Allan Augusto Gallo Antonio (*)
Na mitologia nórdica, o Kraken é uma criatura há muito conhecida na literatura e na cultura popular.
De acordo com as narrativas mais famosas, tratava-se de um cefalópode (uma espécie de lula) de proporções colossais e que tinha como atividade principal afundar os navios que passavam próximos a ele. Semelhante ao Kraken, nos últimos anos o Estado brasileiro está paulatinamente tomando proporções monstruosas, principalmente no que se refere ao crescimento de seus gastos em relação ao Produto Interno Bruto (PIB).
Muito se tem dito a respeito do tamanho do Estado e da tributação excessiva no Brasil, no entanto, a maioria das pessoas esquece que o tamanho do Estado é mais adequadamente visualizado quando olhamos para o quanto ele gasta e não somente para o quanto ele tributa. Se tomarmos como base as dez principais economias do mundo, o Brasil foi o que experimentou maior expansão dos gastos públicos na última década.
De 2008 a 2019, a despesa do Estado (somados União, Estados e Municípios) cresceu de 29,5% para 41% do PIB – já excluídos da conta o juros da dívida – que se fosse somado chegaria ao assustador patamar de 48,9% do PIB. Atualmente, compõem, de maneira geral, os gastos do Estado: folha de pagamento com servidores públicos, previdência e juros. Isso coloca o Brasil no seleto grupo dos países que mais gastam com funcionalismo, atrás de países como França e Canadá.
Seguindo nesse mesmo ritmo de crescimento dos gastos – na ordem de 1% ao ano – e fazendo uma projeção relativamente simples, é possível concluir que se nada mudar, daqui a 60 anos, em 2080, o país terá atingido 100% do PIB em gastos públicos. Em ano de eleições municipais, é de vital importância que o eleitor tenha em mente que não existe almoço grátis. O Estado só pode prestar serviços e fornecer auxílios com base no aumento da tributação ou com aumento da dívida pública.
Em ambos os casos, todos nós – do mais simples ao mais abastado – pagaremos a conta no final. Alertamos que essa conta chegará não apenas em termos financeiros, mas também em termos de oportunidade. Cada vez que o Estado resolve intervir politicamente na economia, seja por meio da tributação ou por meio da manipulação de crédito disponível, diversas oportunidades de crescimento, de emprego e de renda são perdidas.
Tais oportunidades não entram na contabilidade oficial, mas fazem parte diretamente dos custos de oportunidade e das externalidades causadas pela intervenção do Estado na economia. O agigantamento do Kraken brasileiro pode ser observado pelo seu péssimo posicionamento em rankings internacionais de liberdade econômica, como o desenvolvido pelo Instituto Fraser no Canadá.
Os dados de 2018-2019, revelados agora em 2020, mostram que no computo geral, o tamanho do Estado subiu de 6,85 para 6,86 em comparação ao último relatório divulgado pela instituição. Além disso, no próprio ranking, de um total de 162 países, o Brasil se encontra na posição 105º no que se refere ao grau de liberdade econômica experimentado no país, atrás de outros países que enfrentam seríssimos problemas sociais como Haiti, Guiana, Tanzânia e Nigéria.
Durante o período eleitoral, como também depois dele, é importante que todos os cidadãos tenham em mente que é improvável que os candidatos mencionem o descontrole dos gastos, o agigantamento do Estado e a necessidade urgente de cortes e readequações. A maioria das propostas versará justamente sobre o contrário, a necessidade de aumentos, gastos e manutenção da alimentação do monstro.
Por outro lado, no plano da realidade concreta, mas nem tão popular, a solução para parte dos problemas do país passa, invariavelmente, por uma profunda reforma administrativa e consequente diminuição do gasto público.
(*) – É formado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e mestrando em Economia e Mercados pela mesma instituição. É pesquisador do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica.