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Mulheres assumem gestão financeira das famílias, mas falta de apoio gera endividamentos

em Destaques
quarta-feira, 13 de março de 2024

Renata Midori (*)

Hoje, graças à maior participação no mercado de trabalho, as mulheres são também responsáveis pela gestão financeira das famílias. Segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a proporção de mulheres na liderança dos lares saltou de 35,7%, em 2012, para 50,9%, em 2022.

Fatores como aumento na taxa de divórcio, aumento da idade média para o casamento e redução na quantidade de filhos, contribuem para esse cenário, uma vez que tornam as mulheres mais independentes e capazes de assumir responsabilidades financeiras maiores.

À medida que as mulheres assumem cada vez mais responsabilidades na gestão financeira das famílias, enfrentam desafios significativos devido à falta de apoio adequado.

Embora elas assumam o controle das finanças domésticas com determinação e habilidade, a falta de educação financeira e a ausência de redes de apoio muitas vezes as deixam vulneráveis a endividamentos. É crucial que haja investimento em programas de educação financeira voltados para as mulheres e que se promova uma cultura de apoio e capacitação para ajudá-las a administrar eficazmente as finanças familiares.

Além do problema da disparidade salarial – que levou à criação do projeto que estabelece critérios de promoção da equidade salarial entre homens e mulheres –, a população feminina ainda precisa lidar com algumas responsabilidades que deveriam ser compartilhadas com os homens. Tarefas domésticas, cuidados com os filhos e/ou cuidados com idosos.

Diversas atividades são impostas às mulheres, gerando uma sobrecarga que as impede de se desenvolver profissionalmente na mesma proporção que a população masculina, prejudicando, assim, seus rendimentos. Com tanto trabalho doméstico acumulado e remunerações ainda não adequadas, torna-se inviável que as mulheres tenham o básico: tempo para se debruçar sobre os gastos mensais e calcular estratégias que ajudem a ter o melhor aproveitamento do dinheiro em mãos.

O tempo é fundamental para um bom planejamento financeiro, sabemos. Se não temos disponibilidade para encontrar soluções que tragam equilíbrio nas contas, corremos risco maior de sofrer com o endividamento futuro. O quadro tende a ser mais delicado quando se observam as mulheres de menor poder aquisitivo. Nos mais de 20 milhões de lares de baixa renda no Brasil, a proporção de mulheres que fazem gestão financeira das famílias chega a 81,6%, segundo dados do IBGE.

Mulheres mais pobres, com menor grau de capacitação profissional, salário menor, maior acúmulo de trabalhos domésticos não remunerados, e ainda sem uma rede de apoio que possa auxiliar no cuidado com os filhos e com a casa, certamente terão maior dificuldade para fazer uma boa gestão dos gastos.

A educação financeira pode ser apontada como solução para o problema – é uma necessidade para todos os grupos sociais no Brasil, homens e mulheres de todas as classes sociais precisam ainda se conscientizar da importância de manter uma relação saudável com o dinheiro.

Contudo, é importante observar com atenção a situação dessas mulheres responsáveis pelas contas das famílias, porque para muitas delas o que fará realmente a diferença é proporcionar meios para que possam ter um efetivo aumento de renda. A oferta de crédito por instituições financeiras, que traz recursos para que as famílias possam consumir mesmo não tendo ainda dinheiro em caixa, é uma ferramenta de grande valor, especialmente para a população de menor poder aquisitivo.

O mais recente levantamento do Banco Central sobre a diferença no acesso a serviços financeiros entre homens e mulheres indica que, em dezembro de 2017, as mulheres que recebiam até 2 salários mínimos representavam mais de 50% do total de tomadores de crédito no Brasil. Já entre a população mais rica, com renda acima de 20 salários mínimos, as mulheres representam pouco mais de 25% dos tomadores de crédito.

Contudo, o crédito ainda não soluciona o problema como um todo. A sociedade precisa reconhecer a importância de Políticas Públicas que promovam a independência financeira das mulheres, permitindo que elas tenham acesso à capacitação profissional, boa remuneração no trabalho e rede de apoio para cuidar de tarefas domésticas sem abrir mão da carreira. Medidas como a flexibilização de horários para que mães e pais possam ter maior equilíbrio entre vida profissional e vida familiar, são uma opção a considerar.

Não reconhecer o impacto da sobrecarga de tarefas em mulheres que não são plenamente maduras financeiramente tenderá a gerar um ciclo ainda maior de endividamento e pobreza. As gerações futuras, filhos e netos de mulheres que tiveram que redobrar os esforços para fechar as contas do mês, poderão se sentir desestimulados e terão dificuldades para romper com esse ciclo, reforçando as desigualdades socioeconômicas que já vemos na população.

Para superarmos esse obstáculo, é necessário um olhar mais atento às mulheres que estão chefiando seus lares, compreendendo suas dores e demandas, para que o mercado e o Poder Público possam articular soluções efetivas. Afinal, empoderamento feminino é isso: promover às mulheres condições para que tenham mais liberdade, autonomia, e, acima de tudo, respeito.

(*) – É gerente executiva de Planejamento de Crédito da DM, tendo sido eleita no Top 5 Women in Credit do CMS Financial Innovation.