Sheila Shimada (*)
A Resolução 59, determina que a partir de 2023 será necessária a publicação de dados referência, e dá início à regularização das publicações sobre o tema
A Resolução 59 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), editada em dezembro de 2021, após questionamento em consulta pública, oferece inovações substanciais para o regime informacional de emissores de valores mobiliários.
Ela veio substituir as instruções 480 e 481, simplificando e reestruturando as formas de divulgação de informações com o objetivo de tornar mais claras as diretrizes da CIA para com os investidores.
Os principais temas tratados são os de ampliação da apresentação de dados sobre aspectos ambientais, sociais e de governança (ESG) das atividades dos emissores.
Conforme a Resolução 59, a partir de 2 de janeiro de 2023, serão exigidos, nos formulários de referência para:
- Esclarecer porque não há a aplicação das melhores práticas de ESG nas empresas (modelo “pratique ou explique”)
- Divulgar políticas de controle ou não do inventário de emissões de gases de efeito estufa
- Divulgação de informação relativa aos riscos sociais, ambientais e climáticos do negócio;
- Divulgação de relatórios de diversidade, contendo a quantidade de funcionários por grupo de identidade de gênero, raça ou cor e idade de todos os níveis hierárquicos, inclusive do conselho de administração (diversidade)
- Divulgação de relatório de oportunidades inseridas no plano de negócios, relacionadas a questões ESG
Cenário europeu
O Brasil tem nítido objetivo de inserir na regulamentação nacional a tendência mundial da preocupação com o recorte ESG.
Nesse sentido, importante fazer uma analogia com o processo da ESG no cenário europeu, uma vez que claramente estamos seguindo as suas tendências.
A União Europeia tem feito avanços para colocar o ESG na linha de frente dos investimentos. Podemos ver isso através da adoção da Comissão Europeia do Regulamento Delegado (EU) 2021/1253, de 21 de abril de 2021, no que diz respeito à integração dos fatos, riscos e preferências de sustentabilidade para o setor de investimento, com aplicação a partir de 2 de agosto de 2022. Essa foi uma forma de incentivar as empresas a se adequarem às políticas de ESG para que possam inclusive candidatar-se ao recebimento de investimentos.
Esse conjunto de regras a serem aplicadas à atividade das empresas de investimento, está em linha com a estratégia escolhida pela Europa para estimular práticas de políticas que contribuem com a estabilidade climática, aumentar a transparência na identificação de oportunidades de investimento sustentável, que permitam propiciar uma vida saudável aos cidadãos e a proteção do capital natural e da biodiversidade. Não obstante, o fator climático ser o de maior relevância, o regulamento é muito mais amplo e visa, igualmente, incentivar investimentos nas empresas que estejam em linha com fatores sociais e de governança corporativa.
Criando critérios específicos para retirada do selo ESG
Na Europa, a falta de critérios para preenchimento dos requisitos para conseguir o selo verde pelos fundos de investimento, vem causando grandes desconfortos para o setor financeiro.
Em função disso, a União Europeia está trabalhando em uma regulamentação que determine o que pode e o que não pode ser comercializado como um ativo sustentável ou ESG, organizando o mercado de capitais, criando metas e critérios específicos para essa caracterização, para que somente assim seja viável o envio do selo de ESG.
Toda a Europa tem expectativas sobre o referido alinhamento, para que se crie uma regra geral para todo o Continente, uma vez que a ausência de regras está fazendo com que cada país adote um critério específico.
Percebe-se, assim, além do Brasil, demais países considerados como grandes potências estão tratando, apenas agora, da legislação e da adequação sobre o tema ESG, apesar da discussão em torno dessa matéria já durar alguns anos. A adoção e discussão desses critérios é um ponto positivo para o Brasil, que tem, nos últimos anos, trabalhado muito – principalmente no âmbito regulatório da CVM – na adequação da legislação para fomentar o mercado e torná-lo atrativo e seguro.
A expectativa é que, após a prática dessa política pelas grandes corporações, através das exigências da CVM, as pequenas empresas e startups passem a adotar tais práticas. Isso melhoraria o posicionamento desses negócios nos mercados interno e externo, gerando valor, atraindo talentos e demonstrando o compromisso com a política social.
Propostas trazidas pela Resolução 59 da CVM
Iniciativas como a Resolução 59 são pioneiras no Brasil e visam a mudança do comportamento empresarial para todas as empresas. Em cada era da indústria e dos investimentos percebeu-se um enfoque específico, fomentado pela regulamentação jurídica – aumento da produção, industrialização em massa, determinação de padrões de consumo, criação de tecnologias, entre outras frentes. Agora, tenta-se atrelar todos esses fatores a questões sociais, unindo companhias e investidores em prol da cultura da diversidade, da preocupação ética e do tão urgente tema ambiental.
Claro que na divulgação dessas políticas destacamos os benefícios financeiros para a empresa, principalmente no que diz respeito à sua relação com os investidores, mas o fato é que a proposta da CVM visa não somente demonstrar e incentivar as políticas de ESG para garantir o melhor posicionamento com os investidores, mas também para que toda a sociedade tenha ciência da consciência social e ambiental das empresas, fomentando esse comportamento, para que uma nova fase da economia se apresente.
Não somente por motivos financeiros, mas por responsabilidade com a coletividade e com o meio ambiente, a ESG veio para ficar e vai modificar o comportamento do mercado de capitais.
(*) – Formada pela Mackenzie, Pós em Direito Processual Civil na PUC-SP, Extensão na FGV Law em Tributação, é professora de direito empresarial na USP. É Mediadora, formada pela Faculdade Legale.