Comissões de frente surpreendem por inovações a cada carnaval
As comissões de frente se transformaram em um espetáculo à parte nos desfiles das escolas de samba do Grupo Especial do Rio de Janeiro, e são muito aguardadas pelo público pelas surpresas e truques dos componentes no início de cada apresentação.
Campeã em 2015, a comissão de frente da Beija-Flor mostrava o refúgio místico. |
“O público vai para ver aquele espetáculo ali logo no início. Hoje, a comissão de frente é o cartão de visita. O público já começa a gritar e esquentar, então isso pega a escola inteira”, disse o coreógrafo da comissão de frente da União da Ilha, Patrick Carvalho, que este ano fará seu segundo carnaval pela escola.
De acordo com o regulamento dos desfiles, a comissão de frente tem que ter 15 integrantes. Mas, nos últimos anos, algumas escolas têm usado um artifício para levar mais componentes à avenida: o truque é ter bailarinos “invisíveis”, que se escondem nas alegorias, e deixar à mostra apenas o número limite permitido pela Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa). Foi assim, por exemplo, que em 2015 a União da Ilha desfilou uma Branca de Neve que, ora aparecia ao lado dos sete anões, ora aparecia rodeada de bailarinos vestidos de animais.
A coreografia rendeu a maior pontuação da escola no ano passado (29,9 pontos). Este ano, segundo o coreógrafo, a comissão terá 15 integrantes e promete emocionar a avenida. “Tive que fazer dois meses de laboratório com as pessoas, não são só bailarinos. É uma comissão que vai pegar a avenida mais do que no ano passado, dez vezes mais”, prevê.
Segundo Carvalho, o interesse maior pelas comissões de frente nos últimos anos aumentou a responsabilidade dos coreógrafos, que precisam ser cada vez mais criativos. “Hoje, quando um presidente vem falar com você sobre a comissão ele já diz: ‘quero uma grande comissão de frente. Quanto mais lhe dão, mais lhe cobram. Se tem mais recursos, você tem que ter mais criatividade.”
A escolha do que vai ser apresentado pela comissão de frente pode ser do carnavalesco ou do coreógrafo. Na Vila Isabel, este ano, a criação será do coreógrafo da escola, Jaime Arôxa. “O que todos fariam é o que não vou fazer, porque se não estou indo no clichê, no óbvio, e eu tenho que sair do óbvio, tenho que surpreender. Eu faço parte da festa, mas eu sou o garçom. Não preciso ser o melhor garçom, mas tenho que trazer o melhor vinho”, comparou. A Vila vai homenagear o político pernambucano Miguel Arraes.
“Este ano, a gente vem com um elemento de cena que é completamente diferente do meu universo. Eu vou ter o frevo, mas não de uma maneira óbvia. O frevo já é forte por si só, mas para ter um valor na avenida eu vou fazer ele surgir do lodo, quase debaixo da terra”, disse, acrescentando que a comissão terá 20 integrantes, todos do Recife.
Arôxa destacou que o desfile é um espetáculo em movimento e que a comissão de frente se apresenta para os jurados em diferentes pontos da avenida. “Eu posso dançar maravilhosamente no espaço entre um jurado e outro, fazer a coisa mais linda do mundo, o deus da dança. Mas, se diante do jurado escorregar, eu perdi. O que vale é o jurado. Então tenho duas missões: encantar o público e o jurado”.
Os coreógrafos Jorge Teixeira e Saulo Finelon trabalham juntos há dez anos. Ano passado, voltaram para a Mocidade Independente de Padre Miguel. Em 2016, a escola levará para a avenida o enredo O Brasil de La Mancha: Sou Miguel, Padre Miguel. Sou Cervantes, Sou Quixote Cavaleiro, Pixote Brasileiro.
Os dois prepararam coreografias diferentes para os 27 integrantes da comissão de frente: duas de avanço, uma específica para os jurados e outra para voltar ao estágio inicial e continuar desfilando. “Trazer Dom Quixote para o Brasil não é fácil e acho que conseguimos resolver isso superbem. As pessoas vão se emocionar”, adiantou Jorge Teixeira.
Em todas as escolas, os coreógrafos costumam manter em segredo o que será mostrado pelas comissões. Para os representantes da Mocidade, o mistério ajuda no impacto do espetáculo. “É a cerejinha do bolo. É aquela surpresa, o momento que dá diferença de um para o outro. Gosto da surpresa pela sensibilização”, disse Teixeira.
“Quando se vê uma coisa pela primeira vez, o impacto é um, depois a coisa já muda”, acrescentou Finelon. Segundo ele, o segredo em torno da comissão de frente deixa o trabalho ainda mais intenso. “Fica cansativo porque tem que ensaiar de madrugada e esperar todo mundo sair”, destacou (ABr).