Marilyn Hahn (*)
Das 423 companhias listadas atualmente na B3, cerca de 60% não têm nenhuma mulher entre seus diretores estatutários e 37% não conta com nenhuma mulher em seu conselho de administração. Ainda não há dados sobre raça e etnia, mas um levantamento feito com 73 companhias mostrou que 79% delas responderam ter até 11% de pessoas negras em cargos de diretoria.
A pauta de equidade de gênero parece estar acelerada, mas apesar de toda a discussão, os números no Brasil ainda são bastante tímidos e que não parecem alcançar o atraso das últimas décadas.
Veja alguns dados atuais:
De acordo com o relatório Women in Business 2023, da consultoria Grant Thornton International, que avalia os avanços da equidade de gênero em posições de liderança, apenas 32,4% dos cargos de alta gerência são ocupados por mulheres. O dado mostra um aumento sutil de 0,5 ponto percentual em comparação a 2022 e apenas 13 pontos percentuais desde a primeira edição da pesquisa, em 2004. Em contrapartida, 9% dessas organizações ainda não possuem mulheres em cargos de liderança sênior. Nesse ritmo, apenas 34% dos cargos de liderança serão ocupados por mulheres em 2025. O dado vai ao encontro da estimativa de 131 anos para alcançarmos a equidade de gênero, segundo o Fórum Econômico Mundial.
A diversidade é crucial para qualquer empresa. Ela traz profundidade à discussão dos temas, experiências, perspectivas, promove ainda a inovação e implica uma melhor compreensão dos colaboradores e claro, dos clientes da companhia.
De acordo com estudo publicado pela Forbes, times diversos entregam 60% mais resultados, tomam melhores decisões em 87% dos casos e são duas vezes mais rápidos em fechar pautas críticas dentro do negócio. Além disso, um ambiente de trabalho saudável e democrático também faz com que os colaboradores se sintam mais confortáveis e engajados, com melhor produtividade e senso criativo. Segundo a Deloitte, os funcionários que sentem que sua empresa apoia a diversidade e se sentem incluídos relatam um aumento em sua capacidade de inovar em até 83%.
Outro fator é que um time diverso traz para a mesa uma série de skills, experiências e perspectivas que tornam a discussão mais rica, analisando distintos pontos de vista. Principalmente quando se diz respeito à camadas estratégicas da companhia, como por exemplo os C-levels e o Conselho de Administração, conversas mais plurais são cruciais para a sustentabilidade do negócio.
Por fim, diversidade não beneficia apenas os funcionários, mas também os clientes. De acordo com o LinkedIn, 49% das empresas acreditam que é importante que a diversidade faça parte da cultura, pois permite que elas entendam e representem melhor seus clientes. Como tal, as empresas devem se esforçar para construir uma força de trabalho que espelhe o perfil diversificado de sua base de clientes.
Demonstrar fortes valores e promover iniciativas positivas em torno da diversidade, equidade e inclusão também pode ter um impacto positivo na forma como os clientes interagem com uma empresa. A Deloitte descobriu que até 50% das decisões de compra dos clientes são influenciadas pelo apoio de uma organização à igualdade. Diversas empresas têm a capacidade de construir relacionamentos mais autênticos com os clientes, o que pode ter um impacto positivo nas vendas e na receita.
Com tantos números na mesa, por que não conseguimos avançar no tema?
Porque há ainda uma grande distância entre o momento que estamos, de conscientização e sensibilização do tema e o devido estabelecimento de metas claras, compromisso público e o acompanhamento de indicadores próprios para o tema.
Iniciativas estruturais são importantes e necessárias
Para avanços mais rápidos, significativos e sistêmicos, o caminho é claro: através de diretrizes, políticas e regulamentações das instituições e órgãos do ecossistema. Porém, elas precisam ser estratégicas e conversar com o mercado, abraçar as lideranças e fazer parte da jornada da empresa e da sociedade como um todo.
Neste ano de 2023, pudemos ver inciativas importantes nesse sentido, a começar pela da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que aprovou o Anexo ASG, documento com as medidas propostas pela B3 para estimular a diversidade de gênero e a presença de grupos subrepresentados em cargos de alta liderança e o reporte de boas práticas ambientais, sociais e de governança pelas companhias listadas.
A B3 propõe o mecanismo de “pratique ou explique”, ou seja, as empresas listadas precisam dar transparência ao mercado em relação as ações que adotam para buscar a equidade ou explicar os motivos pelos quais não estão adotando as diretrizes do órgão. O texto também menciona a inclusão de indicadores de desempenho ligados e metas ESG.
Outra novidade, que impacta não apenas a população executiva, mas todas as mulheres no mercado de trabalho, foi a sanção da lei que determina igualdade salarial entre homens e mulheres. A lei prevê não apenas o pagamento das diferenças salariais devidas, mas também multas administrativas relevantes para empresas que não cumprirem as diretrizes. Além disso, a nova lei também obriga empresas com mais de 100 funcionários a publicarem relatórios semestrais com dados salariais (de forma anônima) para comparação objetiva entre homens e mulheres.
Parece que o discurso começa a sair do papel, porém ainda há a preocupação do seu alcance, efetividade e engajamento. Cada iniciativa importa, mesmo não sendo na velocidade necessária, mas é primordial que sejam estabelecidas metas globais e sinérgicas entre os agentes de mercado, empresas, órgãos públicos, entre outros. O desafio agora é colocar cada plano em ação para, talvez, encurtar o tempo de colher os frutos.
(*) É CRO e cofundadora do Bankly.