Fernando Valente Pimentel (*)
É uma pena que o Brasil tenha desperdiçado a oportunidade única referente ao chamado bônus demográfico.
Esse bonus é caracterizado pela existência de maior número de pessoas economicamente ativas em relação aos idosos e crianças — para alcançar um patamar elevado de renda e desenvolvimento. Na maior extensão desse fenômeno populacional, iniciado na década de 80 e cujo processo de reversão, segundo o IBGE, começou em 2018, apresentamos desempenho pífio.
Nas últimas três décadas, o crescimento da renda per capita foi de apenas 0,76% ao ano e o do PIB, 2,2%, aquém da média mundial e muito abaixo da performance das nações emergentes. O fim do bônus demográfico ocorre em meio a uma prolongada crise econômica, a mais grave de nossa história.
Desde 2018 estamos invertendo as proporções entre a população economicamente ativa e a inativa. Chegaremos a 2060 com 58,2 milhões de idosos, o triplo do contingente atual, e 136,5 milhões de brasileiros em idade profissionalmente ativa, ante 144,7 milhões, hoje. E iniciamos essa trajetória com cerca de 13 milhões de desempregados.
Esses dados reforçam a premência da reforma previdenciária, enquanto o baixo índice de avanço econômico escancara a necessidade da tributária, pois os impostos elevados e uma estrutura de arrecadação complexa e geradora de insegurança jurídica são alguns dos obstáculos ao dinamismo do nível de atividade, investimentos e empreendedorismo.
No entanto, há outra providência muito importante para viabilizar o crescimento sustentado do PIB em patamares mais elevados: formação e capacitação adequada dos recursos humanos, que começa com a qualidade da educação, uma prioridade historicamente relegada em nosso país, inclusive no período do bônus demográfico, fator que nos impediu de potencializá-lo de modo pleno.
Precisamos, portanto, corrigir esse crônico problema da qualidade do ensino. É importante lembrar que a educação de excelência foi um dos principais fatores responsáveis pelo salto de desenvolvimento de várias nações. Porém, tal avanço exige numerosas políticas públicas, com resultados em médio e longo prazos.
Temos, portanto, uma emergência, que é evitar a fuga de talentos e capacitar o contingente de trabalhadores, inclusive os desempregados, para que estejam devidamente preparados para os desafios profissionais quando tivermos uma retomada econômica. Isso não pode esperar a necessária reforma da educação. Precisa ser feito já, utilizando-se redes já existentes, como as do Senai, Sebrae e outras instituições.
É preciso oferecer oportunidades, em especial aos brasileiros desempregados, de se manterem em atividades de capacitação, pois corremos o risco de não ter cérebros e braços em número suficiente para atender às demandas de uma economia em expansão e em transformação, exigindo novas habilidades de todos nós.
Alguns números evidenciam o quanto esse risco é real e concreto: em 2018, mais de 21 mil pessoas deixaram o Brasil e entregaram à Receita a declaração definitiva de saída do País. Em plena era do conhecimento, a evasão de talentos e do capital humano é gravíssima e afeta as próximas gerações de brasileiros.
Esta é uma das faces mais graves dos efeitos de uma prolongada crise econômica, como a que vivemos, que se soma ao drama social representado pelo desemprego elevado e aos danos que causa a milhares de famílias. É urgente, portanto, um projeto de capacitação capaz de reter e atrair talentos e reciclar a esperança dos trabalhadores brasileiros.
(*) – É presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit).