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Competitividade no mercado de executivos e o impacto nas organizações

em Manchete Principal
segunda-feira, 04 de julho de 2022

Caroline Lico (*)

Múltiplas variáveis explicam o aquecimento no mercado brasileiro de talentos executivos. Algumas delas parecem ser mais conjunturais, enquanto outras chegaram para ficar. No geral, parte das movimentações pode ser explicada pela pandemia e novas demandas emergentes desse contexto.

O ano de 2021 foi de recuperação, com crescimento significativo nas contratações, não apenas quando comparado a 2020, mas também com anos anteriores. Em meio a cenários extremos e cheios de incertezas, o período foi de “make or break” para muitos executivos, evidenciando a necessidade de perfis mais adaptáveis, relacionais e abertos a mudanças — especialmente a nível individual.

Ademais, com mais liquidez no mercado em 2021 — seja pela janela de IPOs, seja pelo investimento de firmas de Private Equity e Venture Capital –, aumentou a demanda por talentos no alto escalão. Ainda que tal situação de liquidez pareça estar mudando, a demanda por talentos no primeiro nível continua.

Para esse nicho (PEs/VCs), observamos a busca por perfis com “cabeça de dono” e foco em resultados, orientados em tornarem-se sócios da empresa, o que impacta no modelo de remuneração variável (como exploraremos mais adiante). Como consequência, essa dinâmica culminou em altos índices de turnover que cresceram ao longo do ano de 2021 e em 2022.

Dentre as posições mais buscadas, destaca-se a função de CFO, especialmente aqueles executivos com passagem por organizações de capital aberto. Nos últimos três anos, por exemplo, tivemos ao menos dez posições de CFO abertas ao mesmo tempo, evidenciando essa alta no mercado. Na sequência, destacamos as funções de Tecnologia e Digital.

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Com a aceleração do processo de digitalização, muitas organizações precisaram reforçar seus times da noite para o dia, não só na base da pirâmide, mas também recrutando executivos experientes para liderar essa transformação. Ainda sobre Tecnologia e Digital, a sensação é de uma escassez geral em todos os níveis, acentuada pela competição a nível global e sem solução “bala de prata”, o que tem afetado a todos, especialmente as empresas tradicionais, mas também as nativas digitais.

Para “solucionar” a questão, alguns esforços interessantes vão no sentido de aumentar esse pool de talentos, investindo em formação de novos profissionais. Porém, ainda observamos pouco uma narrativa de longo prazo para desenvolver esse grupo de maneira consistente.

Por sinal, é necessário entender que determinados aspectos do mercado precisam ser encarados não como temporários, mas como prerrogativas para uma continuidade saudável dos negócios. Como a demanda por profissionais que tragam maior diversidade, tema que foi e seguirá sendo latente.

Enquanto a temática de equidade de gênero tem sido uma discussão presente na última década, a questão racial ganhou mais destaque nos últimos anos. Nesse sentido, acreditamos que olhares para outros tipos de diversidade, como idade, talvez sejam a próxima bola da vez.

Outro fator que tende a permanecer é a busca global por talentos. Nos últimos anos, os executivos brasileiros têm sido mais abordados para posições em outros países, sobretudo para a região LATAM, tanto por parte de empresas locais como de multinacionais — movimento que não era tão evidente em anos anteriores.

  • Poder de escolha – Considerando os efeitos de mercado já mencionados, hoje o poder de escolha parece estar mais centrado no executivo que na organização. Sob essa perspectiva, especialmente após a pandemia, muitos executivos, no Brasil e no mundo, passaram a se questionar sobre o sentido de seu trabalho e ficaram mais abertos para explorar projetos diferentes.

Nos Estados Unidos, por exemplo, verificou-se o movimento de demissão em massa, chamado de “Great Resignation”, com milhares de pessoas deixando seus trabalhos, especialmente entre a faixa de 30 – 45 anos, segundo estudo publicado pela Harvard Business Review. Dado esse cenário, a busca de cada empresa por um modelo de trabalho ideal será fundamental para a atração, engajamento e retenção de talentos.

Como apresentado em pesquisa feita por We Work e HSM com apoio da Egon Zehnder, apesar de certa variabilidade de opiniões a depender do nível organizacional, todos concordam que os novos modelos de trabalho trazem oportunidades e insights para a criação de novos códigos de cultura organizacional.

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Olhando especificamente para os CEOs, a pandemia deixou ainda mais clara a necessidade de ajudá-los a navegar em um mundo volátil, incerto, complexo e ambíguo.

Em recente pesquisa global da Egon Zehnder com cerca de mil profissionais, 80% dos respondentes, versus 25% há dois anos, afirmaram que precisam ser capazes de se transformar para realizar as mudanças necessárias para suas empresas e o meio como um todo. Com esse cenário, o papel tanto do Conselho quanto de Recursos Humanos com um olhar de desenvolvimento será fundamental para o fortalecimento da jornada individual do CEO e consequentemente da organização.

  • Impacto nas organizações – Nesse contexto, as companhias foram e estão sendo pressionadas tanto em custos para atração quanto pela maior dificuldade de retenção de talentos. Com relação à remuneração, observamos valores elevados e uma tendência de superconcentração nos incentivos de longo prazo, especialmente nas empresas da nova economia, com executivos C-level tendo valores milionários retidos por vários anos.

Ainda que esta parcela tenha um risco de realização efetiva, nos últimos anos, tais empresas praticamente eliminaram o gap na parcela de salário fixo, aumentando sua atratividade para executivos sêniores no mercado. Além disso, com a queda das ações na bolsa, os pacotes de muitos executivos de empresas incumbentes perderam valor, colocando ainda mais pressão nas companhias tradicionais quanto à retenção de seus talentos.

Em suma, muitos dos elementos que contribuem para uma maior competitividade na busca por talentos executivos se mostram mais perenes que passageiros, evidenciando a necessidade de as organizações atuarem de maneira estratégica em seus processos de atração, desenvolvimento e retenção desses profissionais.

(*) – É Consultora na Egon Zehnder (www.egonzehnder.com).