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OAB discute Mercado de Carbono e Biodiversidade

em Manchete Principal
segunda-feira, 28 de agosto de 2023

Da Redação

Créditos de carbono: quem vende e quem ganha com este ativo ambiental? A receita é dos Estados ou da União? E no caso de terras indígenas, e das comunidades extrativistas, de quem é a titularidade? E para os ativos da biodiversidade, que parâmetros utilizar para sua especificação? Haverá uma espécie de agência nacional regulando tudo, ou o mercado resolve isto? Se você anda perdido (a) em meio a este imbróglio, bem-vindo (a). Os advogados também discutem várias questões dentro da temática e, por ora, parecem existir mais dúvidas que certezas.

Para jogar luz sobre o mercado de carbono e biodiversidade, a Ordem dos Advogados do Brasil, em São Paulo (OAB-SP), promoveu o “1º Congresso da Advocacia sobre Mercado de Carbono e Biodiversidade”, em sua sede. Evento foi realizado, no formato de três painéis, pela Comissão Permanente de Meio Ambiente da OAB-SP e coordenado por sua presidente, Rosa Ramos. Especialistas de várias entidades e empresas se apresentaram para uma plateia que ocupou todo o Auditório, dia 24 último.

“O mundo não está preparado para isto ainda”, afirmou Ludovino Lopes, conceituado advogado que historiou sobre as Sesmarias, nos Séculos XII, XIII, XIV…, destacando que o direito à propriedade (baseado no Código napoleônico) tem apenas 200 anos e, portanto, a definição, e aplicação, dos ativos ambientais vai requerer ainda mais tempo. “Precisamos construir uma matriz econômico-ambiental”, ilustrou. Depois de citar a CNAE (Classificação Nacional das Atividades Econômicas), o expositor pontuou: “De qual bem jurídico estamos tratando? Biodiversidade, clima, carbono ou o que mais? Se não discutirmos detalhadamente, o mercado vai travar”.

PARADOXO

O Brasil é o país que tem a maior biodiversidade do mundo e, paralelamente, enfrenta uma visível pobreza de sua população. Em meio a tantos paradoxos, este é mais um na “coleção”. A constatação não passou despercebida na fala de Bráulio Ferreira de Souza Dias, biólogo e doutor em zoologia (Universidade de Edimburgo), que pilota a área de biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente. Ele falou remotamente, pelo telão, citando especialmente a COP15 (Conferência de Biodiversidade, patrocinada pela ONU, em dezembro de 22, na cidade de Montreal, Canadá). Relativamente ao Brasil, disse que há um esforço para sustar a perda de biodiversidade, reduzindo-a em pelo menos 90%. Até 2030 o MMA espera também reduzir em 50% as espécies invasoras.

Durante a COP16, em novembro de 24 – que seria realizada na Turquia, mas recentemente o país declinou devido aos terremotos locais –, o Brasil precisará de uma posição fechada sobre a questão da biodiversidade. Para tanto, o ministério coordena ações setoriais, envolvendo comunidades indígenas e todas as secretarias estaduais de Meio Ambiente. Segundo informou, a Amazônia recebe, atualmente, menos de 3% dos recursos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e esta realidade precisa ser mudada. Ele defende a remuneração sobre o investimento, em biodiversidade e todos os ativos ambientais, para atrair a iniciativa privada.

O Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) enviou uma representante ao Congresso, a exemplo da Rede Brasil do Pacto Global com o biólogo Glauco Kimura que lembrou a mudança de paradigma de quando iniciou a carreira: “Antes soava estranho colocar preço na natureza, mas agora vejo essa questão de uma outra forma”. Kimura alertou para a COP30 (em Belém, PA), marcada para 2025. “Temos dois anos e meio para nos preparar para esta janela de oportunidade. É uma grande chance do Brasil fazer a diferença” – notou, acrescentando que o país tem capacidade de ofertar 28% de todo o crédito de carbono no mundo (a um preço de US$ 120 bilhões) e cerca de 48% do mercado voluntário.

EXTRATIVISTAS

Marco Antonio Fujihara (CDP), Patrícia Gomes (Imaflora) e o advogado Rodrigo Sales debateram necessidades dos povos originários (com a participação, no telão, de Francisca Arara, secretária dos Povos Originários do Acre), o PL que entrará segunda-feira próxima no Senado e a contabilização dos ativos, bem como a chance de ocorrer duplicidade. “Você não pode contabilizar um ativo que não é seu”, alertou Sales, comentando ainda a situação das comunidades extrativistas. “Terão elas o direito à titularidade dos créditos de carbono?”, questionou. Já Patrícia Gomes focou na “floresta em pé” e nos meios para se conseguir isto. “O Brasil tem competitividade única”, sublinhou ela.

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), 5% das populações indígenas preservam 80% da biodiversidade no mundo. Um dado relevante para balizar a discussão sobre os créditos de carbono, certamente. Mas isto não é tudo, na visão de Francisca Arara. “Nossa vida vai além do crédito de carbono”, citou.

Marcos Rosa, coordenador técnico da MapBiomas, encheu os olhos da plateia com slides mostrando como é feito o mapeamento do país nas queimadas, por exemplo (que respondem por 50% dos Gases de Efeito Estufa emitidos pelo Brasil), “com localização, nome, RG e telefone”. A plataforma de dados – que abrange estatísticas desde 1985, por iniciativa do Observatório do Clima e uma rede colaborativa de Universidades, ONGs e empresas de tecnologia na produção de dados científicos – é utilizada pelas Secretarias de Meio Ambiente e Ministério Público para orientar ações e políticas públicas, em razão da metodologia científica (exportada para vários países) e facilidade de acesso. A quem interessar, o jornal Empresas&Negócios informa que o link é https://mapbiomas.org/ e a plataforma é aberta para consultas.

TECNOLOGIA

O aparato tecnológico a serviço da causa é mais extenso. O Instituo Life (https://institutolife.org/pt-br/) faz a certificação de biodiversidade, já com modelo desenhado. Segundo sua diretora executiva, Regiane Borsato, a demanda global é crescente e Inglaterra e País de Gales estão à frente, visando a atratividade dos investidores. Mas possivelmente nada que se compare à reserva Caiman, no Pantanal. Ali existe um projeto implantado que harmoniza a natureza com a pecuária. Trabalhando com serviços ecossistêmicos, o instituto criou o Lifekey – software que realiza os cálculos para créditos da biodiversidade.

Para quem ainda não conhece o Projeto de Carbono Florestal da Resex do Rio Cautário, em Rondônia, vale a pena consultar (https://permianbrasil.com/resex-estadual-do-rio-cautario/) para se ter parâmetros consolidados de um modelo que mostra ser viável, desde 2020. Miguel Milano, mestre e doutor em Ciências Florestais, com passagens pela academia e iniciativa privada, fez também uma rica exposição, tratando de serviços ambientais (inclusive trazendo um caso norteamericano de abelhas que são contratadas para polinizar determinadas áreas, por meio de uma empresa que as explora).

A Permian Brasil criou o modelo de 70 / 30 para as receitas auferidas em Rio Cautário. “São 70% da comunidade e 30% para nós”, explicou, ao destacar a melhora de produtividade do extrativismo da castanha e da borracha e o crescente interesse de populações locais em se juntar ao projeto.
Como se vê, o assunto ainda vai longe e os cases, teorizações e discussões estão só começando.