Carlos Eduardo Dumard de Mendonça (*)
O setor de óleo e gás (O&G) segue como um dos mais importantes na composição da economia nacional. A fatia do petróleo no PIB industrial corresponde a 15% do total, com tendência de crescimento até 2030. Em 2022, o país bateu recorde histórico de produção: pouco mais de 3 milhões de barris por dia, alta de 2,47% em relação a 2020. No gás natural, elevação de 2,98% sobre aquele mesmo ano, com 130 milhões de metros cúbicos.
O País é o nono maior produtor de petróleo, correspondendo a 3% do volume gerado no planeta, segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP). Os Estados Unidos lideram o ranking: 16,5 milhões em 2021, 18% do total. A estimativa da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), descrita no Plano Decenal de Expansão de Energia 2031, é de que a extração de óleo e gás no Brasil cresça pouco mais de 80% em seis anos, chegando a 5,2 milhões de barris diários em 2029.
O contexto torna evidente a relevância desta indústria para a economia mundial e brasileira – o que sinaliza, também, que a transição energética dos países ainda é um plano de médio e longo prazo, dada a dependência do setor. Assim, ao mesmo tempo que se torna urgente o alinhamento das companhias petrolíferas às pautas da agenda climática, sobretudo na questão das emissões de carbono, é igualmente importante para o equilíbrio econômico e disponibilidade energética global, o aprimoramento da performance produtiva, redução dos custos operacionais e a mitigação do impacto ambiental de toda a cadeia relacionada ao O&G.
Tecnologias para transformação do setor
Neste processo, empresas de O&G podem buscar na digitalização o melhor atalho para modernizar as suas operações, elevando a produtividade e a segurança em todos os níveis da cadeia, gerando caminhos mais sustentáveis de crescimento. Conheça alguns exemplos:
• Ecossistemas de IoT: têm sido usados para coletar dados em tempo real sobre toda a infraestrutura de produção e distribuição – desde plataformas de extração marinha e refinarias a extensas redes de tubulações e sistemas logísticos. O intuito é melhorar a eficiência operacional, cortando custos relacionados desnecessários, elevar a produtividade, diminuir o consumo de energia e, por fim, impulsionar a lucratividade das companhias.
• Computação de borda (edge computing): tem contribuído para agilizar o processamento de dados em zonas remotas, com restrição de conectividade. Já a adoção de drones e óculos de realidade aumentada são cada vez mais frequentes na inspeção de plataformas offshore e de estruturas de produção cujo alto risco de segurança torna o uso composto destes recursos um fator essencial.
• Inteligência artificial (IA): tem exercido um papel fundamental na transformação do setor. A relevância desta tecnologia tem sido cada vez mais percebida no setor. De acordo com levantamento da Ernest & Young (EY), 92% das companhias de O&G ao redor do mundo investem ou pretendem investir em IA no prazo de cinco anos. E, 50% dos executivos ouvidos no estudo, já estão usando essa tecnologia para resolver desafios em suas organizações.
Valor percebido
Para os consultores da McKinsey, um dos principais desafios para a aceleração digital do setor de O&G seria a dificuldade em tangibilizar – do ponto de visão e cultura – os investimentos feitos em tecnologias inovadoras e inteligentes. Isso acontece porque, para muitos executivos, como parte dos problemas detectados pelos modelos de IA, esses são sensíveis à atividade-fim, o que acaba por adiar as ações mais contundentes neste sentido. Outro ponto é a dificuldade dos projetos de IA conseguirem demonstrar o valor final de seus esforços.
Entretanto, nas estratégias mais bem-sucedidas, os benefícios financeiros são evidentes e mensuráveis. Ainda de acordo com a McKinsey, empresas atentas têm capturado um valor adicional de US$ 5 por barril de óleo, equivalente em razão do emprego de soluções IA-driven, tanto na fase de perfuração/extração, quando no gerenciamento de estoques e manutenção preditiva.
Polos petroquímicos, por exemplo, utilizam estes modelos para prever as melhores condições operacionais em tempo real, otimizando a produção. Com isso, há registros de aumento das margens de lucro entre dez e vinte centavos por barril. Neste ritmo, a aplicação de abordagens analíticas avançadas pode gerar até US$ 300 milhões em valor adicional para a empresa em apenas 18 meses.
