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Disciplina societária da COVID-19

em Artigos
segunda-feira, 27 de abril de 2020

Elisa Junqueira Figueiredo (*) e Carolina Blanco Pirani Fiorin (**)

No dia 30 de março de 2020, foi publicada, em edição extra do Diário Oficial da União, uma Medida Provisória (MP), que confere mais tempo para as empresas realizarem suas Assembleias Gerais Ordinárias (AGO). Ainda, em 03 de abril de 2020, foi aprovado pelo Senado o Projeto de Lei n° 1179/20_ (“PL”), que trata, entre outras previsões emergenciais e transitórias, em razão da pandemia, também, de alguns aspectos societários. Ainda não terminou a tramitação do PL, mas o mercado já está atento às suas previsões, que serão brevemente abordadas aqui, embora ainda não sejam cogentes.

De acordo com a Lei das Sociedades Anônimas, as sociedades devem realizar nos quatro primeiros meses seguintes ao fim de seu exercício social, uma AGO para tomar a conta de seus administradores, deliberar sobre o lucro líquido e dividendos, eleger seus administradores e aprovar a correção monetária do capital social. Disposição semelhante existe no Código Civil sobre sociedades limitadas e outros tipos societários. Porém, tendo em vista o cenário que estamos vivendo, seria inconcebível realizar as assembleias presenciais, pois, para tanto, seria necessária a reunião dos acionistas e pessoal, sendo contrário ao recomendado pela Organização Mundial da Saúde e Ministério da Saúde do Brasil, em razão da pandemia ocasionada pela covid-19.

Haja vista o descrito acima, a MP n° 931 vem com o objetivo de ajudar as empresas a continuarem operando nesse novo cenário, sem que se prejudiquem, inclusive diante do vencimento do mandato de administradores ou contas de administradores não tomadas. Pela MP, as sociedades anônimas – S.A. têm agora sete meses para realizarem suas AGO, contadas do fim do seu exercício social, ficando prorrogados os mandatos dos administradores, membros do conselho fiscal e comitês estatuários até então.

Importante salientar que a MP determina que, até que a AGO seja realizada, poderá o conselho de administração ou a diretoria deliberar acerca da declaração dos dividendos, independentemente do que está disposto no estatuto social.

A MP também aborda tal questão quanto às sociedades limitadas (LTDA.), ao possibilitar que a assembleia (ou reunião) dos sócios possa se realizar no prazo de sete meses, seguintes ao fim de seu exercício social. Tal como ocorre com as S.A., os mandatos de seus administradores, da mesma forma, serão prorrogados até a realização da mencionada reunião. Neste ponto, ressaltamos a fundamental relevância dessa reunião de sócios para a aprovação do balanço patrimonial do ano anterior – no caso, 2019 –, para a deliberação sobre dividendos e para o compartilhamento da responsabilidade pelos números da pessoa jurídica dos administradores com os sócios. Os administradores de S.A. estão mais acostumados à realização das AGO, mas o assunto é, também, relevante quando se trata de uma LTDA.

O mesmo prazo concedido para as S.A. e LTDA. foi concedido às cooperativas; tal como naquelas, foi prorrogado o prazo do mandato dos órgãos de administração e de fiscalização.

O PL traz condições semelhantes, embora com prazos distintos, propondo que o prazo para a realização das AGO ou reuniões de sócios, seja prorrogado até 30 de outubro de 2020. Além disso, abrange tanto as sociedades mencionadas na MP, como também as associações e fundações.

Ressaltamos, ainda, que existe, também, a possibilidade de companhias abertas e fechadas, bem como as sociedades limitadas e cooperativas, realizarem a assembleia geral à distância, na qual o acionista poderá participar e votar eletronicamente, a depender de regulamentação pelos órgãos responsáveis. Para as companhias abertas a realização da assembleia geral a distância depende de autorização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O PL aborda, também, tal possibilidade, em todos os tipos societários nele tratados, determinando que devem seguir as restrições à realização das reuniões e assembleias presenciais, inclusive possibilitando que estas sejam realizadas por meio eletrônico.

Por fim, lembramos que, por se tratar de uma medida provisória é importante ter em mente, que ela terá vigor pelo prazo de cento e vinte dias, contados de sua publicação, sendo necessária a aprovação por uma comissão mista de deputados e senadores, para posterior referendo pelos plenários da Câmara dos Deputados e Senado Federal. Neste caso em tela, entretanto, a MP tem validade além da prorrogação do prazo das assembleias e reuniões de sócios. O PL, por sua vez, nem em vigor está, mas vale estar ciente do que vem sendo discutido.

(*) – Sócia fundadora do FF Advogados, responsável pelas áreas de Direito privado com foco em contratos, contencioso cível, arbitragem, imobiliário, família e sucessões ([email protected]); (**) – advogada do FF Advogados, atua nas áreas de Direito societário, mercado de capitais e governança corporativa ([email protected])