Heródoto Barbeiro (*)
O sonho das classes privilegiadas é viajar confortavelmente.
Para isso não economizam para comprar uma passagem em um convés privilegiado do maior transatlântico do mundo. O preço das cabines no novíssimo navio varia de acordo com a colocação a bordo. As externas são mais caras do que as internas. Há cabines luxuosas que custam duas ou três vezes mais do que a média de preço a bordo, mas são mais confortáveis que qualquer outra na embarcação.
A primeira classe inclui ginásio, com equipamentos modernos, quadra de squash, sala de fumar com pinturas de Norman Wilkinson e lareira. Tem dois restaurantes à la carte, dois cafés decorados com palmeiras, piscina coberta e sauna. A sala de leitura tem mobílias de mogno e vitrais. As cabines têm chuveiros.
Antes da partida para sua viagem inaugural, o navio recebe uma enxurrada de convidados, jornalistas, agentes de viagens e curiosos de maneira geral. Afinal, o investimento é grande e a empresa proprietária do barco quer garantir o retorno para os acionistas que investiram em um negócio seguro. A tecnologia usada é a mais avançada da construção naval, a rota marítima é conhecida e não há nenhuma ameaça que possa empanar a viagem inaugural. Os construtores garantem que nenhum outro barco possui tecnologia semelhante, que garante também velocidade no mar e o menor balanço possível nas ondas.
Um orgulho da engenharia europeia e, principalmente, britânica. O sucesso do empreendimento transparece na quantidade de reportagens e fotos do gigante dos mares e na procura para a compra dos lugares mais privilegiados da embarcação. Participar dessa viagem é garantir aparecer em fotos e reportagens sobre estilo de vida e ganhar visibilidade no high society de seus países.
O maior navio de passageiros do mundo está pronto para zarpar. Ele foi projetado para ser o navio mais luxuoso e seguro dos mares. A viagem inaugural é através do oceano Atlântico com chegada ao porto de Nova York. O lançamento do barco foi um acontecimento marcante, com mais de cem mil pessoas, como funcionários do estaleiro e suas famílias, visitantes, jornalistas, políticos de vários partidos e habitantes da cidade de Belfast.
O tradicional estouro do champanhe no casco não ocorre e isto provoca entre os tripulantes a sensação de que alguma coisa não irá bem na viagem inaugural. Afinal, o mar está povoado de superstições. O embarque de passageiros é um verdadeiro desfile de ricaços vestidos com suas melhores roupas e as mulheres ostentando as marcas da moda.
Mais de dois mil e quatrocentos passageiros se ajeitam a bordo sob os cuidados de uma tripulação de 896 pessoas. Há três classes e, com isso, os mais ricos não se misturam com os mais pobres que querem mudar de país e não passear em um cruzeiro no mar. Artistas, garçons, mâitres e serviçais de toda ordem a postos para atender a fina flor viajante.
O Titanic parte de Southampton em abril de 1912 com grande festa. Mas no meio do caminho tinha um iceberg, tinha um iceberg no meio do caminho.
(*) É jornalista do Record News, R7 e Nova Brasil (89.7), além de autor de vários livros de sucesso, tanto destinados ao ensino de História, como para as áreas de jornalismo, mídia training e budismo.