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A força crescente da Nova Economia em números

em Manchete Principal
terça-feira, 15 de junho de 2021

Diego Barreto (*)

Nos grandes centros urbanos, a força crescente da Nova Economia se vê em toda parte: na forma como nos locomovemos (Uber, 99), pedimos comida (iFood), fazemos compras (Mercado Livre, Magalu) e pagamentos (Stone, PagSeguro), investimos dinheiro (XP, Warren), programamos nossas férias (Airbnb, MaxMilhas) e nos divertimos – em casa (Netflix, Disney Plus, Amazon Prime, Globoplay) ou fora, quando a pandemia finalmente permitir (Sympla, Ingresso.com).

Os exemplos seguem de forma sumária: não há espaço possível, em um artigo, para citar todos os negócios que fazem a diferença nas nossas vidas, tocados pelos empreendedores da Nova Era. Negócios definidos, de maneira bastante simplificada, pela substituição da lógica de produção manufatureira – que caracteriza a Velha Economia – pelo fornecimento de produtos e serviços associado ao desenvolvimento de tecnologia proprietária.

Se todo o processo de passagem da Velha para a Nova Economia guarda complexidades, seus efeitos no nosso cotidiano são cristalinos. Mas o fundamental aqui é outra coisa: mostrar em que medida os números da economia corroboram essa percepção cotidiana – o que dá uma boa ideia, também, das perspectivas em relação ao futuro.

. PIBs e pibinhos – Sim, é verdade que hoje, no Brasil, a maior parcela do Produto Interno Bruto está atrelada à Velha Economia – commodities como soja, aço e carne, além de produtos manufaturados, como os automóveis e as cadeias de valor em que eles se inserem. Em graus diferentes, isso se repete em outros países. Mas os sinais do avanço da Nova Economia são bastante consistentes.

Comecemos pelos Estados Unidos, que estão na vanguarda dessas transformações. O valor de mercado das empresas de tecnologia com capital aberto em relação ao PIB cresceu firme na última década, já representando 39% do PIB, 3 vezes maior que uma década atrás.

Imagem: Freepik

Foi mais ou menos nesse mesmo período, e coerentemente, que se viu uma dança das cadeiras no ranking das dez maiores empresas do país por capitalização no mercado. Na década em questão, a tradicionalíssima Exxon Mobil, empresa de gás com os dois pés na Velha Economia, não só perdeu a liderança para a Apple como desapareceu do ranking, ocupado então por cinco empresas de tecnologia nas primeiras colocações.

De quebra, em oitavo, a Tesla com seus carros elétricos, fazendo as montadoras tradicionais comerem poeira. Na China se vê fenômeno semelhante, com a Alibaba e a Tencent — expoentes da Nova Economia — deixando para trás os bancos. No Brasil, embora comparativamente seja incipiente nessa área, vemos como uma empresa como o Mercado Livre, 100% Nova Economia, compete de igual para igual com companhias míticas, como a Petrobras e a Vale, além dos gigantes bancos brasileiros, ameaçados pela XP.

Entre os 10 maiores, o Magalu prova que mesmo uma empresa tradicional pode se reinventar, abandonando a origem do varejista físico para se tornar uma empresa baseada em tecnologia. Pedindo passagem, temos a Stone subindo e o Nubank em vias de se listar.

. Do varejo ao e-commerce – E se ainda faltam ao Brasil números parrudos (sempre falando comparativamente) de empresas da Nova Economia, os reflexos da sua ascensão na última década também são claros, por exemplo, no e-commerce — estão aí os exemplos já citados, Mercado Livre e o Magalu, que não me deixam mentir. Mas não só. Entre 2009 e 2019, a penetração do e-commerce saltou de 2% para cerca de 15% do total de vendas do varejo.

É razoável supor que essa penetração seja ainda maior na próxima década, quando uma miríade de empresas da Velha Economia se verá obrigada, em razão da pandemia, a migrar para o digital.

. Inovação contra solidez – Se muitos negócios correram atrás do prejuízo, as startups mostraram sua força. Os unicórnios deram as caras pela primeira vez em 2018, com oito empresas com ativos de mais de 1 bilhão de dólares. O cenário é conhecido: o número chegou a 17 unicórnios com a entrada da mineira Hotmart em 2021. Na sequência, é de se esperar a chegada de CargoX, Olist, Warren, entre outras.

Esses números são particularmente importantes porque mostram que está sendo criada uma nova safra de empresas da Nova Economia, alimentadas por um interesse crescente dos fundos de venture capital e family offices. Isso representa a mudança da alocação de capital, que migra passo a passo das corporações mais tradicionais (“sólidas”, como se dizia não faz muito tempo…) para os empreendimentos mais disruptivos.

Os fundos de renda fixa registraram saques superiores a 40 bilhões de reais em 2020, enquanto os fundos de ações captaram 70 bilhões de reais e os multimercado 98 bilhões de reais.

Grande mudança conjuntural em direção à tomada de risco maior, irrigando a Nova Economia, como nos IPOs vistos da Locaweb, Meliuz, Enjoei, Neogrid, Westwing, Bemobi, Mobly, Mosaico e Infracommerce e GetNinjas. Essas empresas valiam cerca de R$ 30 bilhões na bolsa ao longo de maio deste ano

Imagem: Freepik

. Taxas e serviços – Numa sociedade em quase tudo conectada, os impactos se estendem para outros setores da economia, em um efeito dominó que atinge as respectivas cadeias. Inclua-se aí o setor financeiro. Num país acostumado aos oligopólios e à concentração de mercado, os cinco maiores bancos ainda mostram pujança na conta final, com mais de 80% dos ativos no mercado financeiro nacional.

O interessante (mas não surpreendente) a essa altura do desenvolvimento da Nova Economia no Brasil, é que tamanho domínio não se traduz em satisfação do cliente. Em contraste, novos players que a tecnologia trouxe ao mercado, como o Nubank, Neon e o Inter, deixam os gigantes corporativos léguas para trás no quesito serviço ao cliente.

Em boa parte, isso se dá porque foram exatamente esses novos empreendimentos que evidenciaram, rapidamente, que as pessoas estão aprendendo a ver valor não na instituição, mas no serviço, no banking. É esse conjunto de fatores que faz a diferença quando falamos de competição de verdade — aquela que resulta em melhoria do serviço e dos preços. Um bom e ilustrativo exemplo é o do setor de adquirência, durante muitos anos praticamente restrito a apenas duas empresas.

A chegada de players como Stone e PagSeguro mostra um movimento duplo. Em primeiro lugar, o crescimento dessas novas empresas, pari passu com o declínio das mais tradicionais que não migraram para a Nova Economia; em segundo, vemos como o aprimoramento tecnológico, aliado à boa e velha competição, reduziu as taxas de administração para o comerciante, tanto no crédito quanto no débito.

Em 2016, Cielo e Rede tinham 80% de participação de mercado e, em 2019, atingiram 63%. Ao mesmo tempo, as taxas de adquirência atingiram seu menor custo histórico. Melhor para o negócio, melhor para a cadeia como todo, melhor para o consumidor. E melhor para o Brasil, no fim das contas. Mudando hábitos e culturas enraizadas, há muito mais a ganhar com a inovação. É ela quem, num momento difícil como o que estamos vivendo, permite que tenhamos confiança no futuro sem a retórica vazia do passado.

(*) – É VP de Finanças e Estratégia do iFood, Autor do best seller “Nova Economia”, Mentor da Endeavor e 500 Startups, e colunista da MIT Technology Review Brasil.