Glauco Humai (*)
Em momentos de crises é natural tentar encontrar culpados. Por vezes, a culpa recaí em quem está mais exposto ou próximo e não no verdadeiro responsável.
A caça aos culpados, em geral, se transforma em um processo danoso, um artifício que, muitas vezes, é estrategicamente preparado para desvio do foco, expondo falsos vilões e sem a análise de todo o cenário. Essa dinâmica consiste em pegar o “problema” e jogá-lo no “colo” do personagem mais conhecido ou exposto. A contrariedade é que nesse método elimina-se a apuração sobre as reais causas da situação enfrentada, criando um círculo vicioso até a próxima crise.
No Brasil, seja no ambiente corporativo, político ou pessoal, esse modelo está muito presente e vai das discussões sobre o culpado pelo pênalti perdido em uma partida de futebol aos debates macroeconômicos, como, por exemplo, a análise do efeito do IGP-M sobre os aluguéis. O IGP-M, vez ou outra vem à tona, e esse assunto precisa ser esclarecido. Vamos aos pontos:
A indexação econômica no Brasil é uma forma de minimizar danos financeiros em momentos de inflação e seu debate é importante, ainda mais quando se trata dos preços de aluguéis. O problema é quando opera-se com covardia e iminente má fé, disseminando a ideia de que as redes de shopping centers têm culpa em usar o IGP-M no reajuste de aluguéis, quando a maioria dos empreendimentos segue apenas o que foi acordado com seus parceiros.
Mais grave são as táticas de linchamento usadas ao colocar na administração de shoppings a culpa pelo aumento nos custos dos alugueis das lojas. Seria o mesmo que colocar no frentista de postos de combustíveis o dolo pelo aumento no preço da gasolina. O cerne da questão a ser enfrentado não é o fato de os shoppings usarem o IGP-M nos reajustes de alugueis e sim as contradições econômicas que fazem com que a inflação no Brasil galope de tempos em tempos e tais solavancos sejam sentidos em quaisquer índices inflacionários.
Também se faz necessário entender que o IGP-M não é um índice exclusivo para os shopping centers e é utilizado no reajuste de alugueis em todo o Brasil; seja para um idoso que decidiu alugar um cômodo ou em grandes centros comerciais, incluindo aí os shopping centers. E o pior: um indicador vulnerável a variações cambiais e em preços de commodities.
Portanto, determinar como vilania a administração de centros comerciais ao não abdicar desse índice em reajustes de contratos firmados, em grande parte dos casos há anos, é desonestidade intelectual. Um debate vil que ocorre em um momento em que muitos shoppings se solidarizam com as dificuldades de seus lojistas e negociam, muitas vezes, reajustes abaixo do IGP-M ou buscam outros indexadores.
É fato a disparidade entre alguns indicadores econômicos, em especial a distância que separa a inflação oficial do IPCA do IGP-M, mas também é necessário salientar que o IPCA é um indicador que vem de um órgão estatal, tem uma metodologia diferente e pode sofrer pressões políticas, um caminho inverso ao do IGP-M.
A Abrasce defende uma economia cada vez mais livre e para tanto é necessário respeitar a liberdade que cada empresário do setor tem para negociar os termos dos reajustes de seus aluguéis e o foro das partes envolvidas é a liberdade contratual de cada uma delas.
Tentar regular de cima pra baixo as negociações entre locatórios e shoppings, muitas vezes apelando para medidas populistas, coloca em risco futuros investimentos e gera uma instabilidade jurídica desnecessária para o varejo brasileiro em um momento em que busca-se recuperar o setor.
(*) – É Presidente da Abrasce – Associação Brasileira de Shopping Centers.