A saúde visual da criança e o aumento “alarmante” dos casos de miopia estão entre as principais preocupações dos oftalmologistas no Brasil
Alana Gandra/Agência Brasil
Segundo o médico César Lipener, membro do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), o desenvolvimento visual ocorre nos primeiros anos de vida, e a visão atinge a maturidade entre 5 e 6 anos de idade.
“Quando não existe um exame mais precoce, muitas vezes, a criança pode ter algum problema. A criança não se queixa, os pais não percebem, e essa avaliação, quando não é feita a tempo, pode acarretar sequelas ou dificuldades que a criança vai acabar levando para o resto da sua vida”, disse Lipener. As crianças devem fazer uma avaliação oftalmológica de preferência na idade pré-escolar porque, muitas vezes, os pais não percebem suas dificuldades ou têm a falsa impressão de que elas enxergam bem.
“Se houver alguma coisa que chame a atenção, uma hereditariedade muito importante, pais com estrabismo ou com alto grau, a consulta deve ser mais precoce ainda, até no primeiro ano de vida”, afirmou o médico. Ele destacou que, “felizmente”, os pediatras e as escolas estão ajudando os oftalmologistas, e as crianças estão começando a ter avaliações um pouco mais precoces. O principal, entretanto, é a conscientização dos pais sobre a necessidade da consulta oftalmológica precoce.
Segundo Lipener, o número de pessoas míopes vem aumentando em todo o mundo. Ele citou estudos que relacionam a atividade visual de perto com o aumento dos casos da doença, vinculado ao uso de telas de computadores, tablets e smartphones e lamentou que hoje as crianças comecem a manipular esses aparelhos cada vez mais cedo.
“Essa é outra preocupação desestimular o uso intenso e precoce de tais aparelhos, trocando-os por atividades ao ar livre. É um fator que, no mundo inteiro, mostrou-se eficaz para diminuir a evolução da miopia. A gente até brinca que, hoje, a chupeta é o celular”. A OMS prevê que, em 2020, a miopia atingirá cerca de 35% da população mundial. As projeções indicam que, em 2050, o percentual chegue a 52%.
No Brasil, o Instituto Data Popular estima que mais de 20 milhões de pessoas tenham problemas de visão, o que corresponderia a cerca de 10% da população. Em muitos casos, isso ocorre porque as pessoas não têm acesso a óculos de grau.
Atualmente, a miopia acomete uma em cada três pessoas no mundo, tornando-se o erro de refração com mais necessidade de prescrição. Na Ásia, 90% dos jovens de 20 anos de idade já são míopes, informou Lipener. “Se conseguirmos atrasar a evolução um pouquinho, já teremos um ganho considerável”.
No Brasil, estima-se que 80% das crianças em idade escolar nunca fizeram exames oftalmológicos. A miopia é um problema que tende a progredir com o passar dos anos e pode ter como consequência prejuízos no aprendizado ou falta de socialização da criança. “O diagnóstico é simples, e atualmente existem opções de tratamento que podem ajudar a retardar a progressão da miopia”. Outro problema é a visão subcorrigida, quando a pessoa usa óculos incorretos, ou não os usa quando necessário.
O hábito de fazer exames oftalmológicos deve ser estendido da infância até a vida adulta, incorporando-se à rotina de cuidados com a saúde. O site Put Vision First (Ponha a Visão em Primeiro Lugar), lançado mundialmente, traz informações para o público leigo e destaca a necessidade de uma rotina de cuidados e de visitas regulares ao médico oftalmologista.
O projeto ‘Como Você Vê o Mundo’, destinado à população que precisa de cuidados oculares, mas não pode pagar pelo serviço, entregou 107 óculos a pessoas inscritas no Programa de Atendimento a Refugiados e Solicitantes de Refúgio da Cáritas do Rio de Janeiro. A iniciativa resulta de parceria entre os institutos Ver & Viver e Nissan. O projeto foi lançado em 2015 e já beneficiou mais de 30 mil crianças e jovens em todo o Brasil, oferecendo também óculos a mais de 3,5 mil motoristas profissionais.
A diretora do Instituto Ver & Viver, Sandra Abreu, disse que esta é a primeira vez que a organização distribui no Rio de Janeiro óculos para correção visual a refugiados de várias procedências. Ela informou que a extensão desse atendimento para outras partes do país está sendo discutida para que se possa levar correção visual a refugiados em diversos estados, porque isso “muda a vida das pessoas”.
De acordo com Sandra, a prioridade é a população de baixa renda, seja nos segmentos mais voltados para a educação, seja no campo dos motoristas profissionais, dentro da campanha pela direção mais segura. Estatísticas mundiais demonstram que 59% dos acidentes de trânsito poderiam ser evitados se as pessoas estivessem corrigidas visualmente, disse a diretora do Instituto Ver & Viver.
Eficiência e Saúde
José Luiz Gomes do Amaral (*)
Não raro, crises produzem pressão para busca de eficiência, ou seja, fazer mais, com menos.
O movimento nesta direção se faz sentir, e com intensidade, em todos os setores da sociedade. Na Saúde, a situação não poderia ser diferente. É tempo de crise, é tempo de considerar revisão e propor mudanças em nosso sistema de Saúde. Fazê-lo, seja no âmbito da saúde pública ou no da privada. E que as mudanças nos tragam mais eficiência, qualidade e sustentabilidade.
Decorridos 20 anos de regulamentação dos planos de saúde, acumula-se conjunto de evidências suficiente para orientar as necessárias reformulações da Lei 9.656/1998. Há de se ter prudência ao rever a situação, pois não se pode admitir retrocessos como limitação da atenção à saúde, nem restrição às coberturas e, muito menos, acrescentar dificuldade no acesso ao progresso técnico-científico.
Este descaminho conduziria ao retorno à insegurança que prevalecia há duas décadas; seria retirar a segurança que o paciente pensa estar adquirindo quando contrata um plano de saúde, que tem como principal objetivo garantir que o beneficiário não passe por uma catástrofe financeira caso acometido de doença em si próprio ou em familiar.
Isso tem-se de preservar. Tampouco seria tolerável sobrecarregar ainda mais o sistema público, já insuficientemente financiado para atender os mais de 150 milhões de brasileiros que dependem exclusivamente dele e a totalidade dos 210 milhões de brasileiros que são beneficiados por suas ações.
Por outro lado, o que chamamos hoje de plano de saúde tem sido muito mais um plano para tratar doenças, distante da promoção à saúde, da prevenção de doenças, justamente o que mais se espera dele. Não é razoável exaurir os recursos da sociedade apenas tratando as doenças, sem buscar evitá-las.
Outro aspecto que precisa ser considerado com atenção é combater fraudes e corrupção, tema central do momento, particularmente no Brasil. É prioridade erradicar vícios desta natureza de nosso sistema de Saúde. A adoção sistemática do método científico na avaliação e a incorporação de tecnologias reduzirão eventuais desperdícios, representando não só economia de recursos, mas também de efeitos reversos.
Enfim, tem-se muito trabalho e longa jornada adiante, na qual o diálogo entre os setores envolvidos deverá privilegiar o bem-estar da sociedade e a sustentabilidade do sistema.
(*) – É presidente da Associação Paulista de Medicina.