Gustavo Bertotti (*)
A contração atual é a maior desde a grande depressão da década de 30.
O estudo Situação Econômica Mundial e Perspectivas das Nações Unidas, divulgado no mês passado pela ONU, oferece um panorama bastante realista do cenário corrosivo provocado pela Covid-19. São informações consistentes, que reforçam a necessidade de os países tentarem manter vivos os setores de atividade e empregos, sem comprometer a prioridade da vida, e de as pessoas serem cometidas em seus gastos e buscarem investimentos em ativos seguros, como dólar e ouro.
Segundo o relatório, a economia global deverá perder 8,5 trilhões de dólares em produção nos próximos dois anos, anulando-se praticamente todos os ganhos dos quatro exercícios anteriores. A contração atual é a maior desde a grande depressão da década de 30 do século passado e mais grave do que a crise do subprime, desencadeada em 2007 nos Estados Unidos.
Estima-se que, somente este ano, ocorra queda média de 5% do PIB das nações desenvolvidas, número parecido, aliás, com a nova previsão do governo brasileiro para o recuo de nosso Produto Interno Bruto. Em 2021, o crescimento mundial projetado é de 3,4%. O comércio internacional diminuirá 15% em 2020, pois quase 90% da economia do Planeta estão sob algum tipo de bloqueio total ou confinamento, interrompendo as cadeias de suprimentos, deprimindo a demanda dos consumidores e deixando milhões de pessoas desempregadas.
Um dos mais graves indicadores apontados pelo novo relatório da ONU é o fato de a pandemia estar aumentando a exclusão e a desigualdade. Cerca de 34,3 milhões de pessoas desabarão para baixo da linha de extrema pobreza em 2020, com 56% desse flagelo social ocorrendo nos países africanos. Outras 130 milhões correm o risco de também se somarem a esse contingente.
Se tal quadro não for revertido, será um grande retrocesso nos esforços globais para erradicar a miséria e a fome, um dos principais desafios dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – Agenda 2030 da ONU.
Diante da presente crise, numerosos governos instituíram medidas de estímulo fiscal, equivalentes a cerca de 10% do PIB, para combater a pandemia e minimizar seus impactos nos meios de subsistência, acentua o relatório.
Porém, a maioria das economias em desenvolvimento, já sobrecarregadas com déficits crônicos e níveis altos de dívida pública, como o Brasil, enfrenta dificuldades para adotar medidas eficazes. Nestes, as ações contingenciais, em média, representam menos de 1% do PIB. Não se contesta o aumento dos gastos ante a situação de calamidade, mas se sabe que o restabelecimento do equilíbrio das contas públicos é muito complexo.
Abordando o gravíssimo cenário mundial apontado pelo estudo, Elliott Harris, economista-chefe da ONU e secretário-geral-adjunto de Desenvolvimento Econômico, fez uma análise bastante lúcida: “O ritmo e a força da recuperação da crise não dependem apenas da eficácia das medidas de saúde pública na redução da propagação do vírus, mas também da capacidade dos países de proteger empregos e rendas”, destacou.
No Brasil, outro problema além do vírus, é o risco político, que vem se acentuando muito nesses últimos meses.
(*) – Mestre em economia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos, é professor da FSG – Centro Universitário da Serra Gaúcha e head de renda variável da Messem Investimentos.