Ubiratan Lima (*)
“Know Your Customer” ou “Know Your Client”, em resumo, é uma sigla muito recorrente no mundo dos negócios, amplamente utilizada para determinar um conjunto de informações necessárias para emitir e concluir um juízo de valor seguro a respeito de um parceiro comercial. Porém, a realidade é que é bem mais e muito além disso.
Existem normativas regulatórias específicas para bancos e instituições financeiras que precisam cumprir uma série de levantamentos e pesquisas referentes aos seus clientes e, com isso, assegurar a lisura das formalidades paralegais e de origens de recursos. A preocupação é acerca de programas de proteção à lavagem de dinheiro, atos ilícitos e financiamento ao terrorismo.
Esse tipo de processo monitora o cliente desde sua entrada, acompanhando suas operações ao longo do relacionamento com a instituição. Geralmente, as políticas do “Know Your Costumer” ou “Know Your Client” apuram e testificam informações de renda, patrimônio e investimentos, além de identificar as origens e o volume de seus recursos financeiros.
Com isso, a instituição é capaz de apontar transações suspeitas, depósitos de valores fora do padrão, saber se a pessoa ou empresa é politicamente exposta e outras situações que possam significar um caso de lavagem de dinheiro, apologia ao trabalho escravo ou financiamento ao terrorismo, por exemplo.
O KYC deve incluir também processos de identificação do cliente de elaboração de políticas de ingresso, assim como proporcionar ferramentas capazes de identificar e monitorar eventos, pessoas e instituições consideradas de alto risco para fechar negócios e/ou firmar parcerias.
Esses processos são encabeçados também pelo ENCCLA (Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro) e começaram a ser estabelecidos pelo Comitê de Supervisão Bancária de Basileia (fórum internacional criado para discussão e formulação de recomendações para a regulação prudencial e cooperação para supervisão bancária), entre 2001 e 2003, que visava nivelar e padronizar as informações dos operadores do mercado financeiro e seus clientes.
A preocupação com Compliance ganhou holofotes com a vigência da Lei de Prevenção à Lavagem de Dinheiro, estabelecida em 1998 e atualizada em 2012, e com a LGPD nos últimos tempos. Por isso, dispositivos regulatórios, como o KYC, tornaram-se essenciais para que bancos e operadores financeiros saibam exatamente quem são seus clientes para traçar estratégias. O KYC extrapolou o atendimento regulatório e baliza as grandes negociações dos agentes e bureaux de negócios.
Saber quem está sentado à mesa antes das conversas e tratativas economiza e otimiza tempo, dinheiro, além de dimensionar os termos e riscos inerentes ao negócio. Embora o nascimento e notoriedade do KYC tenha acontecido por meio de empresas que correm riscos de fraudes financeiras, corrupção, lavagem de dinheiro, financiamento ao terrorismo e outras ameaças relacionadas a finanças, hoje, existe um grande mar aberto para a sua aplicação.
Com as necessidades cada vez maiores e mais abrangentes, bancos, instituições financeiras e, principalmente, empresas, vêm terceirizando este trabalho, solicitando quesitos compatíveis com a grandiosidade e complexidade das demandas, incluindo opiniões legais e pareceres de risco, crédito, conformidade de governança, Compliance, e temas de ESG.
Este tipo de produto mais sofisticado está surgindo no mercado como uma evolução do KYC convencional, tomando uma nova forma e transformando-se no “Know Your Customer & Valuation” ou KYC&V, envolvendo, além dos temas convencionais, riscos de ordem legal, financeira e econômica, comprometimento reputacional, riscos de perenidade e sucessórios.
Análises de KYC&V evoluíram dos modelos reativos (quando as informações são obtidas por simples coleta ou solicitação ao cliente) para os preditivos. Ou seja, utilizando de complexos algoritmos de estudos econométricos, é possível antever quaisquer características ou comportamentos nocivos do perfil analisado.Modelos preditivos são essenciais para a mitigação de riscos não percebidos com simples análises reativas e que concorrem a perdas e prejuízos não contemplados nos Business Plan’s tradicionais.
Infelizmente, este tipo de análise ainda é pouco utilizado, o que acaba expondo os participantes das rodadas de negócios a uma falsa sensação de segurança, balizada em modelos de KYC ultrapassados. A atribuição da expressão “Valuation” à análise do KYC agrega dimensionamento volumétrico e tangível ao perfil analisado, limite de crédito por exemplo, e completa temas intangíveis, como riscos percebidos e/ou risco reputacional, aderência à boas práticas de mercado e índices de aderência às práticas ESG.
(*) – Economista com Especialização em Finanças, Administração Contábil e Financeira, é sócio-diretor e economista da B Capital Group, butique de negócios (http://www.bcapitalgroup.com.br/).