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A polêmica dos Fundos Estaduais e o que prevê a Reforma Tributária

em Artigos
quarta-feira, 13 de setembro de 2023

Possibilidade de nova contribuição é controversa e desperta críticas quanto à manutenção de um modelo de tributação questionável

Karen Semeone (*)

Os fundos estaduais estão no centro de uma polêmica tributária que não é de hoje. Com o intuito de fomentar a arrecadação e atender a demandas sociais, os estados têm se movimentado nos últimos anos para construir fundos de tributação com incidência condicional sobre benefícios fiscais. Como resultado, a prática foi disseminada no país e acabou no epicentro de críticas ferrenhas, ao ponto de especialistas alocarem um estigma de ilegalidade ao ato. A Confederação Nacional da Indústria (CNI), por exemplo, tem atuado de forma incisiva para contestar e debater a constitucionalidade dos fundos estaduais, levando o tema ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Dentro do argumento de violação à isonomia tributária e uma maior garantia aos direitos fundamentais dos contribuintes, o cerco à aplicação dos fundos estaduais tem se intensificado. Sem dúvidas, esse “mecanismo financeiro” utilizado por estados habita um cenário nebuloso na esfera fiscal. Era imprescindível, portanto, que a recém aprovada Reforma Tributária tocasse no assunto de maneira categórica. A resposta prevista na PEC 45/19, mais precisamente no artigo 20, porém, não foi das mais satisfatórias.

Em suma, com uma régua de corte até 30 de abril de 2023, o artigo prevê a instituição de uma nova contribuição para substituir os fundos estaduais previamente existentes – e que têm servido como condicional para a obtenção dos benefícios fiscais de ICMS. O prazo para a cobrança será de até 2043, impactando produtos primários e semielaborados, acompanhando o objetivo de recolher recursos para o investimento em infraestrutura e outras pautas de caráter social.

Na contramão do que rege a Reforma Tributária?
Para além de dar uma nova face aos fundos estaduais, a priori, a sensação é de que o dispositivo busca resguardar a legitimidade do movimento, apesar de elementos fundamentarem o método como abusivo. Frente ao fantasma da carga tributária, que, vale mencionar, esteve no centro do projeto da reforma como uma mácula a ser contornada, tal continuidade vai amplamente contra a premissa defendida pela Reforma Tributária, de assegurar um cenário de equidade fiscal e simplificação. Na prática, para os que esperavam por uma solução definitiva ao tópico, trata-se de uma saída, no mínimo, insatisfatória.

Não será nenhum absurdo, para termos uma dimensão, que uma boa quantidade de fundos acabe avalizada pelo artigo e, portanto, continue em rigor. Mesmo com diferenciações, é de comum acordo que os fundos estaduais estão em dissonância com o que o modelo tributário brasileiro carece, indo na contramão do que se tem debatido à exaustão.

Já no meio empresarial, as perspectivas estão direcionadas para as repercussões econômicas. Se por um lado, existe um sinal positivo à simplificação com a unificação de impostos, a tributação de exportações através das contribuições assusta. Se considerarmos a incidência dos fundos, que recai desde a origem do item à produção, a contradição também se estende para o enfrentamento da cumulatividade.

Resumidamente, não há como negar que o assunto deverá ser retomado seguindo um viés criterioso, de modo a elucidar como a União visualiza a sobrevivência dos fundos estaduais na figura de uma nova e polêmica contribuição. Enquanto organizações se mobilizam para preservar o aproveitamento de seus benefícios fiscais, a tendência é de que muita água escoe por debaixo desta ponte, entre resoluções que precisam, invariavelmente, apontar para um sistema tributário efetivamente isonômico, sem exceções.

(*) É Advogada especialista em Direito Tributário na Systax, colunista, palestrante, instrutora de cursos e treinamentos na área tributária e coautora da obra “Mulheres no Direito Vol. I – O Poder de uma mentoria”, pela Editora Leader.