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Os incentivos fiscais à saúde – Comemoração ou Luto

em Artigos
segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

Linamara Rizzo Battistella (*) e Fábio de Sá Cesnik (**)

No dia 13 de dezembro completou 10 anos da homologação pela Assembleia da ONU da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

O Brasil é signatário da referida convenção, que representa, no plano internacional, um esforço para que os Estados assegurem os direitos fundamentais das pessoas com deficiência. Seria motivo de comemoração, não tivessem ainda algumas políticas públicas, nessa área, carecendo de gestores livres de preconceitos e atitudes discriminatórias. Para alcançar o Direito de Todos os Humanos alguns cuidados se revestem de maior importância e alguns sinais fazem soar o alerta da inequidade.

Os incentivos fiscais criados pela Lei Federal 12.715, de 2012, significam fortalecimento dos Direitos e mais oportunidades para os projetos relacionados às pessoas com deficiência (Pronas) e também ao tema da oncologia (Pronon). Tais incentivos são controlados pelo Ministério da Saúde (MS) e seu funcionamento é inspirado em incentivos de outras áreas (cultura e esporte são dois grandes exemplos). A partir desses incentivos a área de saúde pode aprovar projetos que permitem as pessoas jurídicas ou físicas destinarem 1% do seu imposto de renda devido para projetos aprovados no Pronas e mais 1% para projetos destinados para o Pronon.

A lei que os institui estabelece os percentuais genéricos (1% aplicado sobre o imposto devido por cada empresa ou individuo) e a Proposta de Lei Orçamentária (PLOA) de cada ano estatui, com base na estimativa do valor a pagar ao Fisco por empresas e pessoas físicas brasileiras, o volume estimado de captação, que usualmente teve uma previsão bastante realista na legislação.

O problema reside no fato de que, em que pese a forte demanda por projetos nessa área, que não conseguem ser atendidos, o MS, tem por iniciativa própria, limitado um teto anual de valores, reduzindo a cada ano o montante total disponibilizado e os projetos atendidos. Para se ter uma ideia o limite estimado para o Pronas era de, aproximadamente, R$ 674 milhões em 2014, R$ 173 milhões em 2015, reduzido, no final do mesmo exercício, para R$ 90 milhões e, no último ato caiu a ínfimos R$ 14 milhões em 2016, uma redução de 98% entre 2014 e 2016. Mais grave que isso, a Portaria 2671 do MS, publicada em 07 de dezembro último, sugere a excepcional prorrogação de projetos do ano passado, sem abrir espaço para novas iniciativas, que deveriam ser examinadas esse ano e que o setor inevitavelmente carece.

Ao contrário do MS, o Ministério da Cultura não limita o volume de projetos aprovados anualmente, nem tampouco o Ministério do Esporte. Neste momento, na Cultura, há mais de 5 bilhões em projetos autorizados aguardando a captação de recursos, deixando que as empresas escolham as iniciativas adequadas. O mesmo ocorre no Esporte, sem qualquer dificuldade. Somente na Saúde que os incentivos ficarão perto de zero nesse ano de 2016, onde não terão projetos novos autorizados e numa drástica redução de limite orçamentário. Tudo isso por uma limitação que o próprio MS nos impõe, esquecido que os valores orçamentários para os próximos anos serão fatalmente insuficientes, para o atendimento de 45 milhões de brasileiros que vivem com algum tipo de deficiência.

Na contramão da gestão dos demais incentivos federais, o Ministério da Saúde adota medidas que rebaixam os incentivos as pessoas com deficiência e com câncer a patamares cruéis. Lamenta-se que o guardião do Sistema Único de Saúde espelhe em suas decisões o preconceito e a indiferença que milhões de brasileiros lutam para não mais existir.

No mês que deveríamos comemorar os 10 anos da Convenção da ONU, não é esse presente que as pessoas com deficiência merecem, muito pelo contrário. Precisávamos sim de ações muito mais firmes e inclusivas para esse público merecedor, como todos os cidadãos, da presença e do olhar do Poder Público no seu dia a dia.

(*) – É médica Fisiatra, professora titular da Faculdade de Medicina da USP e Secretária de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência no Estado.

(**) – É advogado sócio do escritório Cesnik, Quintino e Salinas Advogados, autor do livro “Guia de Incentivo à Cultura” e presidente da Comissão de Estudos de Mídia e Entretenimento do Instituto dos Advogados de São Paulo.