Mauricio de Almeida/Agência Brasil
Em fevereiro de 2012, a Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF) sofreu um incêndio que destruiu 70% das instalações. Sete meses depois, começou a complexa 31ª Operação Antártica, com a missão de retirar os escombros e resíduos da EACF. A ação contou com a supervisão do Ministério do Meio Ambiente e inspetores de outros países para garantir a preservação ambiental na Antártica. Cerca de 900 toneladas de resíduos foram trazidas ao Brasil.
Sete anos depois do incêndio, o Brasil se prepara para reinaugurar a Estação Comandante Ferraz, previsto para janeiro de 2020. Viajar para a Antártica é a realização de um sonho quase impossível. Afinal o continente gelado é a região mais isolada do planeta e chegar nele não é uma tarefa fácil. Além da distância, outros fatores dificultam a viagem como ventos que podem chegar a 200 km por hora e o frio intenso que deixa o mar Antártico congelado entre o fim de março e o início de outubro.
No meu caso este sonho se transformou em realidade quando me escalaram para fazer a cobertura da 38ª Operação da Marinha na Antártica. O motivo da viagem é acertar os últimos detalhes para a reinauguração da base polar Comandante Ferraz. A estação científica brasileira foi completamente reconstruída pelo governo federal, numa obra que custou quase US$ 100 milhões e será reinaugurada em janeiro do ano que vem.
Para chegar à Antártica existem duas opções: você pode ir de navio partindo da costa chilena ou argentina numa viagem que dura três dias atravessando o Estreito de Magalhães, uma das regiões mais turbulentas dos oceanos. A outra opção é voar da base chilena de Punta Arenas, a cidade que fica mais ao sul do continente. Nos dois casos, as viagens só podem ser realizadas entre outubro e março, que é o chamado verão antártico.
Nós fomos de avião e seguimos um roteiro planejado com antecedência numa parceria entre a Marinha e a Aeronáutica. O contra-almirante Sérgio Guida, que é o gerente do Programa Brasileiro na Antártica, explica que todos os cuidados precisam ser tomados para evitar acidentes.
O embarque rumo ao continente gelado foi realizado na Base Aérea do Galeão. Em dois dias vou trocar a temperatura, que nesta época do ano, já chegou a perto de 40 graus em terras cariocas pelo frio polar que, em novembro, costuma ficar em torno de 15 graus negativos.
Durante o voo, por exemplo, toda a comunicação do piloto com os passageiros é realizada com um toque sonoro de uma sineta que lembra uma buzina de bicicleta. Ao sinal deste som todos os passageiros devem sentar e afivelar os cintos porque ou vamos passar por uma área de turbulência ou estamos perto do pouso.
Além de seguro, o voo no Hércules é suave e em três horas fizemos o trajeto Rio de Janeiro – Pelotas, no Rio Grande do Sul. A escala é fundamental porque, no aeroporto, representantes da Marinha entregam aos passageiros um saco com as chamadas andainas, vestimentas especiais para proteger do frio Antártico.
No primeiro dia de viagem, dormimos em Pelotas. Na manhã seguinte, acordamos cedo e às 9h decolamos para Punta Arenas, no Chile. A segunda parte da viagem também foi calma e durou seis horas. No território chileno é hora de fazer a imigração e passar por uma revista rigorosa. Para evitar um desequilíbrio ecológico na Antártica qualquer tipo de comida ou de vegetal tem entrada proibida.
Após o desembarque em Punta Arenas começava a parte mais aguardada e tensa da viagem. Ninguém sabe a que horas poderemos decolar para a Antártica. O comandante do Programa Antártico Brasileiro, contra-almirante Sérgio Guida, explica que é preciso aguardar a chamada janela quando o avião pode voar em segurança. O motivo da preocupação é que nesta época do ano são registrados os ventos mais intensos na região.
O contra-almirante resume em uma frase como é chegar na Antártica: “Não é você que escolhe quando vai para a Antártica é a Antártica que decide quando você pode chegar nela”. Recebemos a informação de que a “janela” estava aberta e que na manhã seguinte embarcaríamos. Depois de dois dias faltava pouco para pisar na Antártica. A viagem até a Antártica durou três horas e foi cercada de expectativa. Até para os mais experientes a sensação de voltar ao continente gelado impressiona como o tenente Moisés Mendes que já trabalhou durante um ano na Estação Brasileira na Antártica.
Se quem já ficou um ano na Antártica se emociona imagina quem vai chegar pela primeira vez como eu. O sinal sonoro da sineta indica que vamos pousar. A aterrisagem numa pista de gelo só pode ser realizada por pilotos experientes. Avião no chão! Hora do desembarque. Enfim vamos pisar no gelo antártico. Descendo a pequena escada do Hércules parece que mergulhamos em outro mundo. Um continente branco com geleiras imponentes.
Aqui as regras de preservação da natureza são rigorosas. Você não pode se aproximar de nenhum animal e nem retirar nada do local. As exceções acontecem apenas para pesquisadores autorizados. Depois de uma caminhada rápida a viagem ainda não acabou. O avião pousou na pista da base chilena então precisamos entrar num barco para chegar na estação brasileira.
Navegamos ao lado de geleiras no navio polar Almirante Maximiliano, carinhosamente chamado de tio Max. Além de auxiliar nos deslocamentos, a embarcação brasileira também é um centro de pesquisas que coleta dados do oceano. Três horas depois chegamos na praia brasileira na Antártica e depois de uma viagem de aventura agora vai começar a nossa missão visitar e conhecer a nova Estação Comandante Ferraz.