Para a estratégia digital ter o seu valor percebido, como descrito acima, é fundamental a criação de um sistema para a rastreabilidade das ações.
Benefícios da inteligência artificial no setor
Como vimos, esta tecnologia tem papel importante na otimização da exploração e perfuração de poços, colaborando também na racionalização da produção e logística, gerenciamento de estoques, previsibilidade de cenários, entre outros. Neste sentido, podemos citar:
• Previsão de energia e supply: modelos de IA e análise de dados podem prever condições climáticas adversas que possam impactar na produção, determinando a melhor associação de fontes de energia – fóssil, biocombustível ou renovável – para evitar o desabastecimento;
• Previsão de demanda: análise da curva de demanda histórica e sobre eventuais alterações no cenário socioeconômico de regiões ou países ajudam a gerar insights valiosos para um gerenciamento mais efetivo dos estoques e o ritmo de produção;
• Antecipação de falha: modelos inteligentes aplicados a sistemas e componentes utilizados em plataformas de extração, por exemplo, monitoram a integridade operacional e antecipam problemas que possam acarretar na paralisação das atividades, contribuindo também na redução dos custos operacionais com manutenção pós-falha;
• Gerenciamento da demanda: ao analisar dados coletados sobre o padrão de consumo de empresas e cidades, é possível customizar a oferta do produto e gerenciar a sua distribuição, sem excessos ou desperdício;
• Otimização dos estoques: sistemas de AI permitem um gerenciamento eficaz da relação entre produção e armazenamento, garantindo fornecimento eficiente, sem perdas e com redução de custos;
• Precificação: modelos que atuam na avaliação da volatilidade dos mercados de energia a partir de dados históricos e tendências, contribuem para aperfeiçoar as estratégias comerciais – e aumentar o lucro – das companhias.
Foco ambiental
Os métodos digitais estão provando estar entre as formas mais poderosas e econômicas de reduzir a pegada de carbono da indústria também. Técnicas de otimização de rendimento, energia e produção em operações de produção e refino ajudam as empresas a maximizar sua produção para cada unidade de energia que consomem, o que permite aumentar a lucratividade e reduzir as emissões de carbono. Em paralelo, o processo de digitalização do O&G é essencial para o alinhamento do setor com as demandas da agenda climática global.
É grande a pressão mundial sobre as companhias petrolíferas para mitigarem os reflexos de suas atividades na natureza, buscando reduzir o risco de vazamentos, a perda de volumes provenientes da operação e um uso mais eficiente de recursos energéticos e naturais.
No relatório divulgado de maio deste ano, a Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês), aponta a necessidade do setor em cortar pela metade a intensidade das emissões até 2030.
A boa notícia, segundo a IEA, é que já existem tecnologias disponíveis e acessíveis para as empresas empreenderem uma real transformação sustentável de suas operações. As aplicações de IA são ilimitadas e vão além de tornar processos melhores ou mais rápidos, criando um novo horizonte de negócios na transformação do setor.
TI na retaguarda
Este novo impulso pela mudança trazido pelas recentes tecnologias disruptivas só será possível, contudo, se houver similaridade de investimentos em infraestrutura de processamento de dados. A digitalização das operações gera um imenso volume de dados, tornando necessário o uso de algoritmos desenvolvidos para solucionar problemas complexos, a fim de analisar o ecossistema de big data com maior agilidade e precisão.
O desempenho máximo dos sistemas de IA só pode ser alcançado com o suporte de uma TI completa, de várias camadas, incluindo aprendizado de máquina, linguagens de programação, nuvem, ferramentas de processamento de dados e data centers robustos, modernos e energeticamente eficientes. Todo este arcabouço tecnológico também precisa ser de baixo impacto de carbono. Alinhadas todas as disciplinas e garantida a alta disponibilidade do centro de dados, a IA revela-se uma ferramenta estratégica inestimável para a criação de um contexto mais favorável para a transição energética do planeta.
(*) É gerente de soluções da green4T.