Ricardo Lecheta (*)
Segundo dados do IBGE e da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), o Brasil possui 17,3 milhões de pessoas com alguma deficiência. Visto esse cenário, é fundamental falarmos e pensarmos cada vez mais sobre acessibilidade e fortalecer o objetivo de quebrar as barreiras e fornecer condições para que todas as pessoas tenham as mesmas oportunidades, seja na vida social ou digital.
A Lei Brasileira de Inclusão (LBI 13.146/2015) traz o artigo 63 que determina que empresas com representação no país tenham seus sites acessíveis. Acessibilidade digital é a prática de utilizar recursos e técnicas, como em sites web ou aplicativos para celulares, para melhorar a experiência do usuário, independentemente das deficiências ou limitações que eles possuam. Mas infelizmente, mesmo com a LBI, uma pesquisa publicada pelo grupo “Movimento Web Para Todos” (2021) mostra que 1% dos sites brasileiros foram aprovados em todos os testes de acessibilidade.
Recentemente, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) lançou a Norma Brasileira ABNT NBR 17060 que estabelece os requisitos para facilitar e otimizar o acesso de pessoas com deficiência aos ambientes virtuais, visando eliminar ou mitigar as barreiras para utilização de páginas web e de aplicativos em dispositivos móveis. Falar de deficiência é falar de versatilidade e existem várias maneiras onde a tecnologia pode ajudar, mas é importante que as empresas comecem a se conscientizar mais sobre o assunto para que seus produtos digitais realmente possam fazer a diferença na vida das pessoas.
Boas práticas
Ao iniciar o desenvolvimento de produtos digitais acessíveis, é comum nos questionarmos quais são as principais práticas e soluções que podem ser utilizadas. Para citar alguns exemplos, ao construir um site web ou aplicativo, podemos ajudar deficientes visuais adicionando textos alternativos para serem interpretados por leitores de tela, que vão converter os elementos do produto digital para voz.
Utilizar contraste entre a cor de fundo e as cores do texto da página também facilita a compreensão de textos e imagens. Essa prática ajuda a visualização da interface em ambientes com muita iluminação, como em uma exposição direta à luz solar ou em uma tela com pouco brilho. A acessibilidade, nesse exemplo, não se aplica somente para deficientes visuais, mas para pessoas de todas a idades com baixa visão. Existem usuários que aumentam o tamanho da fonte para conseguir ler o conteúdo, então, é esperado que o site ou aplicativo seja responsivo e funcione corretamente com as configurações sugeridas.
Do mesmo modo, podemos auxiliar deficientes auditivos adicionando um tradutor de texto e imagens para Libras (Língua Brasileira de Sinais). Já os vídeos devem ser legendados na língua nativa do usuário.
Nem todas as práticas são simples, por exemplo, um exercício interessante é imaginar como um usuário com deficiência visual faz para navegar em um site ou aplicativo. Para isso, é necessário fornecer um mecanismo de navegação por teclado em caso de computadores ou por gestos em caso de aplicativos para celulares. Isto permite ao indivíduo procurar os elementos na tela e trocar o foco de cada um para conseguir navegar pela interface. Uma implementação eficiente dessa navegação é um critério importante para o sucesso do sistema a fim de garantir uma boa experiência.
Para implementar acessibilidade em produtos digitais recomenda-se seguir o guia da WCAG (Web Content Accessibility Guidelines) – Diretrizes de Acessibilidade de Conteúdo da Web, que fornece um conjunto de diretrizes para criar conteúdos digitais acessíveis. Por fim, a acessibilidade precisa ser planejada desde a concepção e desenvolvimento do produto, de forma que isso seja uma premissa do desenvolvimento. Essa recomendação é inclusive reforçada pelos guias de boas práticas de interface da Apple e do Google, no desenvolvimento de aplicativos.
Acessibilidade como base na experiência do usuário
Quando falamos em um design centrado no usuário e na sua experiência, é fácil imaginar aquele produto digital com uma interface amigável e de design inovador. O fato é que estudos indicam que as boas práticas da experiência do usuário também devem incluir acessibilidade em conteúdo digital. Acessibilidade está na base da pirâmide de UX Design, ela não é uma feature, é uma premissa.
Trago como exemplo, a importância de um Design System acessível, um produto interno de extremo valor que serve outros produtos e sistemas da empresa, fornecendo um ecossistema de componentes e padrões que podem ser utilizados como um acelerador. Esse ecossistema endereça as boas práticas de interface e usabilidade, garantindo consistência visual e padrão da experiência em todos os produtos digitais.
Ou seja, ao criar um componente de Carrossel cujo objetivo é exibir 3 imagens, o componente aceita como parâmetro os textos alternativos que serão interpretados pelos softwares de leitura de tela.
A tecnologia é, sim, uma grande aliada da acessibilidade.
(*) É CTO na BRQ Digital Solutions há mais de um ano. Também é Arquiteto de software, autor de livros pela editora Novatec e foi professor de Pós Graduação da Universidade Positivo.