Salesio Nuhs (*)
Prestes a completar 13 anos, o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003) se tornou mais viável.
Um importante decreto entrou em vigor, alterando prazos para a renovação dos registros de armas de fogo – que passam de três para cinco anos. O teste de aptidão também teve prazo alongado, para a cada duas renovações, ou seja, a cada dez anos. A alteração na legislação, proposta pelo Ministro da Justiça, Alexandre de Morais, ainda é tímida e representa apenas um pequeno avanço para deixar menos penosa a burocracia para a obtenção de autorização para a posse legal de armas de fogo.
Ainda assim, é um passo relevante e demonstra que há, por parte do atual governo, inclinação para quebrar o paradigma histórico dos antecessores, que pregavam a restrição absoluta – traduzida em enormes dificuldades para o cidadão brasileiro. A nova regulamentação contém avanços inegáveis. Ao aliar um sistema de controle efetivo a prazos mais plausíveis para os proprietários ela reduz a burocracia que deve ser satisfeita para quem pretende possuir legalmente uma arma para autodefesa.
Por sua natureza, o decreto tem o potencial para ajudar a reduzir no País a quantidade de armas de fogo em situação irregular. O Estatuto do Desarmamento foi criado com base na expectativa que, ao desarmar a população e dificultar seu acesso a armas de fogo, haveria uma redução na criminalidade no Brasil. O resultado, porém, foi o contrário. Criminosos não foram desarmados e a violência aumentou.
Dados do relatório anual do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostram que, em números absolutos, o Brasil registrou mais homicídios em 2015 (58,3 mil casos) que em países em guerra, como a Síria (55, 2 mil ocorrências). Além disso, ainda jogou milhões de cidadãos brasileiros na irregularidade. Quase nove milhões de proprietários de armas de fogo hoje estão irregulares por conta da burocracia estabelecida pelo Estatuto.
Até o decreto 8.935, de 19 de dezembro de 2016, o prazo para renovação dos registros de armas era de três em três anos. Isso, combinado à falta de estrutura da Polícia Federal, com poucas unidades pelo País e quantidade insuficiente de psicólogos e instrutores de tiro credenciado para atender a demanda, foi o que colocou esses cidadãos em situação irregular.
Efeito mais nocivo disso foi o impacto sobre o cadastro nacional de armas de fogo, o Sistema Nacional de Armas (Sinarm), criado em 1997 pela Lei 9.437/97. Seu objetivo era exatamente o de manter um controle sobre quantas armas em circulação havia no País. Essa base de dados, porém, foi se perdendo ao longo dos anos com a não renovação dos registros. Segundo dados do Ministério da Justiça, mais da metade das cerca de 16 milhões de armas de fogo hoje existentes no País não estão registradas no SINARM e encontram-se em situação irregular.
Em 2010 havia 8.974.456 de armas de fogo com registro ativo. Em 2016, o número passou para cerca de 315 mil. A burocracia criada pelo Estatuto tem, como efeito colateral, alimentar o comércio ilegal. Isso porque munições legais só podem ser adquiridas em lojas cadastradas, controladas e fiscalizadas pelo Exército Brasileiro e pela Polícia Federal, e apenas por proprietários cujas armas estejam com registro ativo. Como milhões não estão em situação regular, a alternativa é buscar outras formas para adquirir o produto.
O decreto 8.935 é, portanto, um importante passo – dado com mais de uma década de atraso – no sentido da legalização das armas de fogo. Ele facilita o registro que, por sua vez, estimula a posse responsável e regular, auxiliando no rastreamento pela Polícia Federal. Ainda há muito a ser feito, mas esse já é um bom começo.
(*) – É presidente da Associação Nacional da Indústria de Armas e Munições (Aniam).