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A política monetária no divã

em Artigos
sexta-feira, 10 de maio de 2019

Ana Elisa Bacha Lamounier (*)

“A economia só resolve um problema antigo criando dois novos” (Paul Samuelson).

Muitos países desenvolvidos ainda lutam para normalizar suas políticas monetárias, cujos juros em muitos lugares estão próximos à zero, ou mesmo negativos. E apesar dos juros baixos o crescimento da economia também é baixo, muitas vezes próximo à zero, se constituindo num grande problema, uma vez que baixo desempenho econômico significa menor oferta de emprego, um dos principais dramas do mundo moderno.

Reduzir ainda mais os juros não fará diferença alguma para a economia: eles simplesmente perderam sua força. A Europa que o diga. A política monetária possui hoje pouca efetividade na execução de suas funções. Para muitos analistas esses países vivem uma situação definida como armadilha da liquidez, por menor que os juros estejam não há reação na economia. Porque estamos nessa situação? O principal motivo é que não há, no mercado, tomador de empréstimos.

Na verdade, o temor da evolução futura da economia leva os agentes econômicos, consumidores e investidores, a reduzirem seus gastos, independente do patamar dos juros. Isso implica em menor demanda agregada e, consequentemente, em menor crescimento. As instituições financeiras também não se interessam em emprestar, mesmo com taxas baixas, pois temem que uma economia em crise aumente o risco de inadimplência, afetando ainda mais a sua liquidez.

Como resultado, o dinheiro empoça nos bancos. Com excesso de caixa, os recursos acabam se transformando em reservas bancárias depositados no Banco Central. Este, na tentativa de estimular o crédito, reduz as taxas que remuneram as reservas depositadas. Uma taxa negativa de 1,00% de remuneração das reservas bancárias implica que a cada 100 depositados se transformem em 99,00 ao final do prazo de um ano.

O dinheiro empoçado e a fraqueza da economia produzem outro fenômeno: a queda nos preços dos produtos. Esse fenômeno, conhecido como deflação, cria um ambiente ainda mais desafiador para os gestores de política monetária. Quando os preços caem, a variação nominal da renda passa a ser menor que a variação real, distorcendo os movimentos das diversas variáveis econômicas.

Por exemplo: se o crescimento real do PIB é zero, mas houver deflação, a renda per-capita cresce. Esse é o caso do Japão, país que vive há mais tempo o drama da armadilha da liquidez. A deflação produz também um desejo dos consumidores de adiar seu consumo, pois os produtos terão amanhã preços menores do que hoje, contribuindo para que a economia permaneça sem força para a expansão.

Os juros negativos têm ainda outras consequências importantes. Eles impactam a rentabilidade do sistema bancário, já que parcelas significativas dos recursos permanecem depositadas a taxas negativas no Banco Central. Na zona do euro as reservas depositadas no Banco Central Europeu e remuneradas a menos 0,40% ao ano são de quase € 2 trilhões e segundo analistas geram prejuízo de mais de € 5 bilhões anuais ao sistema bancário.

A relação de países praticantes de juros negativos é grande e inclui a Suíça, onde a taxa de remuneração dos depósitos efetuados em seu Banco Central é de menos 1,25% ao ano, há, no entanto, uma faixa de isenção para que o sistema não penalize os bancos menores. Inclui também a Suécia, cuja taxa é de menos 1,00% ao ano, a Dinamarca, com menos 0,65% ao ano e o Japão, com menos 0,10%.

A receita para sair da armadilha de liquidez não é trivial. Se fosse, o mundo já estaria hoje em outra situação. O exemplo do Japão mostra que esse fenômeno pode durar décadas, o que não é nem um pouco animador. Esperamos que ao menos o FED consiga escapar desse beco sem saída, já que sua política monetária é a que está mais avançada no processo de normalização pós-crise hipotecária.

(*) – É CEO-Founder da Sparks Capital.