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O que podemos esperar do Real Digital?

em Artigos
segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Luiz Octávio Gonçalves Neto (*)

O Real Digital vai ser a primeira moeda virtual oficial do Brasil. O Banco Central anunciou a sua Moeda Digital, a Central Bank Digital Currency (CBDC, na sigla em inglês), uma moeda alternativa, mas com o mesmo valor do dinheiro tradicional que o brasileiro leva na carteira. A diferença entre a moeda atual e a digital é que essa nova moeda não poderá ser convertida em cédulas. O cidadão vai receber códigos gerados pelo BC indicando seus valores.

A fase de testes teve início no primeiro semestre de 2023, com dez participantes, e tem previsão de ser lançado ainda durante 2024. Apesar de ser digital, vale ressaltar que não se trata de uma criptomoeda. As cripto são privadas, têm características de investimentos e não são reguladas pelo BC. A intenção do governo é que o Real Digital seja incorporado no dia a dia do brasileiro, podendo ser usado em pagamentos, compras, transações e investimentos.

Por viver o universo das moedas digitais diariamente, tenho acompanhado de perto esse processo e avaliando o impacto do Real Digital na Web3, as inovações que ele traz e como isso coloca Brasil em liderança global.

Com os testes, o BC quer analisar as capacidades de privacidade, “programabilidade” e infraestrutura deste novo ecossistema, um simulacro que testará emissão, resgate, transferência e fluxos financeiros nos seguintes arranjos: Real Digital (CBDC), Real Digital depósitos à vista, Real Digital moeda eletrônica e compra e venda de Títulos Públicos Federais.

Além do Banco Central, participam também da etapa piloto, o Tesouro Nacional, a CVM e outros reguladores. Pelo lado da indústria, podem participar instituições reguladas como: bancos; cooperativas; fintechs de crédito; bancos de investimentos, instituições de pagamentos (bandeiras e adquirentes); e operadores de infraestrutura do mercado financeiro.

A moeda digital brasileira ficará custodiada junto ao BC e aos bancos e a população terá acesso a um real tokenizado em blockchain, que será compatível com a ethereum (plataforma descentralizada capaz de executar contratos inteligentes e aplicações descentralizadas). Neste cenário, podemos identificar questões muito positivas de unificar todas as possibilidades da blockchain à moeda de um país, como diminuição do custo de transação, capacidade de transparência e de usar a moeda em contratos autônomos dentro da blockchain.

Isso vai trazer mais possibilidades e complexidade para o sistema financeiro brasileiro, além de outros pontos positivos que se podem associar à identidade digital, por exemplo. O BC também tem a expectativa de que o Real Digital iniba a lavagem de dinheiro, além de estimular a inovação e a concorrência no ambiente virtual. Uma ressalva é que a moeda em blockchain controlada pelo estado tem a possibilidade de desandar para um cenário distópico.

Assim, pode ocorrer de o governo conseguir criar restrições do dinheiro e níveis de camadas de restrição à liberdade do indivíduo, isso falando tanto de informação, quanto de circulação e livre gasto de dinheiro, usando essa tecnologia. Por outro lado, pode ser usado para o bem e evolução da economia, abertura da economia e possibilidades financeiras gerais que já citei.

Mesmo que ainda tenhamos um caminho a percorrer e entender como seguirá o projeto e seus testes, foi um passo bem audacioso do governo brasileiro, que está bem respaldado em relação à estrutura e tecnicamente por uma série de empresas relevantes, mas é essencial ficar atento em como o governo vai lidar em relação à liberdade individual da população. Ainda assim, é empolgante ver o Brasil como catalisador e à frente dessas inovações no mundo.

De acordo com o Banco de Compensações Internacionais (BIS), mais de 80% dos bancos centrais do mundo estão desenvolvendo moedas digitais. Em outubro de 2020, as Bahamas foram o primeiro país a lançar uma CBDC, o dólar de areia. Outros exemplos de países que também já usam moeda digital são os Estados Unidos, Japão e China.

(*) – É CEO e fundador da DUX, maior startup de Web3 da América Latina.