Heródoto Barbeiro (*)
Deputados e senadores estão de olho no orçamento federal. A arrecadação de impostos é para custear todos os gastos governamentais, sejam de interesse público ou particular.
Políticos, por tradição histórica, são zelosos pela manutenção do patriarcalismo, ou seja, misturar o interesse público com o privado. Entenda-se gastar o dinheiro dos impostos em obras e contratações políticas que colaboram para que verdadeiras dinastias se perpetuem no poder.
Gerações políticas passam o poder e o cargo para seus familiares e não raramente ocupam postos públicos simultaneamente. Um dos exemplos mais comuns é o senador ter como suplente o próprio filho. O sobrenome é familiar desde a Câmara Municipal da cidade até os mais importantes postos de Brasília e está espalhado pelos três poderes. Nem o Judiciário escapa.
O sistema desenvolve uma máquina fiscalizadora gerida pelos membros da mesma oligarquia política. Assim, tribunais que deveriam fiscalizar para que a corrupção não se torne endêmica, são lenientes. Afinal, repete-se, em pleno mundo contemporâneo, o princípio consagrado na Idade Média europeia da suserania e vassalagem. Em vez de troca de feudos pela submissão, atualmente trocam-se cargos em Brasília. A fidelidade é um atributo essencial para se manter o patriarcalismo, e para sua sobrevivência há até desculpas de comungar da mesma ideologia ou programa político.
O que vale mesmo é manter a máquina se renovando como um verdadeiro moto-contínuo de privilégios. Pouco podem fazer os eleitores. Não são capazes de entender o jogo político, o que está em disputa, devido à baixa escolaridade de cidadania. O voto é obrigatório e, para não pagar multa, é melhor ir lá e votar no indicado pela oligarquia local, regional ou federal. Tem até mesmo transporte gratuito para a seção eleitoral, assim ninguém pode deixar de “cumprir o seu dever cívico”. No modelo democrático brasileiro, tem voto, eleição, urna, campanha eleitoral. Só falta renovação. E esta só é possível com o desenvolvimento de educação política e cidadã nas escolas.
Há quem não se conforme somente com o patriarcalismo, os privilégios e o controle da máquina. Querem dinheiro. Quem quer dinheiro?, pergunta um filósofo popular. A manipulação do orçamento pode ser mais uma brecha para a corrupção. Tudo está em seu lugar, graças a Deus, canta o poeta popular. Até o assessor da Comissão do Orçamento, José Carlos Alves dos Santos, acusado de assassinar a própria mulher, resolve abrir a boca.
Conta que há um esquema de corrupção comandado pelo deputado baiano, José Alves, flagrado com um enriquecimento fantástico. Ele se defende e diz que ganhou 56 vezes na loteria só em 1993. A soma corrigida é de aproximadamente R$ 100 milhões. Uma CPI é instalada e uma corriola tenta escapar, uns acusando os outros. O escândalo toma conta do país. Alguém deu um pontapé no biombo e viu-se que atrás dele havia um autêntico bacanal. É um corre-corre. Há uma enxurrada de narrativas para livrar os caciques mais conhecidos e suspeitos, como o oligarca e senador Edson Lobão e até o governador de Brasília, Joaquim Roriz. Sobra para o baixo clero, os deputados mais frágeis que têm o mandato cassado. Alguns conseguiram escapar e voltar à política, eleitos democraticamente.
Um dos anões do orçamento voltou ao noticiário quando foi encontrado no apartamento dele, em Salvador, R$ 51 milhões espalhados no chão. É o ex-ministro Gedel Vieira Lima.
(*) – É âncora do Jornal Nova Brasil e colunista do R7, apresentou o Roda Viva na TV Cultura, Jornal da CBN e Podcast NEH. Tem livros nas áreas de Jornalismo, História. Mídia Training e Budismo www.herodoto.com.br.