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A importância do propósito empresarial

em Manchete Principal
terça-feira, 03 de janeiro de 2023

Guilherme Feldman (*)

Dentre as mudanças no mundo dos negócios, a principal delas é sobre como o acionista deixa de ser o foco das organizações, que antigamente buscavam apenas a maximização do lucro ao acionista, para que outros stakeholders ganhem espaço.

Em paralelo, o lucro deixa de ser o objetivo principal das empresas e passa a ser um item de sobrevivência. No ecossistema das startups temos vivido um cenário que reforça mais ainda esta tese.

O momento turbulento da economia mundial, gerou escassez de capital para modelos de negócio que não trazem resultado. As startups que nos últimos anos viviam de promessas arrecadando milhões em diversas rodadas de investimento, se veem em um cenário onde investidores evitam grandes riscos, a liquidez diminui e a fonte seca.

Não só startups passam por um cenário turbulento, mas mesmo grandes empresas como Meta, Amazon e Twitter, que passam por crises e demissões em massa, buscando se preparar para o novo cenário.

As empresas de especulação perdem espaço e a tese de que o lucro é necessário para sobrevivência ganha força. Rodadas de investimento já não são recorrentes como eram antes e não podem ser mais a fonte de capital das empresas.

Resta crer que a empresa precisa rodar no positivo para sobreviver ou não terá espaço nesse novo normal. Se antes o lucro ou a promessa dele era questão de sobrevivência, agora nem mais a promessa é uma possibilidade. Ele precisa ser real. Entretanto, diferente do que se falava no antigo capitalismo, isso não quer dizer que o objetivo central das empresas é de maximização de lucro para o acionista. O conceito é diferente.

O lucro precisa existir. É a saúde para a empresa. Assim como o ser humano precisa estar saudável para sobreviver, as organizações precisam do lucro para sobreviver. Nenhum ser humano vive apenas para ser saudável, mas é saudável para poder viver. Assim como as empresas não deveriam viver apenas para gerar lucro, mas gerar lucro para viver. Nesse caso, a ordem dos fatores altera o produto.

O ponto central é de que o lucro é necessário, mas ele é apenas uma consequência. Assim como a saúde humana é consequência de uma boa alimentação, exercícios físicos, saúde mental, boas noites de sono e por aí vai, o lucro da companhia é uma consequência de diversas ações e decisões tomadas pelos integrantes da empresa.
Matematicamente é claro que o lucro é a diferença entre receita e despesa, mas o que gera receita?

Mais do que isso, o que gera receita com a menor despesa possível? Ou mais, como fazer isso repetidas vezes e gerar longevidade para a geração de lucro e manter a saúde da companhia? Como ser humano sabemos que não adianta se alimentar bem por um mês e fazer exercícios por 30 dias e achar que estaremos saudáveis. Como empresa o conceito é o mesmo. Não é um mês de lucro que vai garantir a existência.

Então a saúde da companhia é a combinação da geração de lucro com constância. Cada negócio tem a sua forma de gerar receita. E cada negócio tem a sua maneira de gerenciar as despesas. Mas a consistência desse processo é garantida pela geração de valor e esse ponto é similar em muitos negócios.

Independente do mercado e da empresa, todas as organizações são impactadas por grupos de stakeholders. Clientes, colaboradores, fornecedores, parceiros, acionistas, são diversos os stakeholders que impactam um negócio. Lá no passado as empresas olhavam apenas para os acionistas. Algumas passaram a colocar o cliente no centro. Outras o colaborador.

Mas acima de quem está no centro o importante é olhar para o todo. Assim como reforçado pela Teoria dos Stakeholders, Freeman (2010), a organização é impactada por diversos grupos de stakeholders e o interesse de todos os grupos devem ser considerados.

O papel da companhia e de seus líderes é de administrar e moldar esses relacionamentos da empresa com seus stakeholders com a intenção de olhar para todos, fazendo os grupos se desenvolverem juntos e não apenas colocando os interesses da própria organização na frente dos outros.

Portanto, servir aos interesses de todos os stakeholders seria a melhor maneira de crescer, desenvolver o negócio e mercado e, acima de tudo, de gerar valor com longevidade. Esse senso de pertencimento da organização a um grupo e a sociedade, gerando uma importância em olhar para fora e não mais apenas para dentro, gera uma série de consequências.

As grandes empresas e o mundo já perceberam isso. A companhia não mais tem o objetivo de maximizar o lucro do acionista, mas ela tem um papel no seu mercado, no seu ecossistema e acima de tudo, na sociedade. Por um tempo as organizações gastavam rios de dinheiro em consultorias para criar missões, visões e valores que pudessem ser estampadas nas paredes da empresa. Frases bonitas que falassem o que as pessoas queriam ouvir.

Hoje já não cola mais. Hoje a empresa possui um papel na sociedade, mesmo ela não reconhecendo isso ainda. Existe um motivo para aquela empresa existir, uma ideia central que conecta todos os stakeholders da companhia, que a colocam em algum lugar na sociedade e essa ideia central é seu propósito.

O propósito da companhia, diferente da antiga missão, não é inventado. Não é uma consultoria que escreve uma frase bonita. Consultorias podem até ajudar a descobrir qual é ele, mas não criar um. O propósito é identificado e não criado. Ele existe, em algum lugar lá na cabeça das pessoas, enraizado por uma série de experiências já vividas.

E o propósito reforça a ideia de que há um ponto central na companhia que pode unir todos os stakeholders em algo muito maior do que apenas gerar lucro — ter um papel na sociedade.

(*) – É CEO da Bilheteria Digital (www.bilheteriadigital.com).