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De cada 100 empresas familiares, apenas 30 chegam à segunda geração

em Manchete Principal
sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Ricardo Penteado Camargo (*)

Abrir um empresa já é um desafio, mas abrir uma empresa familiar é desafio dobrado. Além do negócio propriamente dito, existem inúmeros outros conflitos, que devem e precisam ser administrados no dia a dia. Os problemas surgem nessas empresas, basicamente, pelo simples fato dos proprietários desconhecerem os conflitos latentes nesse tipo de organização e postergarem o estudo e elaboração de um ‘código de relações.

Diferentemente das outras empresas, as familiares têm como principais desafios, estruturar um planejamento visando sua continuidade, manter a unidade de comando despersonalizada, a sua capitalização e, a profissionalização e visão de médio e longo prazo, pois costumam enxergar somente o curto prazo. Nessas empresas também, quase nunca estuda-se um planejamento patrimonial, ou existe um plano para a falta súbita dos principalis sócios. E, por falta de se estruturarem, sofrem com a explosão demográfica das famílias e quase nunca conseguem absorver todos membros dentro da organização.

Outro fator de suma importância é a preparação dos sucessores. Foto: boardplace.com/reprodução

. Nem sempre o caminho mais fácil é a melhor opção – A sucessão não deve ser vista como algo automático. Meu avó era dono, meu pai assumiu e agora é a minha vez. Isso é um grande erro, que gera frustração ao sucessor e pode, em muitos casos, levar a organização a falência. Os herdeiros não devem enxergar na empresa sua única saída de sucesso ou felicidade. Por estarem próximos, costumam ir pelo caminho aparentemente mais fácil e deixam de tentar descobrir sua verdadeira vocação, que pode não estar naquela organização.

. Não é preciso fechar as portas da empresa e nunca mais participar de um almoço em família – Nem sempre a saída mais radical é a melhor opção. Fica atendo aos primeiros sinais de conflitos na organização e busque ajuda. Existem ferramentas e profissionais no mercado altamente capacidade para auxiliar você, sua empresa e suas familiares nesse momento. O principal instrumento para organizar uma empresa familiar que passará de geração a geração é o ‘Acordo Societário’. Neste instrumento deve conter todas as regras possíveis e de forma clara, visando assim uma regras de convivência entre as pessoas (herdeiros) e a sociedade.

Foto: miriangasparin.com/reprodução

. Outro fator de importância é a preparação dos sucessores – O sucessor tem que sempre pensar que se ele decidir concorrer a uma vaga em uma empresa qualquer, tem de estar preparado para isso. Então, porque não fazer o mesmo pela sua própria empresa? Outro instrumento importante quando envolve muitos grupos familiares é a criação de ‘Holdings’, separando da gestão as questões pertinentes aos interesses das famílias e suas relações com a organização, evitando ingerências e desmandos, melhorando as relações dos herdeiros com os profissionais de mercado.

. Uma empresa familiar não é feita só de problemas – É preciso sim pontuar os erros e desafios ao longo da jornada, mas também é preciso mencionar que há vantagens contidas nas empresas familiares, tendo como a principal a lealdade dos empregados, pois conseguem enxergar e identificar-se com o comando da organização, trazendo um sensação de proximidade. Nessas empresas, as decisões são mais ágeis, trazendo uma real vantagem competitiva. Nelas também é visível sua maior sensibilidade social e política, pois se relaciona mais intensamente com a sociedade, carregando um forte traço de união entre o passado e o futuro.

Para encerrar, é importante lembrar que quase noventa por cento dos empregos no Brasil estão nas empresas familiares e elas são mais de noventa por cento as empresas, com uma significativa participação no Produto Interno Bruto, enfim, neste país onde temos na população uma forte vertente para empreender, as organizações familiares continuarão a surgir e muitas delas prosperarão.

Os herdeiros não devem enxergar na empresa sua única saída de sucesso ou felicidade. Foto 2: savarejo.com/reprodução

. Ciclo das empresas familiares – Início ou fundação: Nesta fase, essas empresas sofrem uma forte tendência à autocracia, com forte concentração das decisões. Os fundadores impõem-se durante tantos anos, que costumam ter um obstáculo à profissionalização. Eles acreditam que dedicarem-se muito ao negócio e apegam-se demasiadamente à organização, exercendo um papel que por muitas vezes confundem a pessoa física com a jurídica. Esse perfil tende a ter muita dificuldade em treinar e avaliar os filhos.

. Crescimento/Apogeu – Nesta fase já aparecem as primeiras crises entre os sucessores, bem como a incompatibilidade entre os filhos e parentes, pois quase sempre pensam diferente não só entre eles, mas também dos fundadores. Surge aqui a necessidade da profissionalização, tendo em vista o tamanho e multiplicidade dos negócios, é neste momento que a organização atinge ao máximo.

. Declínio – Caso essa empresa não tome as devidas providências no seu apogeu, pode ocorrer uma pulverização do poder acionário e do patrimônio, com possíveis divergências entre os sucessores com conseqüente falta de liderança. Neste ponto, a empresa distancia-se dos valores do fundador e perde sua identidade, enquanto os conflitos familiares crescem, uma vez que a família só enxerga a empresa como “provedora” e não um negócio, o que agrava a tomada de decisões e divisões de cargos e tarefas.

(*) – É consultor, especialista em empresas familiares, da Camargo Gestão. Marketing estratégico pela FGV e estratégia de negócios pela SUNY – State Universityof New York.