Juliana Garcia (*)
Embora a governança seja uma pauta que já se apresenta como norte para as mais diversas áreas de uma organização — tecnologia, setor financeiro e contábil, relacionamento com investidores — há alguns anos, parece razoável afirmar que essa demanda não fazia parte das rotinas de marketing e comunicação em suas perspectivas clássicas, sobretudo fora do mundo digital.
Sim, pois, por mais que a necessidade de transparência, responsabilidade profissional e atenção para o conteúdo das mensagens de uma marca fossem requisitos cumpridos por qualquer agência ou núcleo interno de especialistas éticos e comprometidos com a imagem de seus clientes, as diretrizes de governança.
Isso no sentido de como são aplicadas no mercado atual, isto é, visando a implementação de um conjunto de regras para direcionar o relacionamento de uma empresa com o Estado, stakeholders e consumidores — iam além do escopo das atividades de marketing e comunicação.
Mas os tempos são outros e a era dos dados caminha hoje com uma série de regulações — em especial, o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD), instituído na Europa em 2016; e a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), Lei Brasileira promulgada em 2018 — que visam proteger a privacidade, a autodeterminação informativa e os dados pessoais de cidadãos no ambiente online.
Dentro desse contexto, a governança de dados passa a não ser responsabilidade, tão somente, das áreas de TI, trazendo impactos para campanhas de marketing que precisam ser estruturadas segundo uma visão estratégica para a coleta e compartilhamento informacional, segundo diretrizes de conformidade/governança de conteúdo.
E, já de início, é importante acendermos um alerta: uma pesquisa da Resultados Digitais, de 2021, apontou que as empresas brasileiras estão atrasadas no processo de adequação a LGPD, com 69% das organizações ainda em estágio de construção ou sem iniciar uma política de proteção de dados de seus clientes. Qual o papel dos profissionais de marketing nesse cenário?
LGPD e a nova tríade das relações de consumo no ambiente digital – A grande questão colocada pela LGPD para o marketing e para a área de comunicação é: como obter dados dos meus clientes para estruturar as ações de posicionamento de uma marca, sem ferir os princípios de privacidade dos clientes? Ao mesmo tempo em que essa exigência pode parecer um desafio, é também positivo enxergar como a centralidade no consumidor chegou, de algum modo, ao ambiente legislativo e à própria internet.
Desafiante, mas não intransponível. Basicamente, o que os profissionais da área precisam se atentar envolve os princípios do consentimento, do legítimo interesse do consumidor e da exposição clara — via contratos, cookies e formulários — de como os dados do cliente serão utilizados.
Em outras palavras, estamos falando de um modelo de transparência mais objetivo, norteado pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que denota a necessidade de governança de conteúdo para a coleta, armazenamento, gestão e utilização dos dados de consumidores em campanhas de marketing. Quando há transparência e inteligência estratégica, a LGPD se coloca, na verdade, com um marco ético fundamental que orienta relações de consumo de maior empoderamento para os clientes.
O desenho de políticas de governança de conteúdo e marketing – Mas, para tanto, os profissionais de comunicação precisam avançar em ao menos três frentes decisivas:
- – Em um melhor entendimento e estudo das regulações europeia, americana e brasileira que orientam o ambiente de consumo digital contemporâneo. Só assim será possível determinar um uso assertivo dos dados de clientes e uma política de governança de conteúdo. Sobre esse ponto, uma pesquisa internacional indicou que, atualmente, cerca de 41% dos profissionais não entendem plenamente o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD);
- – Na construção de alternativas criativas – não apenas restritas aos cookies – que substituam ações de marketing invasivas, em prol de conteúdos que, de fato, despertem o interesse do lead em compartilhar seus dados;
- – Na acepção de que menos é mais. Além de ser um pré-requisito da Lei de Dados brasileira, a coleta do mínimo de dados necessário para as ações de marketing facilita a navegação e melhora a experiência de consumo dos leads. Evite formulários extensos e foque no essencial.
É importante, por fim, que os profissionais e agências de marketing e conteúdo especializadas assumam protagonismo no processo de adaptação a LGPD nas empresas em que atuam ou atendem. Desse modo, além de conquistarem mais relevância e importância estratégica na dinâmica das organizações, contribuirão para preservar uma relação positiva com os consumidores — elo final e mais importante de suas ações.
(*) – CEO da Ideacomm, comunicóloga, jornalista por formação e apaixonada pelo trabalho de mídia espontânea, atua como Public Relationsà frente da empresa (ideiacomm.com.br).