Gautam Goswami (*)
Atividades ao ar livre como acampar, cozinhar em um trailer, dormir em um barco ou simplesmente caminhar por parques floridos e bem arborizados são incríveis – e agora, mais que nunca. Elas representam aquela pausa refrescante das rotinas diárias, e por vezes extremamente puxadas, da vida de todo o ser humano.
Com o advento e o alastramento da Covid-19, essas atividades acabaram ficando na saudade para a grande maioria e a verdade é que são poucos os que ainda podem usufruir de tal liberdade. No entanto, e eu entendo os porquês, por mais prazeroso e incrível que possa ser tirar férias em um local novo e interessante, há também a possibilidade de que problemas e inconvenientes ocorram no período. Claro, para alguns talvez tudo corra perfeitamente.
Para outros, porém, o fato de ter de lidar com situações estressantes em um ambiente desconhecido, ainda que incrível, pode tornar a experiência maçante e cansativa. A mesma situação pode acontecer com os espaços de trabalho, os chamados workplaces. No começo da pandemia, os funcionários de escritórios e empresas foram orientados a trabalhar remotamente de suas casas como medida para limitar a propagação do vírus.
Para muitos, esse modelo de trabalho caiu como uma bênção, proporcionando alívio do deslocamento diário, dispensa do uso das roupas formais do escritório e uma oportunidade de ouro para equilibrar melhor vida pessoal e profissional. Ao mesmo tempo, as empresas começaram a perceber níveis surpreendentemente altos de produtividade entre esses mesmos funcionários que antes passavam o dia todo no escritório ou em visitas a clientes – e que agora faziam tudo remotamente, não importando onde estivessem.
Mesmo distribuídas por regiões ou globalmente, as forças de trabalho remotas realmente primaram pela produtividade – o que acabou levando a especulações sobre o futuro do ambiente de trabalho, dos grandes complexos de escritórios e das equipes antes alocadas em tais edifícios. Algumas organizações cujos contratos de locação expiraram durante o ano passado decidiram até mesmo nem renovar os documentos. E, de fato, eles parecem estar indo muito bem sem o custo do aluguel e de todas as despesas de um escritório comercial ativo.
Já outras companhias provavelmente também declinaram da renovação por reconhecerem que suas necessidades de espaço mudaram à medida que mais de seus funcionários continuaram – e continuam – a trabalhar remotamente. Essa mudança tem encorajado questionamentos bastante pertinentes sobre o futuro do trabalho. Um estudo do Instituto Becker Friedman descobriu que 37% dos empregos nos Estados Unidos poderiam ser realizados perfeitamente de casa.
Outra pesquisa, do Instituto Gartner, aferiu que 82% dos líderes corporativos entrevistados pretendem manter o trabalho remoto em dias ou horários específicos durante a jornada semanal das equipes após a pandemia do coronavírus. Ou seja: empregadores, gestores e funcionários planejam trabalhar de uma forma não considerada anteriormente.
Ainda assim, para a maioria – e eu me incluo nela – os aspectos irritantes de associar a vida profissional e a pessoal no mesmo espaço, as exaustivas horas de trabalho, a falta de uma rotina estruturada e a ausência de socialização com os colegas de trabalho tornaram-se um peso para um bom desempenho contínuo. Isso tudo, juntamente com a impraticabilidade de colaborar em certos tipos de projetos, acabou levando muitos à conclusão de que um retorno parcial ao escritório deva ser quase certo após a pandemia.
Eu compartilho fortemente dessa crença, já que vejo um grande renascimento da cultura do escritório quando a Covid-19 estiver sob controle. Mas será uma cultura híbrida na qual um número significativo de pessoas trabalhará remotamente em qualquer dia e/ou em períodos alternados no escritório via desktops móveis, com flexibilidade de horários e escalas.
Um importante avanço cultural na estrutura de trabalho se dará também quando os funcionários que estiverem no escritório não sentirem mais, de forma errônea e presunçosa, que trabalham mais que seus colegas que por acaso estejam fora. A tecnologia de videoconferência remota vem sendo tão amplamente utilizada hoje em dia que acabou por tornar-se, em essência, um forte mecanismo de engajamento de oportunidades igualitárias.
Essa cultura, inclusive, já está em vigor em empresas internacionais cujas coberturas de negócios abrangem vários fusos horários, uma vez que o período de trabalho das 9h às 17 horas em Nova York é completamente diferente em Londres, Cingapura ou Mumbai. Outra mudança cultural virá com a compreensão do que é de fato o tempo de férias e o que não é. A onipresença dos serviços de Internet tornou o trabalho inevitável onde quer que se esteja. É uma realidade da qual não podemos escapar.
E embora possa-se optar por deixar o laptop desligado e passar tempo com a família, o fato é que a distância física do espaço de trabalho não serve mais como desculpa. Uma pessoa pode estar de férias do outro lado do mundo e ainda assim não deixar o trabalho para trás. Por outro lado, morar perto do escritório da empresa também não é mais um fator importante para a busca e a contratação de funcionários. Com a tecnologia remota é inteiramente possível para uma empresa do Vale do Silício encontrar profissionais talentosos na Coreia, Índia, Israel ou Finlândia – sem necessidade de mudar de casa, cidade ou país para exercer suas funções.
As pessoas podem, por exemplo, trabalhar de onde quer que estejam e só fazer visitas periódicas ao escritório. E apesar de a construção de conexões humanas entre colegas ainda ser alta prioridade, ela já não depende mais de co-localização.
Da mesma forma, trabalhar remotamente levanta algumas questões delicadas. Se, por exemplo, um profissional de uma empresa do Vale do Silício optar por viver em uma área mais acessível economicamente, como Utah, Iowa ou Louisiana, deverá receber os mesmos salários que seus colegas na Califórnia?
O que eu acho? Bem, o meu palpite é que muitas empresas começarão a ajustar os salários de acordo com os custos de vida locais. Além disso, desconfio que as grandes corporações em áreas de poder aquisitivo mais elevado acabarão por descobrir que o custo global de suas operações pode ser reduzido não apenas através da localização de salários, mas também com a abertura de operações via satélite em regiões menos onerosas.
Isso posto, embora a cultura do home office tenha provado ser particularmente eficiente e baseada em valores, vamos nos abster – ao menos por enquanto – de decretar a morte do ambiente tradicional de trabalho. A percepção quanto à necessidade de escritórios mudou, vem se ajustando e continuará a evoluir. A adequação à flexibilização e aos espaços híbridos de trabalho é inevitável.
No entanto, a necessidade humana de interação enquanto fonte de impulso, motivação e pulsão de vida sempre permanecerá, mesmo quando as pessoas forem capazes de trabalhar de forma eficiente a partir de qualquer lugar.
(*) – É CMO e EVP global de Marketing & Produtos da TeamViewer.