tecnologias para isso (biometria, criptografia, big data, inteligência artificial, machine learning) já estão aí e nem podemos considerar como iniciais ou imaturas.
A quase totalidade delas já está em pleno uso em outras indústrias e com casos de veracidade comprovada. Grande parte já está embarcada, inclusive, em nossos celulares. A ponta de lança das mudanças são as contas digitais e meios de pagamento. Neste processo, os aplicativos têm um papel fundamental, realizando cada vez mais funções de forma rápida e fácil.
A adesão tende a ser cada vez mais rápida. Segundo a Febraban, em 2018, foram abertas 2,8 milhões de contas via celular entre as 10 maiores instituições. O Nubank, por exemplo, fechou o ano passado com mais de 2,5 milhões de contas digitais. Quando olhamos o mercado, novidades surgem toda a semana, com diferentes graus de maturidade e impacto. Os players menores têm mais agilidade e ousadia.
Os maiores, embora tenham maior poder financeiro e acesso a clientes, lutam contra a inércia natural de seu gigantismo. Temos que levar em consideração nesta equação ainda os movimentos de empresas de telecom e marketplaces, como a Apple, a Samsung e a Amazon. Dado seu porte global, esses players podem desenvolver soluções com um apelo, força e, principalmente, escala sem paralelo.
Fica claro, então, que nos aproximamos de um momento de ruptura do modelo atual. Isso traz muitos desafios no processo de mudança, mas também a oportunidade para posicionar o setor financeiro de forma muita mais próxima e com ainda mais valor para o consumidor.
É uma oportunidade também de obter maior eficiência, possibilitar condições mais competitivas e ampliar o acesso da população, a exemplo do que fizeram alguns países asiáticos como a China que, com base em muita tecnologia, integrou mais pessoas ao setor financeiro formal, impactando positivamente a economia.
(*) – É diretor executivo da Cosin Consulting.