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Tributação avança sobre grandes fortunas

em Destaques
segunda-feira, 02 de outubro de 2023

A taxação de grandes fortunas, dividendos, fundos exclusivos e offshore e a implantação do IPVA para jatos e iates particulares e de empresas são impostos focados na alta renda e apontam um claro movimento de redistribuição de carga tributária

Diversas propostas previstas no projeto de Reforma Tributária sinalizam um movimento de aumento na carga tributária dos super ricos. Apontadas pelo governo como medidas que irão garantir a maior justiça tributária e darão maior equilíbrio aos cofres públicos, com projeções de arrecadação que podem chegar aos R$ 45 bilhões, estão previstas a taxação de grandes fortunas, de dividendos dos lucros das empresas e de fundos exclusivos, de ativos e contas offshore, bem como a cobrança de IPVA para jatos e iates particulares ou de empresas, e a extinção de dedutibilidade dos Juros Sobre o Capital Próprio (JCP).

Este cerco tributário à alta renda do País impacta tanto pessoas físicas de alta renda, quanto family offices e sócios de empresas, de acordo com o advogado Rodrigo Oliveira, advogado tributarista e sócio do Martinelli Advogados, um dos maiores escritórios de advocacia do País. E esse movimento já preocupa empresas de médio e grande porte atendidas pelo escritório, que serão oneradas por essas medidas e temem o impacto sobre os seus negócios. Algumas das medidas apresentam ainda pontos que poderão ser questionados na Justiça, levando a um movimento de judicialização. “As regras propostas pela MP dos fundos exclusivos, por exemplo, fere a tributação das pessoas físicas sobre o “regime de caixa”, incidindo IR antes que as pessoas físicas façam liquidação ou resgate de valores investidos. Além disso, os lucros acumulados até 2023 também estão sendo pauta para tributação, considerando essa “nova regra”, o que fere o princípio de legalidade, já que não há no exercício de 2023 legislação vigente que determine essa tributação. Portanto, seria uma legislação ruim para os contribuintes, retroagindo efeitos para alcançar fatos geradores pretéritos”, afirma Oliveira. Confira abaixo de que forma o governo pretende taxar temas que impactam os super ricos e em que pé está cada tópico:

Grandes Fortunas
Previsto na Constituição Brasileira de 1988, o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) é um imposto federal que ainda não foi regulamentado e, por isso, não pôde ser aplicado. “Mas tudo pode mudar com a Reforma Tributária. Existem vários projetos de lei tramitando no Congresso, como o PLP 183/2019, que propõe alíquotas progressivas de 0,5%, 0,75%, e 1%, conforme o valor de patrimônio líquido a partir de R$ 12 mil até R$ 70 mil e o PLP 74/2022, com alíquotas de 1% para patrimônio líquido acima de R$ 10 milhões, 2% para PL entre R$ 40 e R$ 80 milhões e 3% para PL acima de R$ 80 milhões, por exemplo.”, explica Oliveira. A avaliação do escritório é de que esses projetos têm poucas chances de aprovação.

Taxação dos Dividendos
A taxação dos dividendos deve voltar à pauta na próxima etapa da Reforma Tributária. Contudo, para isso acontecer, a reforma tem que ser aprovada até o segundo semestre de 2023, para que as alterações passem a valer a partir do ano de 2024. Os dividendos deverão ser tributados em 15%, conforme previsto no PL 2337/21, criado anteriormente à Reforma Tributária. “As empresas estão preocupadas se serão tributadas duas vezes, pois já o são no IRPJ e CSLL, que combinados resultam em uma carga tributária de até 34%. A expectativa é que a tributação de dividendos de 15% tenha como contrapartida uma redução, de 15% para até 8%, no IRPJ das empresas”, comenta Oliveira. A avaliação é de que esse projeto deve ser aprovado.

