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Do tradicional ao inovador: A reinvenção da Ambev como uma plataforma de negócios

em Artigos
terça-feira, 15 de agosto de 2023

Sandro Magaldi (*)

Ano passado, o presidente da Ambev (ABEV3), Jean Jereisatti, causou impacto no mercado corporativo ao declarar que ser apenas uma empresa de bebidas não definiria mais a empresa. A maior cervejaria da América Latina se posiciona, a partir de então, como uma plataforma de marcas.

Esse movimento compreende uma ambiciosa escolha estratégica que vai além de uma declaração oficial ao mercado. Tradicionalmente, a empresa evoluiu dominando sua cadeia de valor por meio de movimentos que visavam garantir a propriedade dos recursos estratégicos para seu negócio. Foco total no core business da empresa sempre foi um mantra seguido disciplinadamente pela companhia.

Tudo ia muito bem e a organização cresceu vigorosamente ao longo de décadas. Essa expansão, no entanto, foi colocada em xeque quando a ascensão tecnológica trouxe novas perspectivas para companhias que entenderam a oportunidade de capturar valor em todo seu ecossistema e não apenas na relação transacional de sua cadeia de valor. Subitamente, a Ambev, que era uma das “queridinhas” mais valiosas do mercado, começou a ter seu valor questionado.

Foi necessário uma mudança importante na liderança da organização, sua cultura e sistema organizacional para que uma nova perspectiva estratégica fosse construída visando reposicionar a empresa que, ao migrar para o modelo de plataforma, se transforma na protagonista de seu ecossistema.
Esse novo posicionamento tem sido traduzido em novos negócios inovadores como o Zé Delivery, o Bees Bank (sua Fintech) e o Bees, seu marketplace de produtos para bares e restaurantes.

Esse último, lançado em 2019, já demostra seu potencial. Atualmente, a plataforma conta com mais de 400 itens disponíveis que vão muito além da cerveja comercializando chocolate, salgadinho, bebida de outras marcas e um portfólio robusto de ofertas que gerou, em 2022, uma receita bruta de R$ 1.3 bilhão em um movimento que só cresce com novos potenciais negócios como o que foi divulgado recentemente.

O Grupo Pão Açucar (GPA) formalizou uma parceria para disponibilizar seu portfólio de produtos na plataforma. A empresa de varejo está de olho nos mais de 1 milhão de pontos de vendas atingidos pelo Bees (os bares e restaurantes que são clientes tradicionais da Ambev) que não consegue impactar com seu modelo de negócios atual.

Esse movimento, que mostra o potencial da geração de valor de uma plataforma, também representa uma quebra de paradigmas incrível para o segmento. Tradicionalmente, o GPA é um dos principais canais de vendas para a Ambev em um relacionamento que sempre foi complexo em intermináveis negociações comerciais. A partir do momento que a Ambev estrutura um novo negócio se valendo de sua capilaridade, uma fortaleza singular, ela se transforma em canal de vendas para seu antigo canal.

Com essa perspectiva, além de gerar um novo fluxo de receitas para a empresa, a Ambev demostra um dos valores centrais dessa estratégia: a organização muda seu posicionamento na cadeia de valor ao se consolidar como uma protagonista em seu ecossistema o que lhe permite capturar mais valor em seus relacionamentos indo além das transações mercantis.

É evidente que existe uma série de desdobramentos e desafios para transformar esse novo negócio em uma realidade tão robusta quanto o projeto tradicional, no entanto, é imperativo inserir nas análises de sustentabilidade e valor futuro de uma companhia o potencial derivado de iniciativas inovadoras como essa que vão além do modelo tradicional que o mercado e investidores se habituaram.

Nesse caso, é necessário ter em mente que a maioria das maiores empresas em valor do mercado do mundo atualmente são plataformas que têm conseguido maximizar a captura de valor em seus ecossistemas transformando esse valor em dividendos.

Será que a Ambev vai ser capaz de trilhar o mesmo caminho?

(*) É especialista em transformação de negócios.