Fundos Exclusivos e Offshore
Cerca de 2.500 brasileiros possuem hoje investimento inicial de R$ 10 milhões que lhes permitem participar de fundos exclusivos, que hoje representam 12% dos fundos do País, concentrando R$ 756 bilhões. Tanto em fundos onshore como offshore é importante destacar que a tributação é realizada sobre os rendimentos dos fundos. Contudo, atualmente, os participantes dos fundos exclusivos só pagam imposto de renda quando realizam os saques destes fundos, e a proposta do governo é cobrar IR de forma periódica, de seis em seis meses, conforme já é realizado nos demais fundos de investimentos do País, em um sistema chamado de come-cotas. A Medida Provisória 1.184/2023, que dispõe sobre a tributação de aplicações em fundos de investimento no País, prevê a aplicação de alíquotas de 15% a 20% de imposto de renda sobre os rendimentos dos fundos exclusivos. Já os fundos offshore em nome de brasileiros no exterior somam ativos de R$ 1 trilhão. O governo pretende cobrar IR de forma periódica sobre os rendimentos dos fundos com alíquota entre 0% e 22,5% de forma escalonada, dependendo do valor que se tem aplicado em offshores, de acordo com o PL 4.173/2023, que dispõe sobre a tributação da renda auferida por pessoas físicas residentes no País em aplicações financeiras e trusts no exterior. Neste PL, a pessoa física residente no País computará, de forma separada dos demais rendimentos e dos ganhos de capital, na Declaração de Ajuste Anual – DAA, os rendimentos do capital aplicado no exterior, nas modalidades de aplicações financeiras e de lucros e dividendo de entidades controladas. Os rendimento ficarão sujeitos à incidência do IRPF, no ajuste anual, pelas seguintes alíquotas: 0% sobre parcela anual de rendimentos que não ultrapassar R$ 6 mil, 15% sobre rendimentos que excedem R$ 6 mil e não ultrapassem R$ 50 mil, e 22,5% sobre rendimentos que ultrapassem R$ 50 mil. Por fim, importante destacar que, em se tratando de MP, essas regras devem ser convertidas em lei pelo Congresso Nacional em até 120 dias, caso contrário perderão eficácia, caso aprovada, as alterações entrariam em vigor a partir de 2024.

Juros sobre Capital Próprio
Os Juros sobre Capital Próprio são uma forma de remunerar os sócios ou acionistas pelo capital investido na empresa e, diferentemente dos dividendos, não decorrem do lucro líquido da empresa, são calculados a partir do patrimônio líquido e contabilizados como despesas no balanço patrimonial, antes do cálculo do IRPJ e da CSLL. Caso o Congresso aprove ainda em 2023 o PL 4.258, que dispõe sobre a legislação do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido, publicado pelo Governo Federal em 31/8, extinguindo a dedutibilidade das despesas de JCP a partir de janeiro de 2024, a medida pode estimular o endividamento das empresas junto ao mercado financeiro. Este tema pode também retornar à pauta na próxima etapa da Reforma Tributária.

“Como os juros do capital próprio dos acionistas deixará de ser dedutível, se o PL for aprovado, será mais vantajoso tomar recursos no mercado, onde os juros são passíveis de dedução. Por isso, trata-se de uma proposta que pode desestimular o desenvolvimento, pois incentivará o endividamento das empresas”, aponta Oliveira. Ele destaca que os JCP são um importante instrumento de planejamento tributário empresarial, pois possuem dedutibilidade autorizada legalmente (despesa que pode ser aproveitada). Ou seja, reduzem o montante a ser recolhido a título de IRPJ e CSLL − em regra geral em 34% −, a um custo de IRRF de 15%, proporcionando um ganho líquido de 19% em termos de eficiência tributária. A avaliação é de que esse projeto deve ser aprovado.

IPVA para jatos, iates e lanchas particulares
Atualmente, proprietários de jatinhos, aviões, helicópteros, barcos, motos aquáticas e iates são isentos do pagamento do Impostos sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), cobrado anualmente para os donos de automóveis. Contudo, o texto da Reforma Tributária já aprovado na Câmara, a proposta de emenda à constituição nº 45/2019, agora em tramitação no Senado, impõe o IPVA também para esses bens. A cobrança deve ser iniciada em 2026, caso não haja mudança no texto. Segundo estudo do Sindicato dos Auditores da Receita Federal (Sindifisco Nacional), a estimativa de aumento da arrecadação é de R$ 4,7 bilhões, sendo 90% provenientes de embarcações e 10% de aeronaves.